Título: Queda do juro força investidor a arriscar mais
Autor: Daniele Camba
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2006, Eu &, p. D2

Quanto mais cair a taxa básica de juros (a Selic), maior terá de ser o apetite do investidor por risco se quiser manter o mesmo nível de retorno que obteve até agora no sossego dos fundos de depósito interfinanceiro - os DI. Essa é a opinião dos analistas, que acreditam que, se o investidor ainda não fez essa mudança, com a possível queda da Selic de 0,75 ponto percentual na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que termina hoje, não terá outra alternativa, senão a de alçar vôo para terras mais arriscadas, como os fundos de renda fixa e os multimercados.

Com esta, será a sétima queda da taxa de juros desde que o Banco Central começou o processo de cortes em setembro. De lá para cá, a taxa caiu de 19,75% ao ano para os atuais 16,50%. Junto com a Selic, o investidor precisa perceber que o juro real (descontado a inflação) também está em queda, ou seja, o ganho que efetivamente vai para o seu bolso não é mais o mesmo. Isso ocorre porque a queda da inflação está mais lenta que o ritmo de redução dos juros.

Os contratos de swap de 360 dias - que apontam as projeções para os juros daqui um ano - descontados a inflação projetada para esse período, de 4,17% ao ano, e um imposto de renda de 20% - apontam hoje para um ganho real líquido de 7,6% ao ano. Em abril do ano passado, por exemplo, esse ganho era de quase de 10%. "Acabou a longa fase de ganho fácil nos fundos DI, a partir de agora, quem quiser manter o retorno terá de investir em ativos mais longos e de maior risco", diz o sócio da Quadrante Investimentos, Marcelo Audi. Esse novo cenário, segundo ele, veio para ficar, calcado em dois fatores, a melhora das contas externas e o controle da inflação.

Desde a desvalorização do real, em 1999, em todos os anos a inflação esteve abaixo de dois dígitos, com exceção apenas de 2002, quando houve a turbulência com a eleição, lembra Audi. E este será o primeiro de todos esses anos em que a inflação, além de abaixo de dois dígitos, ficará abaixo de 5% ao ano. "Abaixo desse nível, a incerteza do investidor estrangeiro com relação ao sucesso da economia cai vertiginosamente", afirma o sócio da Quadrante. A política fiscal, segundo ele, é o único aspecto que ainda precisa melhorar.

Nessa linha de tomar mais risco e investir em prazos maiores em troca de manter o retorno, Audi cita o exemplo dos multimercados, os FIDCs e os CRIs. Dentro dos multimercados, ele acredita que os fundos de arbitragem em ações (long/short) são a melhor alternativa, para aproveitar a fase de volatilidade que o mercado deve passar, reflexo da eleição no Brasil e do aumento dos juros no mundo.

Mais do que a decisão que o Copom irá tomar hoje, o investidor precisa se dar conta de qual é a tendência de longo prazo dos juros, segundo o superintendente de renda fixa do ABN Amro Asset Management, Eduardo Castro. "A distorção de retorno alto, sem risco, está próxima do fim." Entre os fundos, ele acredita que os multimercados são a melhor opção pela diversidade de mercados em que atuam. O investidor, no entanto, tem uma enorme resistência em fazer mudanças no dinheiro aplicado. "Mas isso já está ocorrendo nas novas aplicações, que se concentram mais em carteiras com maior risco do que em fundos DI", completa.

Para o diretor da Black River Asset Management João Cesar Tourinho, além dos títulos públicos prefixados e os indexados à inflação, com o crescimento maior da economia, a bolsa também se mostra como uma opção atrativa. Ele lembra que setores como consumo e infra-estrutura (telefonia, energia, saneamento) são especialmente beneficiados por uma queda dos juros. Mais do que consumo, que já subiu, as ações dos setores de infra-estrutura ainda possuem múltiplos bastante atraentes.