Título: Apesar do otimismo, capital de risco vê movimento com cautela
Autor: Ricardo Cesar e João Luiz Rosa
Fonte: Valor Econômico, 18/04/2006, Empresas, p. B2

Nos Estados Unidos e em alguns outros países, os investidores de risco são uma das principais fontes de financiamento para empresas nascentes de diversos setores, especialmente as de tecnologia. Da Intel até o Yahoo, muitas gigantes que hoje valem bilhões de dólares começaram com aportes modestos advindos de "venture capital", que injetaram os recursos necessários para que os empreendimentos crescessem. Mais tarde, com as companhias supervalorizadas, os fundos venderam suas participações na bolsa com grandes lucros.

Essa situação não se repete no Brasil, onde os gestores dos fundos sempre reclamaram da fragilidade do mercado acionário. Se entrar no capital de uma companhia nacional é fácil, sair é uma luta, eles argumentam, já que o caminho das bolsas é incerto.

Agora, com a atual receptividade às ofertas iniciais de ações, seria de pensar que o problema evaporou, mas quem administra os fundos diz que não é tão simples assim. "O mercado de capitais evoluiu bastante, mas ainda não está no estágio de outros países", diz Fábio de Paula, diretor da Intel Capital, braço de capital de risco da gigante americana dos chips.

A Intel Capital atua exclusivamente no apoio a empresas de tecnologia. Em atividade no Brasil desde o fim de 1999, tem oito investimentos em carteira no país e, no mês passado, anunciou a criação de um novo fundo, de US$ 50 milhões, a ser aplicado exclusivamente em empresas brasileiras.

O momento positivo do mercado pesou na decisão de criar o novo fundo, mas critérios bem mais amplos foram levados em conta, diz o executivo da Intel Capital. É o caso da estabilidade econômica, da redução do risco Brasil e do próprio interesse da Intel em ampliar seus negócios no chamado Bric, o bloco que inclui Rússia, Índia e China, além do mercado brasileiro.

Na Eccelera, que administra fundos do grupo venezuelano Cisneros, a percepção é de que o caminho da bolsa requer muitos cuidados e ainda é recente demais para justificar um aumento súbito dos investimentos. "Você não toma a decisão de investir em uma companhia por algo que pode ser circunstancial", diz Marcelo Safadi, diretor financeiro da empresa. "No Brasil, a bolsa ainda é uma saída complementar. A venda potencial para um comprador estratégico é a primeira opção", afirma o executivo.

A Eccelera gerencia dois fundos, o primeiro de US$ 20 milhões e o segundo de R$ 24 milhões. Ao todo, tem participações em 16 empresas, a maioria delas com um forte componente de TI.

Apesar das limitações, porém, a bolsa tem servido para que outros tipos de investidor, além dos fundos, sejam remunerados. É o caso dos fundadores das companhias que estão abrindo o capital. Na Vivax, 85% da oferta foi uma captação secundária, destinada a remunerar o investimento dos sócios originais. "Mas isso varia. Há companhias que fazem 100% de captações primárias", diz Carlos Norbert, diretor de relações com investidores da companhia, que fornece serviços de TV paga e internet em banda larga.

Os investidores de risco, no entanto, querem mais - e estão se organizando para isso. A principal queixa é que, até hoje, apenas companhias de porte médio para cima têm condições de negociar publicamente seus papéis.

Para tentar reverter esse quadro, a Associação Brasileira de Venture Capital (Abvcap) discute formas de negociar ações de empresas de menor porte. O caminho seria o Bovespa Mais, uma iniciativa anunciada no ano passado justamente para atrair empreendimentos menores. Até agora, nenhuma empresa alistou-se no Bovespa Mais.

A idéia é criar um mercado paralelo para negociar os papéis de companhias menores, com faturamento próximo a R$ 100 milhões.

Marcus Regueira, sócio diretor da FIR Capital, um fundo de investimento de risco que ficou conhecido depois de vender para o Google sua participação na brasileira Akwan, é um dos membros da Abvcap, que participa dos esforços para tirar o Bovespa Mais do papel. "Isso garantiria liquidez e abriria novos horizontes para investimentos de capital empreendedor", diz.

Regueira acredita que o nível de governança exigido no Bovespa Mais é suficiente para garantir que os papéis negociados sejam de empresas sólidas e transparentes. "É claro que há o risco de companhias pequenas não terem liquidez, mas isso é um risco normal de mercado", afirma.

A aposta da Abvcap é de que o sucesso do Bovespa Mais criaria um mercado propício para que os investidores de risco comprassem e vendessem participações nas empresas em que investem, dando oportunidades de saída para os fundos.

Hoje, os investidores ficam engessados ao adquirir participação em um negócio de pequeno ou médio portes. A única chance de recuperar o investimento é uma boa oferta de aquisição da companhia, o que nem sempre acontece. Essa dificuldade limita o interesse dos fundos no país.

"A tendência é que o Bovespa Mais incentive o surgimento de mais fundos de investimento - e fundos maiores", diz Regueira. "Seria ótimo para os investidores e também para as pequenas empresas, que ganhariam opções de financiamento." (JLR e RC)