Título: Ellen Gracie toma posse no STF e pede menos formalismo à Justiça
Autor: Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 28/04/2006, Política, p. A6
A ministra Ellen Gracie, 58, tomou posse, ontem, na Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) e elegeu a agilização da Justiça como prioridade dos seus dois anos de gestão. Ela defendeu medidas que impeçam a repetição de julgamentos diferentes sobre assuntos iguais pelos tribunais, como a adoção da súmula vinculante e da repercussão geral.
A ministra citou questões tributárias e previdenciárias como exemplos de ações que se perpetuam nos tribunais e poderiam ser resolvidas através desses dois mecanismos. A súmula vinculante e a repercussão geral seriam utilizadas pelo Supremo que, num único julgamento, definiria a diretriz a ser seguida pelas demais instâncias da Justiça.
Para Ellen, a continuação da reforma da Justiça é necessária para atrair novos investimentos e pôr um fim em discussões previdenciárias que se arrastam há anos na Justiça. " Para o estímulo ao investimento e ao empreendedorismo, é preciso que cada empresa saiba quanto lhe será exigido de imposto, sem as intermináveis discussões que hoje se arrastam a respeito das alíquotas aplicáveis e da extensão da base de cálculo " , disse. " É preciso que o cidadão saiba quais benefícios sua contribuição previdenciária proporcionará no futuro e como serão reajustados de modo a garantir-lhe, quando já incapaz para o trabalho, a continuidade de um padrão de vida digno " , completou.
O STF possui milhares de ações discutindo alíquotas e base de cálculo de tributos. Na área previdenciária, o tribunal está para decidir se as pensões por morte devem ser corrigidas, o que resultaria num prejuízo de mais de R$ 8 bilhões para os cofres do governo.
Ellen criticou essas " causas judiciais que exigem tratamento artesanal " e pediu menos formalismo à Justiça. " O destinatário de nosso trabalho é o cidadão e não as academias jurídicas. Nada deve ser mais claro e acessível do que uma decisão judicial bem fundamentada " , disse a presidente do STF. Ela pretende iniciar um movimento para a simplificação do Judiciário no Conselho Nacional de Justiça, órgão que também passou a presidir.
O discurso da ministra foi uma prévia de como será a sua atuação. Ellen tem um perfil mais técnico e menos político do que o seu antecessor, Nelson Jobim. A ministra não citou o mensalão, nem a crise recente entre o STF e o Congresso, devido ao excesso de liminares concedidas pelo tribunal para depoentes em CPIs. Coube ao ministro Celso de Mello pedir mais respeito nas relações entre os Poderes. " Nenhum dos Poderes da República pode submeter a Constituição aos seus próprios desígnios e avaliações discricionárias fundadas em razões de conveniência política ou de pragmatismo institucional " , disse Mello, numa advertência ao Congresso e ao Executivo.
Autor da denúncia contra 40 pessoas no inquérito do mensalão, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, defendeu a investigação de " agentes públicos " , mas reiterou que " as regras do jogo devem ser respeitadas " . Ou seja, o inquérito deverá percorrer todas as etapas previstas em lei e, portanto, deverá demorar para ser concluído. O presidente da OAB, Roberto Busato, criticou a absolvição de mensaleiros pelo plenário da Câmara. " A absolvição soa à população como desprezo, escárnio à Justiça. "
Ellen poderá ser a primeira mulher a assumir a Presidência da República, caso Lula, seu vice, José Alencar, e os presidentes da Câmara, Aldo Rebelo, e do Senado, Renan Calheiros, se ausentem do país. " Comigo estão todas as mulheres do Brasil " , afirmou Ellen na sua posse. O presidente Lula elogiou o fato de uma mulher assumir o comando do STF. " Eu acho que se as mulheres conseguirem conquistar os passos que estão conquistando, terão maioria em tudo. Em nossas casas elas já são autoridades máximas " , disse Lula.
O presidente afirmou que a relação do governo com o STF será " uma relação institucional, independente se aqui ou na Presidência da República tiver um homem ou uma mulher " .