Título: Governo quer manter a estatal forte
Autor: Borges,André
Fonte: Valor Econômico, 29/07/2011, Brasil, p. A3

Não importa o rumo que será dado às concessões, o governo sabe que o desgaste político será inevitável. Cabe, portanto, escolher o caminho mais suave. Entre os interesses envolvidos nessa decisão, há um fator que tem sido observado com todo cuidado: proteger a musculatura da Eletrobras.

Se, por acaso, o governo decidisse por licitar novamente o controle dos empreendimentos que vencem daqui a quatro anos, boa parte da infraestrutura da estatal estaria em jogo, avalia uma graduada fonte do setor. "Veja que a Eletrobras detém 65% da potência total que vai vencer. Não parece razoável que o governo esteja disposto a arriscar o controle desses ativos", disse essa fonte.

O potencial de investimento do mercado para o setor também pesa na balança a favor da prorrogação. Técnicos do governo entendem que, ao oferecer empreendimentos prontos e em operação para o mercado, o Planalto poderia minar o apetite de investidores em alocar dinheiro em novos projetos, ou seja, em empreendimentos que ampliem a capacidade do país, gerando energia nova.

Não há consenso sobre qual seria o preço total das hidrelétricas que terão seus contratos vencidos. No entanto, se tomados como base os preços atuais de construção, calcula-se que seria necessário investir pelo menos R$ 54 bilhões em novas usinas para jogar no sistema interligado nacional os 18 mil MW de potência que estão em jogo.

A alternativa por novos leilões envolveria ainda um complicado acerto de contas com os atuais concessionários. Até agora não há um levantamento que dimensione o real valor dos investimentos já aplicados. As avaliações da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre o patrimônio das concessionárias foram feitas apenas em alguns casos, em processos de interesse específico e com base em cifras apresentadas pelas próprias companhias.

Os concessionários já avisaram que parte de suas estruturas não foi totalmente amortizada. Um exemplo é a Cesp, de São Paulo. A companhia, conforme informou o Valor na segunda-feira, tem nas mãos uma fatura de R$ 9 bilhões para apresentar ao governo a título de indenizações, caso se decida por fazer leilão de suas concessões.

Embora já exista um fundo setorial para indenizar o concessionário pelos investimentos não amortizados - a chamada Reserva Global de Reversão (RGR), que é cobrada na conta de luz da população -, técnicos da Aneel admitem que nunca foi estabelecido uma metodologia para auferir esses valores, separando itens como o preço dos ativos, o gasto real com a reposição de equipamentos e aquilo que já está depreciado.

O governo sabe que enfrentará um caminho repleto de armadilhas jurídicas e dúvidas sobre o impacto econômico que a decisão trará. As críticas são muitas. Nos bastidores tem sido dito que a estratégia do Planalto seria deixar o tempo rolar, exaurindo, assim, qualquer possibilidade de realização de novos leilões.

Perguntado sobre o assunto, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, foi enfático. "Essa coisa [de demora na decisão] é balela, é conversa fiada. A licitação, se vier a ocorrer, o que é uma hipótese, se dará a partir de 2015. Portanto, ainda no outro governo", disse.

O destino das concessões, segundo Lobão, ainda está sendo escrito na Casa Civil. "Já fizemos, há três meses, um debate sobre o assunto. Não chegamos a uma conclusão. Ficamos de ter outro debate, mas isso não ocorreu ainda", afirmou.

O rumo que será dado a essas concessões - um pacote que também envolve 73 mil quilômetros de redes de transmissão (82% da rede básica nacional) e mais 42 concessionárias de distribuição de energia - é discutido há pelo menos quatro anos na Aneel. Como são empreendimentos com mais de 50 anos de operação e já passaram por uma renovação de outorga, a lei exige que sejam realizados novos leilões. Isso significa que, para prorrogar os contratos, a governo precisa submeter ao Congresso uma proposta de alteração de lei, decisão que mexerá com o futuro do setor. (RB e AB)