Título: Indefinição leva operadoras a adiar projetos de expansão
Autor: Brigatto , Gustavo
Fonte: Valor Econômico, 11/08/2011, Empresas, p. B3

Com potencial para impulsionar o crescimento do mercado de TV por assinatura no Brasil nos próximos anos, as mudanças regulatórias previstas no projeto de lei (PLC) 116 e as novas regras da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para a TV a cabo têm criado incertezas para as operadoras."Eu coloco rede, mas não sei se vou poder oferecer o serviço", disse André Borges, diretor institucional e regulatório da Net, durante painel realizado ontem na ABTA 2011, congresso do setor de TV paga. A operadora, que atua em 94 cidades do país, está expandindo a rede para as cidades de Recife, Niterói e Salvador com os serviços de internet e telefonia, já que não tem licenças de TV nesses locais. O PLC estava na pauta do Senado ontem, mas não havia sido votado até o fechamento desta edição. A votação do projeto se arrasta por dez anos. A demora em sua aprovação e as dúvidas sobre o regulamento da TV a cabo - que, para muitos, tenta antecipar discussões pertinentes ao PLC 116 - têm levado as operadoras a reter projetos até que as indefinições sejam resolvidas.

"Os clientes exigem a oferta dos serviços de TV, telefone e internet", avaliou Roberto Nogueira, presidente da Brisanet, que atua na região Nordeste. Nos próximos dois anos, a operadora pretende investir em redes de fibra óptica em cidades de pequeno porte dos Estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba. O modelo de negócios, segundo Nogueira, baseia-se em internet e telefone. Mas a oferta de TV é um complemento importante.

O novo regulamento da TV a cabo, que recebeu mais de 400 contribuições durante a consulta pública, está em análise pela Anatel e ainda depende da aprovação definitiva do conselho diretor. De acordo com o superintendente de comunicação de massa da agência, Ara Minassian, a expectativa é de que o texto passe a vigorar entre outubro e novembro e que as primeiras licenças sejam expedidas entre dezembro e janeiro.

Mas, até lá, o PLC ainda não terá entrado em vigor - mesmo com uma aprovação imediata -, o que cria uma situação de instabilidade jurídica para o setor, segundo os empresários. Diante do descompasso, a Anatel pretende estabelecer um prazo para que as operadoras que obtiverem licenças de TV a cabo nesse intervalo possam se adaptar às mudanças na legislação.

Para as empresas que renovarem seus contratos haverá a opção de escolher entre as normas do PLC e a Lei do Cabo. A evolução para o novo marco regulatório, no entanto, será compulsória no futuro.

Com uma eventual rejeição do PLC, as empresas terão a opção de comprar licenças usando o novo regulamento da agência, ou esperar por uma nova investida para aprovação e posterior regulamentação do PLC. "A sociedade cobrava que a Anatel se mexesse para liberar novas licenças. Estamos fazendo isso. Podemos ser culpados por dez anos de atraso. Mas não queremos ser culpados pelos próximos anos, caso o projeto de lei não seja aprovado logo", reforçou o superintendente.

Essas incertezas colocam as operadoras em compasso de espera. "Não vou fazer um pedido de novas licenças sem saber o que vem pela frente (com o PLC)", afirmou Borges, da Net. Na avaliação do executivo, a aprovação do projeto de lei será positiva para dissipar as dúvidas e acelerar a obtenção das outorgas.

"Depois da aprovação do PLC, a agência vai fazer um novo regulamento para o setor? Não sei se faz muito sentido", observou Mariana Filizola, diretora-executiva da NeoTV, associação que reúne 127 operadoras de TV por assinatura de pequeno e médio porte.

Segundo Mariana, a estratégia da Anatel deixa questões em aberto e pode inibir, principalmente, os pedidos de licença de novas prestadoras. Para ela, um ponto ainda não esclarecido diz respeito às regras para o aluguel da infraestrutura das grandes operadoras. "Os pequenos dependem da contratação de links e da rede das teles, que passarão a ser concorrentes diretos. A Anatel tem que deixar claro como isso vai ser feito", afirmou. "Nossa principal preocupação é como se dará a garantia de acesso à infraestrutura."

Segundo a Anatel, 1.350 pedidos de licenças de TV a cabo aguardam avaliação. Do total, 784 empresas reiteraram recentemente o interesse nas autorizações.

As grandes operadoras ainda não se manifestaram. A Oi, por exemplo, planeja esperar a aprovação do PLC. Tratas-e da única das três grandes empresas de telefonia que poderia adquirir licenças de TV a cabo com base no regulamento da Anatel e sem depender da aprovação do PLC. O projeto de lei pode acabar com a proibição ao capital estrangeiro no controle das empresas de cabo, e somente a Oi tem acionistas majoritários brasileiros (a Telefônica é espanhola e a Embratel é controlada pela mexicana América Móvil).

"Esperar o PLC é melhor porque é uma solução definitiva", afirmou o diretor-geral da OiTV, Ariel Dascal. "Mas estamos trabalhando com os dois cenários." Em princípio, a ideia é esperar a votação do projeto de lei para depois solicitar as outorgas, mas a operadora poderá mudar de estratégia se a decisão do Senado demorar.

A Oi acompanha as mudanças no marco regulatório enquanto reformula seu serviço de TV. "Começamos com a classe C, mas agora queremos atender todos os segmentos", afirmou o executivo. A empresa vai lançar novos pacotes e planeja "melhorar a integração" entre os serviços de banda larga e vídeo - o que fica mais fácil por meio da rede de cabo, que é bidirecional. Hoje, a Oi só atua com essa tecnologia em Belo Horizonte. Nos demais mercados, oferece TV via satélite, que não tem essa característica.

Na avaliação de Paulo Saad, vice-presidente institucional e de TV por assinatura da Bandeirantes, a agência deveria estabelecer regras que ajudem as pequenas empresas a competir com os grandes grupos. "Como um operador de menor porte vai disputar mercado com uma Oi que tem faturamento anual de R$ 20 bilhões? As grandes operadoras vão passar como um trator por cima das companhias menores", disse.