Título: Cade exige venda de um terço da Brasil Foods
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Fonte: Valor Econômico, 14/07/2011, Investimentos, p. D5

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) do Ministério da Justiça aprovou ontem a compra da Sadia pela Perdigão, mas determinou a venda de um terço da BRF- Brasil Foods, empresa formada pela união das companhias, e suspendeu as marcas Perdigão e Batavo em vários mercados.

A empresa que comprar os ativos pode ser um concorrente direto da BRF, como a JBS, a Seara ou a Marfrig, ou mesmo uma companhia de outro setor. Ela terá à sua disposição ativos suficientes para produzir 730 mil toneladas de alimentos processados por ano. A venda terá de ser realizada até março de 2012. Até lá, a BRF terá de cumprir uma série de condições.

A companhia não pode criar uma nova marca para ocupar o espaço deixado pela Perdigão e pela Batavo. A BRF terá de se desfazer das chamadas marcas de combate: Rezende, Wilson, Texas, Tekitos, Patitas, Escolha Saudável, Light Ellegant, Fiesta, Freski, Confiança, Doriana e Delicata. O objetivo do Cade foi o de evitar que essas marcas sejam usadas para prejudicar concorrentes que queiram competir com a Sadia. O órgão antitruste concluiu que a BRF poderia reduzir os preços em marcas de combate apenas para tirar concorrentes do mercado. Em seguida, esses preços poderiam ser aumentados.

A BRF terá de manter investimentos nas marcas que vai vender, pois, se perder participação de mercado, pode pagar multa de até R$ 25 milhões por ponto percentual perdido.

A marca Sadia, considerada essencial nos planos de exportação da BRF, não entrou no pacote que será vendido, pois o Cade centrou a análise no mercado interno.

A Batavo será suspensa por quatro anos apenas na linha de alimentos processados, como mortadelas, empanados e salsichas. A linha de lácteos da Batavo permanece em funcionamento, pois o Cade não verificou problemas de competição nesse mercado.

A suspensão da Perdigão varia de acordo com os produtos. Vale por três anos para presuntos suínos cozidos, apresuntados, afiambrados, linguiças curadas, paio e o chamado "kit festa suíno" - uma composição de lombos e paletas suínos, pernis e tenders. Os salames Perdigão estão suspensos por quatro anos. Já as lasanhas, pizzas congeladas, quibes, almôndegas e frios da marca Perdigão terão de sair do mercado por cinco anos.

Após esse período, a BRF pode retomar a marca Perdigão. A suspensão foi uma aposta calculada do Cade. O órgão acredita que, durante cinco anos, a empresa que comprar um terço da BRF poderá competir em condições de concorrência. "Cabe a quem adquirir o pacote ter competência e saber ocupar o espaço no mercado", disse o conselheiro Olavo Chinaglia, que presidiu o julgamento.

O pacote também inclui venda de fábricas, abatedouros de aves e de suínos, granjas de frangos e centrais de distribuição em todas as regiões do país, com exceção do Norte. A maior parte das vendas vai acontecer na região Sul, em particular em Santa Catarina e no Paraná. O nome e a localização das fábricas foram mantidos sob sigilo. A BRF terá de exigir da empresa adquirente a manutenção do nível de emprego nas unidades pelo prazo de seis meses após a venda. Os contratos atuais com os fornecedores de animais e de produtos industrializados serão mantidos e, depois, repassados para a empresa que comprar os ativos da BRF.

Essa empresa vai adquirir da BRF até 20% de participação em cinco mercados, segundo os cálculos do conselheiro Ricardo Ruiz. Sem especificá-los, Ruiz disse que o pacote inclui 14 mercados, no total, e a venda será feita em três etapas. Na primeira, haverá uma negociação entre a BRF e os possíveis compradores. Na segunda, um leilão com preço mínimo para a venda. Caso o leilão não seja bem-sucedido, haverá uma terceira etapa, na qual a venda será feita sem preço mínimo. "Com a compra da Sadia pela Perdigão, a BRF ficou com a liderança do mercado e, agora, nós criamos a vice-líder para competir com a empresa", justificou.

O conselheiro Carlos Ragazzo, que havia votado pela reprovação do negócio, manteve a posição. "A ideia de alienação da Perdigão seria mais efetiva", afirmou Ragazzo. "A suspensão da marca é uma solução heterodoxa, que pode funcionar ou não. Nós só vamos saber daqui a cinco anos." Ao fim, a decisão foi tomada por quatro votos a um.

O conselheiro Alessandro Octaviani fez um alerta à formação de grandes empresas nacionais, como a BRF. "Não temos nada contra a criação de campeãs nacionais, desde que a lei seja respeitada." Para ele, "a redução do bem-estar do consumidor, em especial das classes mais baixas da população, não pode estar no núcleo de criação de campeãs nacionais".

O conselheiro Marcos Paulo Veríssimo enfatizou que o Cade fez uma separação entre os mercados interno e externo ao julgar a BRF. "Não há preocupação com a atividade exportadora da BRF", disse. "Mas a competição no mercado interno deve ser preservada", completou. Os representantes da BRF assinaram um termo com o Cade se comprometendo a seguir as condições do pacote de medidas.