Título: Empresários criticam tom antinegócios de Morales
Autor: Rodrigo Uchôa
Fonte: Valor Econômico, 27/04/2006, Internacional, p. A13

O empresariado boliviano teme que, ao hostilizar empresas estrangeiras e assumir um tom "antinegócios", o presidente Evo Morales afugente investimentos e prejudique o crescimento. Além disso, o país estaria se distanciando de mercados importantes, como a Comunidade Andina e os EUA, o que o deixaria dependente demais da Venezuela de Hugo Chávez.

O presidente da Cainco (Câmara de Comércio e Indústria de Santa Cruz), Gabriel Dabdoub, se disse preocupado, pois "não se pode atrasar o desenvolvimento de todo o sudeste boliviano [região onde fica Santa Cruz]".

Apesar de não citar diretamente a crise entre o governo e a brasileira EBX, a Cainco foi uma das defensoras da entrada de estrangeiras para desenvolver o setor siderúrgico do país. E também defende a atuação da Petrobras no país.

Atualmente, a maior preocupação de Dabdoub é o projeto de exploração da jazida de ferro de Mutún, uma antiga reivindicação do empresariado boliviano. Os planos de início de exploração estão suspensos há mais de dez anos.

Mutún fica numa região próxima à fronteira do Brasil e deve movimentar US$ 1,1 bilhão - seria o maior investimento feito de uma tacada só no país em um século. Estima-se que haja lá até 40 bilhões de toneladas de minério de ferro.

"Quando 2 das 5 empresas que concorrem pelo projeto jogam a toalha, temos de prestar atenção no que está errado", afirma o dirigente patronal, citando a retirada das propostas da EBX - na verdade excluída do processo licitatório pelo governo boliviano- e da chinesa Shandong Luneng.

O líder empresarial se diz contra o afastamento em relação à Comunidade Andina (CAN). Comentando as afirmações do presidente boliviano de que o país deixaria o grupo, caso Colômbia, Equador e Peru ratifiquem tratados de livre comércio com os EUA, Dabdoub disse esperar que Morales tenha uma "atitude patriótica" e trabalhe para conservar os mais de 1,3 milhão de empregos na Bolívia que dependem das exportações, principalmente de soja, para a CAN.

"[Morales] deve assumir a presidência temporária da CAN como uma atitude patriótica que permita salvar os empregos de milhares de bolivianos", disse.

Já os empresários da outra região economicamente importante do país, o Departamento de La Paz, onde fica a capital, temem que a excessiva ligação com Chávez e a Venezuela ameace a relação com Washington.

Para Guillermo Pu Munt, vice-presidente da Câmara de Exportadores boliviana, o país não pode se isolar de mercados importantes, dos quais depende a sua indústria. "A relação da Bolívia com os americanos sempre foi de amor e ódio. Mas não podemos deixar de lembrar que 70% das exportações do Departamento de La Paz são para os EUA. São 316 empresas que dependem dessas exportações, 60% delas micro e pequenas empresas."

A Bolívia desfruta de um regime de preferência tarifária nos EUA, renovável regularmente, em troca do combate ao narcotráfico. Pu Munt reclama que o governo não vem tomando providências para renegociar essa preferência, que vence em dezembro. Ele teme uma quebradeira generalizada, caso perca o mercado americano.