Título: Para Guerra, tentativa de Dilma é sincera
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 21/07/2011, Política, p. A6
O presidente nacional do PSDB, deputado Sérgio Guerra, esteve ontem com a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais), mas negou que a reunião fosse um desdobramento da política de distensão da presidente Dilma Rousseff em relação ao PSDB. Guerra e o Palácio do Planalto informaram que a pauta da reunião foi a liberação de emendas parlamentares ao Orçamento em benefício da Mata Norte de Pernambuco, região atingida pelas chuvas que provocaram enchentes e estragos no Nordeste.
Antes de conversar com Ideli, o deputado disse ao Valor reconhecer que a presidente desencadeou uma "tentativa sincera" de saneamento da corrupção no Ministério dos Transportes, mas que duvidava do sucesso do empreendimento por entender que Dilma enfrentará enormes dificuldades na sua base de apoio político para "concluir a obra". Segundo Guerra, a corrupção no governo é "sistêmica", consequência "direta da forma como o ministério foi organizado e seus chefes indicados.
"A mesma lógica que presidiu as indicações nos Transportes se deu em muitos outros ministérios", disse Guerra. "A crise não é do Ministério dos Transportes, é do sistema de nomeações imprudentes e injustificáveis".
"A presidente deseja enfrentar os excessos desse sistema - e nisso pode ser reconhecida - mas não sabe como fazê-lo ou não se sente em condições de tomar decisões de governo que deveriam ser tomadas", afirmou Guerra. "Ela só tem duas alternativas: ou enfrenta de fato essa estrutura de poder não republicana ou não tem o que fazer", disse. "Ela não tem a capacidade de comunicação do ex-presidente Lula, que resolvia tudo na garganta".
Segundo o presidente do PSDB, o problema "é do governo com sua base - o que preside essa relação não é programa partidário, mas o tamanho de cada um na divisão do Orçamento da União". Guerra diz que até mesmo as nomeações feitas antigamente para o Funrural tinham uma justificativa política, pois a nomeação do agente da Previdência Social nos municípios distantes tinha objetivos eleitorais. Atualmente, segundo afirma, a divisão do Orçamento teria mais em vista o enriquecimento pessoal.
Advertido de se reunira com Ideli para tratar da liberação de suas emendas parlamentares, o deputado argumentou que a liberação da verba é justificada: a região da Mata Norte de Pernambuco foi recentemente atingida por enchentes que causaram grandes prejuízos. Além disso, afirmou que o PSDB tem uma proposta sobre emendas parlamentares ao Orçamento que coincide inclusive com as ideias da ministra Gleisi Hoffmann sobre o assunto: elas somente seriam permitidas para obras prioritárias de acordo com planejamento nacional. Saneamento em cidades do interior do Nordeste, por exemplo.
Embora diga que foi tratar de Orçamento com Ideli, é certo que a ministra e o chefe do PSDB conversaram sobre a conjuntura política. Emenda parlamentar é pouco para uma visita do chefe da oposição ao Palácio do Planalto. Em discurso no encerramento do semestre legislativo, o senador Aécio Neves (MG), que é o candidato de Guerra a candidato a presidente do PSDB, criticou duramente o governo Dilma: "Muito poucas vezes, na nossa história recente, um governo começou de forma tão desarticulada". Ontem, após 13 demissões no Ministério dos Transportes, o tom de Guerra era mais ameno.
"A oposição torce para que a Dilma cumpra seu papel. Ela foi eleita, nós reconhecemos a sua vitória e desejamos que a presidente governe", disse o presidente do PSDB. Sérgio Guerra é deliberadamente cauteloso quando fala em "tentativa" de Dilma para moralizar a área dos Transportes, a fim de evitar reações internas: o PSDB, mesmo depois que elegeu a nova direção, continua um partido dividido.
Os tucanos vão dar prioridade, nas eleições municipais, às 400 maiores cidades do país. Nas capitais, as expectativas do partido são rarefeitas. Em São Paulo, o partido fala que fará prévias para definir o nome do candidato. A ideia da prévia tem como objetivo pressionar o ex-governador José Serra a tomar uma decisão sobre seu futuro político até o próximo mês de dezembro.
A presidente Dilma foi quem tomou a iniciativa da distensão na relação do governo petista com o PSDB, ao convidar Fernando Henrique Cardoso para o almoço com Barack Obama, na visita que o presidente americano fez ao Brasil, em março. Depois, a pretexto da comemoração dos 80 anos de FHC, escreveu uma carta ao ex-presidente na qual reconhece o papel dele na estabilização da economia. Entre os dois eventos, o ministro Nelson Jobim (Defesa) tentou articular um encontro de Fernando Henrique com Dilma Rousseff e o presidente do PSDB. As conversas não prosperaram, mas cresceram então as especulações recorrentes sobre possibilidade de Jobim deixar o governo.