Título: Governo desrespeita lei fiscal para viabilizar votação do Orçamento
Autor: Mônica Izaguirre e Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2006, Política, p. A7
O governo passou por cima da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para poder fechar com o PFL um acordo para votação do Orçamento Geral da União. Segundo documento encaminhado pelo Tesouro Nacional ao relator da Comissão Mista de Orçamento, deputado Carlito Merss (PT-SC), o Estado do Sergipe não está enquadrado nas exigências da lei para poder receber um financiamento do BNDES. Ainda assim, o líder do governo no Congresso, senador Fernando Bezerra, anunciou, ontem à noite, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o compromisso de que o financiamento vai sair. Ruy Baron/Valor - 10/8/2005 Genro: encarregado de avisar à oposição de que o governo estaria disposto a ceder para aprovar o Orçamento
O problema segundo o Tesouro é o excesso de gastos com pessoal no Poder Legislativo do Estado. Uma das condições da LRF para que os Estados possam se endividar é cumprir o limite de 3% da Receita Corrente Líquida. No caso do Sergipe, o gasto do Legislativo passa dos 5%. O PFL, partido do governador João Alves, alegava, porém, que o problema é perseguição política. O Estado quer o dinheiro do BNDES para construir uma ponte de Aracaju a Barra dos Coqueiros.
Ao longo do dia, o presidente Lula já tinha determinado à equipe econômica que atendesse, na medida do possível, às exigências adicionais do PFL e do PSDB para votar o Orçamento. Mas, às 22h30, o projeto não tinha sido aprovado.
"Os ministros foram orientados a manter o diálogo e a tentar viabilizar o atendimento das demandas. Ele pediu que as tratássemos com boa vontade", afirmou o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Ele acabara de sair de uma reunião com Lula, da qual também participaram os ministros da Fazenda, Guido Mantega, da Casa Civil, Dilma Rousseff e da Coordenação Política, Tarso Genro, interlocutor junto ao Congresso.
O PSDB também fez exigências novas depois que o governo concordou em aumentar de R$ 3,4 bilhões para R$ 3,9 bilhões os recursos destinados a compensar os Estados por perdas com a desoneração tributária das exportações de produtos primários e semi-elaborados (compensações da Lei Kandir) O partido queria garantias de que a Petrobrás vai iniciar esse ano a construção do gasoduto Coari-Manaus, no Amazonas, Estado do líder do partido no Senado, Arthur Virgílio. Segundo o ministro Paulo Bernardo, esse é um pleito possível de atender porque não implica despesas adicionais às que já estão previstas no Orçamento de investimentos das empresas estatais. A Petrobras deve aplicar este ano R$ 110 milhões no projeto, cujo custo total passa, segundo o ministro, dos US$ 1,5 bilhão.
O discurso de Virgílio no reinício da sessão do Congresso que deveria votar o Orçamento ontem à noite mostrou que houve entendimento sobre a questão. O líder tucano fez um apelo aos demais parlamentares para que aprovassem o substitutivo da Comissão Mista de Orçamento (com as modificações relativas à Lei Kandir) "Esta é uma queda de braço onde todos perdem... Chegamos ao limite máximo da corda esticada", afirmou o senador, defendendo que "o governo tem o direito " de ter o Orçamento aprovado.
Em entrevista dada ao Valor, mais cedo, Virgílio defendeu que o gasoduto Coari-Manaus não é um pleito paroquial e sim um compromisso do governo federal, de grande importância para o desenvolvimento da Região Norte.
O PFL ingressou, na noite de ontem, com uma ação direta de inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal contra uma das medidas provisórias editadas pelo governo Lula para liberar o Orçamento. O partido quer que os ministros do STF derrubem a MP nº 290. A medida determinou a abertura de crédito extraordinário de R$ 1,7 bilhão em favor de diversos órgãos do governo. O Ministério da Defesa recebeu R$ 690 milhões. O do Trabalho ficou com R$ 200 milhões e a Pasta das Cidades com R$ 111 milhões.
O PFL detalhou todos os gastos previstos pela MP para, em seguida, contestar a legalidade das liberações. O ministro Cezar Peluso foi sorteado relator da ação.