Título: Exportação de conhecimento e o investimento do BNDES
Autor: Armando Mariante Carvalho Jr
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2006, Opinião, p. A12
A importância da chamada economia do conhecimento (EC) ou economia intangível tem crescido em ritmo avassalador no cenário mundial. Seu peso na agregação de valor e no PIB das nações é cada vez mais elevado. A ela se deve, em grande medida, a distância abismal hoje existente entre as sociedades ricas e pobres, pois está intimamente associada a uma base educacional de boa qualidade.
O "boom" da internet contribuiu fortemente para a EC, pois escancarou as portas da informação de forma inédita na história da humanidade. Essa "democratização", porém, é relativa, pois o acesso efetivo à informação, ou seja, a transformação desta em conhecimento, depende, em última análise, da formação dos indivíduos. A verdade é que a sociedade do "ponto-com" está longe de ser democrática.
As nações, empresas e sociedades que, de alguma forma, perceberam essa importante transformação, largaram na frente e são hoje exportadoras de produtos invisíveis, intocáveis, seguramente os mais nobres. É uma miríade de segmentos como marcas, patentes, sistemas, métodos, softwares, projetos, todos intangíveis. Não são poluentes, não esgotam reservas naturais, não usam trabalho escravo, não contribuem para o aquecimento global. Sua cotação no mercado é elevada. A Microsoft não necessita de fábricas; seus estoques, invisíveis, são o conhecimento acumulado e milhares de gigabytes para armazená-los. O mesmo se aplica à Apple, à Sony e à Intel, entre outras.
Matéria recente da revista "Business Week" destaca que as estatísticas vigentes não estão aptas a medir a riqueza do produto intangível de uma economia. Sustenta a matéria que os investimentos nos EUA são, na verdade, cerca de um trilhão de dólares superiores ao que medem os dados governamentais. O diretor do Centro de Desenvolvimento Internacional de Harvard vai mais longe. Ele sustenta que o déficit atual dos EUA simplesmente desaparece se forem incluídas a produção e a exportação de conhecimento nas estatísticas oficiais.
O Brasil, nesse contexto, vai bem, embora pudesse ir muito melhor. O país conta com inúmeras empresas e entidades atuando na produção de conhecimento e, não raro, exportando esse produto. As aeronaves da Embraer são exemplo de intangível. Com 4 mil engenheiros em seu quadro, a Embraer, na verdade, produz e exporta conhecimento de ponta materializado em modernas aeronaves. Para se ter idéia da magnitude desse intangível, basta comparar preços do alumínio de aviação - cinco dólares por quilo - com o preço médio de uma aeronave - mil dólares por quilo. O mesmo ocorre com as frentes de produção de conhecimento da Petrobras e suas centenas de empresas fornecedoras de pequeno e médio porte.
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As empresas de engenharia têm, igualmente, se destacado na produção de conhecimento no Brasil. Apesar de o país ocupar modesto 15º lugar na classificação mundial dos países exportadores de engenharia, conta com empresas de excelente qualidade, consolidando presença no mercado internacional.
O BNDES, principal agência de fomento do país, tem procurado se adaptar de forma acelerada a essa nova realidade, conferindo alta prioridade aos investimentos na produção de conhecimento.
Essa complexa matéria foi exaustivamente discutida pelos técnicos do banco ao longo dos últimos anos, com destaque para uma tese de doutorado intitulada "Considerando os Intangíveis - Brasil e BNDES", de autoria do engenheiro Eduardo Rath Fingerl, funcionário de carreira e ex-diretor do banco. Em 2005, foram introduzidos diversos aperfeiçoamentos nessa direção. Mas não paramos por aí e demos mais um importante passo já no início de 2006, com a aprovação das novas políticas operacionais do banco em que o apoio à inovação assume o primeiro posto entre as prioridades.
As exportações de intangíveis, particularmente software e serviços de engenharia, também são financiadas, mediante as linhas do BNDES-Exim.
Em meio a esse trabalho de adaptação a novos tempos, fomos bombardeados, muitas vezes, por críticas equivocadas que sustentavam que o banco estaria financiando obras em outros países em detrimento de investimentos similares no Brasil. Foram citadas com alguma freqüência as obras dos metrôs de Caracas e Santiago, que seriam apoiadas pelo BNDES em detrimento dos metrôs de São Paulo e Rio. Nada poderia estar mais longe da verdade. Em primeiro lugar, o BNDES financia, sim, obras públicas no Brasil e tem feito isso sistematicamente ao longo de seus 53 anos de história. Se e quando alguma liberação deixa de ser feita, isso se deve, não a decisão arbitrária do banco, mas a problemas do Estado ou do município junto aos órgãos federais de controle aos quais o banco tem, legalmente, que se submeter. Particularmente, a lei de responsabilidade fiscal, em vigor desde 4 de maio de 2000, impede, por vezes, desembolsos por parte do banco. De outro lado, o BNDES não financia nem nunca financiou obras em outros países. O que o banco financia é exatamente a exportação de bens e serviços, entre eles os de engenharia, produzidos no Brasil. Seu financiamento, muitas vezes vital para que as exportações brasileiras sejam competitivas, se insere na economia do intangível. Ao mesmo tempo em que geramos emprego, renda e divisas no país, contribuímos para consolidar a presença do Brasil no seleto clube dos países exportadores de conhecimento.
Armando Mariante Carvalho Júnior é diretor das Áreas Industrial e de Comércio Exterior do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).