Título: UE fecha pacote de resgate grego e afasta, por ora, o risco de contágio
Autor: Campos, José Roberto
Fonte: Valor Econômico, 22/07/2011, Finanças, p. C1

Crise da dívida: Com calote parcial, medidas são mais ambiciosas do que muitos esperavam

De São Paulo Mais importante do que salvar a Grécia com a solução que desde o início era clara - a reestruturação das dívidas - o pacote de socorro de ¿ 159 bilhões (US$ 228,6 bilhões) aprovado pelos líderes europeus cria mecanismos de socorro preventivo para países em dificuldades sob pressão dos mercados e com maior peso econômico que Grécia, Irlanda e Portugal, que sucumbiram. As enormes dívidas dos governos que compõem a zona do euro deixam de ser apenas nacionais - um exemplo em negativo da necessidade de uma união fiscal que ainda inexiste. Os governos decidiram que fundo de estabilização abrirá linhas de crédito e comprará títulos de países que enfrentarem dificuldades no futuro - não mencionados, Itália e Espanha são os candidatos imediatos. Com isso, esse fundo assume um papel de um FMI europeu, que chegou a ser cogitado nos primórdios da crise, e passa a ser um coadjuvante de emprestador de última instância, papel que o Banco Central Europeu até agora relutantemente assumiu. O fundo poderá inclusive financiar a recapitalização de bancos nos países que enfrentam a desconfiança dos mercados. Com a zona do euro à beira de uma crise sem precedentes que poderia implodir a união monetária, o pacote alivia a dívida de ¿ 340 bilhões que a Grécia não teria condições de pagar. O arranjo final contempla a socialização das perdas entre os governos da união monetária e, subsidiariamente, entre credores privados.A dívida grega cairá com a redução dos juros dos empréstimos, para 3,5% (de a 2 pontos percentuais de redução) e o alongamento do prazo de 7,5 anos para 15 a 30 anos dos empréstimos do fundo de estabilização, FMI e União Europeia. Um novo pacote oficial de ¿ 109 bilhões foi colocado à disposição do governo grego. Os credores privados entrarão com ¿ 37 bilhões, além dos recursos oficiais. Os bancos terão quatro opções, cujos detalhes não foram divulgados: três tipos de troca de dívida e um de rolagem, com prazos e taxas diferentes. Uma opção seria trocar a dívida que vencerá em oito anos por bônus de 30 anos, com taxas de juros que declinarão de 8% em média para 4,5%. Este esquema representaria um corte de 20% no valor presente dos débitos em mãos das instituições financeiras.

Além disso, o fundo de estabilização recebeu autorização para recomprar títulos gregos no mercado secundário, onde eles têm desconto de quase 50%, mas esta arma não será usada com a amplitude que poderia. Os líderes europeus estabeleceram um limite de ¿ 12,6 bilhões para esse fim.

Com tudo isso, o estoque da dívida grega ainda assim permanecerá bem alto, na casa dos 130% do Produto Interno Bruto, enquanto que analistas estimam que a zona suportável de endividamento seria de 80% do PIB.

Os líderes europeus resolveram desprezar o parecer das agências de risco, que colocarão os papéis da Grécia e dos bancos gregos em default seletivo. A dependência de suas classificações será reduzida na estrutura regulatória da União Europeia, algo que deverá ser ainda objeto de propostas de regulamentação.

Um dos problemas importantes não resolvidos é o suporte financeiro ao fundo de estabilização, que hoje conta com ¿ 440 bilhões (US$ 625 bilhões) para intervenções. Economistas apontam que ele precisaria ter o dobro ou do triplo desse valor para fazer frente a turbulências na Itália e na Espanha, mas essa decisão não foi tomada.

Além disso, por mais que alguns líderes europeus, e em especial o presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, fugissem de um default por princípio, o pacote grego institucionaliza um calote parcial. Para mostrar que os pecadores estão arrependidos e não cometerão a mesma heresia duas vezes, o Conselho Europeu deixa claro que o envolvimento do setor privado só aconteceu porque a Grécia estava em uma situação excepcional, que requeria uma solução também excepcional. Ele pode se arrepender no futuro de uma declaração tão peremptória feita em um ambiente de enorme instabilidade.