Título: Retomar a produção normal de petróleo pode levar anos
Autor: Blas , Javier
Fonte: Valor Econômico, 24/08/2011, Internacional, p. A9

A Líbia poderá retornar ao mercado mundial de petróleo em algumas semanas, se os rebeldes conseguirem assegurar sua vitória, mas a plena retomada da produção levará meses, talvez anos.

A Líbia produzia cerca de 1,6 milhão de barris por dia (b/d) de petróleo antes do início da guerra civil, mas o conflito de seis meses reduziu o fluxo para apenas 50 mil, segundo estimativas do setor.

Consultores e executivos do setor acreditam que o país poderá produzir 300 mil b/d em até três meses nos campos do leste, sob controle dos rebeldes. Mas levar a produção até níveis pré-crise levará anos, no cenário mais benigno.

"Não creio que a Líbia retomará sua produção anterior à guerra antes de 2013, talvez bem depois", diz Ben Cahill, especialista em Líbia na PFC Energy, uma consultoria petrolífera nos EUA, ecoando uma visão consensual no setor.

A Wood Mackenzie, outra consultoria petrolífera, concorda. Em relatório divulgado na semana passada, diz que serão precisos cerca de 36 meses para a produção voltar aos níveis pré-crise.

A experiência anterior em perda de produção petrolífera - do Irã após a Revolução Islâmica de 1979 à Venezuela após a greve na PDVSA em 2002-03 -, indica que a produção leva um tempo considerável para retornar aos níveis normais.

No Iraque, embora a infraestrutura petrolífera tenha saído em grande parte intacta da guerra com os EUA em 2003, a produção voltou ao nível anterior à guerra só em 2008, pois o fim das hostilidades foi seguido de caos político, saques e ataques à infraestrutura.

"Como demonstrou a segunda guerra no Iraque, será vital saber em que medida a paz poderá ser efetivamente policiada para o reinício rápido da produção", diz Lawrence Eagles, chefe de pesquisa no setor petrolífero no JPMorgan e ex-alto funcionário da Agência Internacional de Energia. Executivos e consultores temem que divisões entre os rebeldes possam criar problemas semelhantes na Líbia.

Mesmo que o país evite as armadilhas políticas e de segurança, fatores geológicos poderão se tornar obstáculo nos depósitos de Sirte, que responde por cerca de dois terços da produção de petróleo líbia. Os campos lá estão maduros e, como resultado, provavelmente exigirão amplos reparos para que a produção seja restaurada. Além disso, alguns terminais de exportação petrolífera, como Ras Lanuf e Es Sider, no centro do país, e Melitah, no oeste, foram danificados.

As companhias petrolíferas dizem que seus veículos desapareceram de suas garagens, ao passo que os preços elevados de metais básicos, como o cobre, estimulam saques por gangues locais. Assim, o cenário mais provável é um progressivo incremento da produção.

Mas, com o petróleo acima de US$ 100 o barril, o incentivo financeiro a uma retomada da produção integral é tão grandes que o novo governo e empresas estrangeiras trabalharão arduamente para acelerar a produção.

O leste do país deverá ser a primeira área a reiniciar a produção, com a Arabian Gulf Oil Company (Agoco), com sede em Bengasi. A Agoco rompeu ligações com a National Oil Company, controlada por Gadafi, meses atrás, e pode chegar a bombear 440 mil b/d de campos petrolíferos no leste, inclusive o de Sarir, o maior na Líbia.

Por um breve período, a Agoco exportou algum petróleo no início da guerra, mas foi forçada a parar após as forças de Gadafi atacaram os campos. Desde então, o Conselho Nacional de Transição rebelde vem formando uma força de proteção para permitir reparos. A Agoco espera que os reparos sejam concluídos em duas ou três semanas, e a utilização de um duto de 500 km pelo deserto no leste da Líbia seja reiniciada em breve.

As perspectivas para outras áreas são mais incertas, pois as empresas petrolíferas ainda precisam avaliar os danos às instalações.

Executivos estrangeiros têm oferecido previsões otimistas, dizendo que poderão reiniciar a produção antes do fim do ano. Entre os mais otimistas está a espanhola Repsol YPF, segunda maior petrolífera estrangeira na Líbia em volume de produção, e a Wintershall, subsidiária da alemã Basf.

A italiana Eni também poderá retomar a produção nos campos marítimos de forma relativamente rápida. A área, conhecida como bacia pelagiana, fica a 100 km ao norte de Trípoli, no Mediterrâneo.

As perspectivas para a bacia central de Sirte, controlada por Gadafi, são muito mais pessimistas. A área deverá exigir reparos amplos e demorados.