Título: Ainda mais austero, novo Copom agrada
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2006, Finanças, p. C2

O mercado financeiro aprovou as mudanças anunciadas ontem na diretoria do Banco Central. Por várias razões. A primeira, mais forte: já foi formada a diretoria do BC para um eventual segundo mandato de Lula, e ela consegue ser ainda mais conservadora que a atual. Não se imagina que as substituições, cujo ritual burocrático é trabalhoso e desgastante, sejam meramente provisórias. Quem entra agora é para ficar até 2010. A segunda: como a nova diretoria adentra o segundo mandato, o sinal é de prosseguimento (e até aprofundamento) da gestão neoliberal das políticas monetária e cambial. O recado é o de que os mercados podem ficar sossegados: nenhuma medida destinada a restringir a liberdade dos capitais será tomada, e a ele será assegurada alta remuneração por meio de Selic elevada e do câmbio apreciado. A terceira: os diretores que entram (Mário Mesquita na diretoria de Estudos Especiais e Paulo Vieira da Cunha na de Assuntos Internacionais) e o deslocamento de Alexandre Tombini para a de Normas irão robustecer o "núcleo duro" do Copom controlado pelo ultra-ortodoxo diretor de Política Econômica, Afonso Bevilaqua. A quarta: as mudanças indicam que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, de fato não manda nada no BC.

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O comportamento dos mercados locais só não foi mais efusivo por causa do mau humor especulativo internacional que sempre precede a divulgação do payroll (os dados consolidados mensais sobre o mercado de trabalho americano). Os informes sobre criação de novas vagas e a taxa de desemprego são indicadores antecedentes da inflação e, portanto, das atitudes monetárias do Fed, mais até do que os dados sobre indústria e consumo. Os juros dos treasuries de 10 anos avançaram ontem de 4,84% para 4,89% exclusivamente por causa da tensão pré-payroll, já que a fonte recente geradora de especulação - a expectativa de que o BCE iria continuar subindo o juro europeu e, com isso, fortalecendo o euro contra o dólar e forçando a alta do juro americano - parece ter secado. Ontem, o BCE manteve a taxa em 2,5% e sinalizou que a tendência ainda é de estabilidade. As inquietações externas fizeram o risco-país avançar um ponto, para 239 pontos-base, apesar de Lula, com as alterações no BC, ter ampliado o seu estoque de reputação junto aos mercados.

De manhã, o dólar chegou a operar em alta. O BC ignorou a valorização, sabedor de que ela era passageira, e fez um leilão de compra antes mesmo do meio-dia. Aceitou 12 propostas (cerca de US$ 150 milhões) ao preço de R$ 2,1340. Mesmo assim, o dólar operou em baixa à tarde. Fechou cotado a R$ 2,13, queda de 0,18%, a sexta consecutiva. O dólar não consegue cair muito porque os bancos precisam defender suas desastradas posições compradas, de US$ 5,6 bilhões. As tesourarias erraram a mão no mês passado. Apostavam em grande turbulência por conta da saída de Palocci e compraram todo o saldo remanescente da balança cambial. Apostavam também em alta contínua dos juros americanos. Esse cenário já se esboroou e elas não sabem o que fazer com tantos dólares justamente numa época em que a sobreoferta não pára de crescer. O corretor Sidney Nehme, da NGO, observa que a correção do erro estratégico depende agora da efetividade dos leilões de compra do BC. Se o BC não aumentar a quantidade de moeda arrematada diariamente, as tesourarias irão desovar os seus estoques muito lentamente, segurando o processo de queda natural do dólar.

A política monetária não precisa de um auxílio adicional do dólar para persistir efetiva contra a inflação. Entre R$ 2,10 e R$ 2,20, o câmbio derrubou o IGP-DI de março. A deflação foi de 0,45%, bem mais forte do que a esperada (entre -0,35% e -0,10%). O índice, para espanto geral, acumula deflação de 0,29% nos últimos 12 meses. Mesmo que o dólar não caia abaixo de R$ 2,10, o Copom poderá continuar reduzindo a Selic. A conjuntura até autorizaria uma intensificação do ciclo de afrouxamento. Mas a sua nova configuração, ainda mais austera, dissuade apostas ousadas. O novo Copom consolida a tendência traçada por departamentos econômicos de bancos: queda da Selic de 0,75 ponto na reunião de 19 de abril (para 15,75%), com diminuição do ritmo para 0,50 ponto no encontro de maio (taxa de 15,25%) e nova desaceleração para 0,25 ponto nas reuniões de julho, agosto, outubro e novembro. Nesse compasso, a Selic encerraria o ano a 14,25%. Se o ritmo de 0,25 ponto de queda for iniciado mais tarde, na reunião de agosto, a taxa fecha a 14%, também admissível nas planilhas dos conservadores. Foi por isso que os contratos curtos caíram ontem muito pouco no mercado futuro da BM&F e o mais negociado, para janeiro de 2008, até subiu, de 14,47% para 14,48%.