Título: Mundo não está preparado para sair de Treasury
Autor: Campos, José Roberto
Fonte: Valor Econômico, 03/08/2011, Finanças, p. C8

De São Paulo

Mesmo com a demora na aprovação de um novo teto para a dívida soberana dos Estados Unidos, o Banco Central (BC) brasileiro não deixou de considerar os títulos soberanos americanos, conhecidos como "treasuries", como ativos livres de risco, segundo o presidente da instituição, Alexandre Tombini. Num momento de enfraquecimento do euro, sob a tensão da capacidade dos governos de honrar suas dívida, ele considera que a frente para diversificar a aplicação das reservas internacionais é limitada.

Valor: A aprovação da proposta que aumenta o limite de endividamento dos Estados Unidos muda o cenário externo?

Alexandre Tombini: Nós esperávamos que essa solução viria, que não ocorreria o impensável. Isto é, o não pagamento do ativo de risco livre do mundo que é o "Treasury" americano. Os mercados também esperavam isso. Não houve grandes movimentações quanto à remota, porém concreta, possibilidade de não pagamento dos títulos. O mercado reagiu ao anúncio de domingo de forma serena. A Ásia saiu mais entusiasmada, mas depois de superado esse assunto, ressurgiu o tema global que é o crescimento mais frágil dos Estados Unidos, como mostrou o dado da atividade industrial americana.

Valor: A demora na elevação do limite tem consequências?

Tombini: A demora pode ter implicações na classificação do crédito americano. Não havendo o evento de não pagamento [de dívida] o rebaixamento deverá ocorrer dentro do grau de investimento do país. Mas o nosso pensamento, e certamente de muitos investidores soberanos e institucionais, é de que com a falta de alternativa ao ativo de risco livre (os Treasuries), os investidores não se movimentarão por conta de mudança na classificação de risco dos Estados Unidos. Acredito que os investidores institucionais se ajustarão a essa nova classificação, se essa nova classificação, por exemplo, não colidir com alguma regra interna. O mundo realmente não está preparado para sair do ativo de risco livre.

Valor: Uma parcela substancial das reservas internacionais brasileiras está lastreada em títulos do Tesouro americano. Em algum momento o Banco Central repensou esse lastro?

Tombini: Nós temos feito uma diversificação das reservas internacionais na medida do possível e há tempo. Mas as alternativas são poucas. O próprio euro está num momento que não é o mais brilhante. Então, temos feito diversificação das reservas na margem. Nas reservas predomina o ativo de risco livre. E não foi desta vez que tivemos um evento de crédito sobre esse ativo.