Título: Internacionalização já atrai os bancos
Autor: Maria Christina Carvalho e Raquel Balarin
Fonte: Valor Econômico, 26/04/2006, Finanças, p. C3
A esperada compra do BankBoston pelo Itaú vai marcar um passo decisivo dos bancos brasileiros em direção a uma verdadeira corrida pela internacionalização. Isso só é possível agora, após um período de forte valorização das ações dos bancos brasileiros em bolsa de valores. "Os bancos brasileiros poderão comprar operações no exterior, pagando com ações, como fazem os espanhóis há muito tempo", disse o analista do Banco Pactual, Pedro Guimarães.
Até agora, os bancos brasileiros têm tido uma atuação tímida no exterior. O grande espaço para crescer no mercado interno tem sido a justificativa padrão dos banqueiros.
Uma exceção é o próprio Itaú que tem operações relativamente grandes na Argentina, o Banco del Buen Ayre, com R$ 1,3 bilhão de ativos e atuação no varejo; o Banco Itaú Europa, com R$ 8,1 bilhões e perfil mais de atacado; além de uma participação de 16% no Banco BPI, o quinto maior de Portugal. O Bradesco tem operações de atacado na Argentina; e o Unibanco, no Paraguai.
Para Guimarães, porém, os bancos brasileiros deveriam ir direto ao mercado mexicano, que, depois do Brasil, "é o único com escala" na América Latina. Além disso, o México tem sido um ótimo trampolim para os bancos espanhóis entrarem no mercado americano. O PIB mexicano, segundo estudo do Pactual, é equivalente a 97% do brasileiro. Para se fazer uma comparação, o PIB argentino é apenas 27% do brasileiro; e o chileno, 14%.
Guimarães chega a sugerir uma boa alternativa de compra no México: o Banorte, um dos raros bancos de varejo ainda independente no país. A maioria foi adquirida por bancos estrangeiros. O Banorte tem um valor de mercado de US$ 5,3 bilhões e está sendo negociado a 2,4 vezes o valor patrimonial. "Esse seria realmente um jogo de gente grande", disse Guimarães.
Se vingar o preço de US$ 3 bilhões comentado por fontes próximas à negociação, as operações do BankBoston, incluindo Brasil, Chile e Uruguai, estarão custando também 2,4 vezes o valor patrimonial. Os cálculos foram feitos pelos analistas do BES Securities, que consideraram o preço salgado, inclusive por outros indicadores. A aquisição envolve 0,6% de market share em depósitos no Brasil e 2,2% no Chile e 25% dos ativos totais de US$ 12 bilhões, calcularam.
Para o Itaú, porém, que está sendo negociado a cinco vezes o valor patrimonial, não é complicado pagar aquisições com ações emitidas especialmente para isso, sem ameaçar o controle.
Na avaliação da analista Yolanda Courtines, do JP Morgan, a aquisição pode ser bastante positiva para o Itaú pelo balanceamento de riscos, crescimento na administração de recursos e a presença de um forte sócio (Bank of America) no capital do Itaú, que permitiria ao banco brasileiro ampliar sua alavancagem e utilizar seu know-how em novos mercados como o de hipotecas.
Para ela, a troca dos ativos do Bank of America na América do Sul por uma participação no Itaú está em linha com a estratégia adotada pelo banco americano em mercados fora dos Estados Unidos. O BofA tem 25% do Santander Serfin no México, um dos principais bancos do país, e adquiriu no ano passado 9% no CCB, na China, com opção de ampliar sua participação a 20%.
O JP Morgan também avalia que a aquisição do BankBoston por US$ 3 bilhões equivale a 2,4 vezes o valor contábil dos ativos da instituição nos três países _ uma relação considerada "razoável" pela equipe de analistas. "Como as ações do Itaú estão sendo negociadas por 5 vezes o valor contábil do banco brasileiro, em dólar, o preço não nos parece muito oneroso a princípio."
Os analistas calculam que a transação irá gerar um ágio de US$ 1,7 bilhão, valor que deverá ser amortizado rapidamente pelo Itaú se considerado seu histórico em outras aquisições.
Entre os riscos potenciais do negócio, a analista do JP Morgan acredita que a diversificação regional agregará pouco ao banco em comparação à energia que o time de dirigentes terá de dedicar a esses mercados. No Chile, o Boston tem 2,2% de participação de mercado (volume de depósitos) e 1,8% no total de empréstimos. A presença no Uruguai é maior: 15,2% de participação nos empréstimos, se considerados apenas os bancos privados.
Outro risco apontado pelo relatório refere-se à diluição do lucro. Se as operações nos três países não gerar lucro (em 2005, houve prejuízo de US$ 91 milhões), essa diluição será de 8%. Para não haver impacto, a rentabilidade dos ativos adquiridos teria de ficar em 21,5%.
Já o analista João Augusto Salles, da Lopes Filho & Associados, prefere confrontar os preços com os depósitos. O BankBoston registrava R$ 4,7 bilhões de depósitos em dezembro, equivalente a US$ 2,2 bilhões. Paralelamente, as operações de crédito totalizavam R$ 7,5 bilhões (US$ 3,5 bilhões). Considerando que os focos do Bank Boston são o middle market e private bank, "não acredito que ocorra uma forte sobreposição de clientes, uma vez que o Itaú tem como alvo as pessoas físicas.
Salles lembrou também que o BankBoston investiu recentemente para avançar na área de middle market, cujo cenário é promissor em vista das perspectivas de crescimento da economia. O Itaú também tem se esforçado nessa direção.
O analista lembrou também que há poucas opções de compra de bancos no mercado brasileiro, o que pressionada os preços. Além disso, o Itaú tem experiência em extrair sinergia nas diversas aquisições que já realizou.