Título: Inflação bate à porta e faturamento cai
Autor: Simões , Katia
Fonte: Valor Econômico, 29/07/2011, Especial, p. F4

Depois de 18 meses de crescimento contínuo, as micro e pequenas empresas paulistas apresentaram queda no faturamento real. Foi o que revelou uma pesquisa realizada pelo Sebrae-SP envolvendo 2,7 mil empresários. Em todo o Estado, as micro e pequenas empresas faturaram 1,5% menos em abril deste ano na comparação com abril de 2010.

De acordo com o levantamento, a indústria foi o setor que apresentou maior queda, com redução no faturamento real de 8,2% tomando por base o mesmo período do ano anterior. O comércio também apresentou recuo de 1,6%. O único a mostrar crescimento foi o setor de serviços, na casa dos 3,2%.

Com esses resultados, a receita das MPEs paulistas durante o mês de abril foi de R$ 25,5 bilhões, exatos R$ 912 milhões a menos que no mês de março e R$ 401 milhões a menos que em abril de 2010.

"Desde o início do ano estamos sinalizando que as previsões de inflação e o aumento dos juros para diminuir o crédito acenderiam o alerta amarelo para os próximos meses", afirma Bruno Caetano, superintendente do Sebrae-SP."Trata-se apenas de um sinalizador, pois foi o primeiro mês de queda do faturamento, mas suficiente para levar as micro e pequenas empresas a tomar medidas preventivas, como ampliar os índices de produtividade com a redução de desperdícios, aprimorar a qualidade dos produtos, a fim de obter mais valor agregado, e dar mais atenção às finanças, evitando tomar crédito, que está mais caro."

Caetano não acredita na volta da hiperinflação, mas reforça que a inflação pouco a pouco bate à porta das pequenas empresas e é sentida no dia-a-dia. "Eu só conhecia a inflação como consumidor, não como empresário", declara Fernando Ribeiro, 40 anos, mestre em engenharia mecânica e sócio da MMÓptics, empresa com sede em São Carlos (SP), especializada em equipamentos opto-eletrônicos de alta tecnologia voltados para a área de saúde.

Com 13 anos de mercado, a empresa vem sofrendo nos últimos 18 meses com o fantasma do passado, que acabou por reajustar seus insumos entre 15% e 20%. "Se repassássemos esse percentual para o custo final de nossos produtos, perderíamos mercado", observa Ribeiro. A saída foi trocar de fornecedores no mercado interno, diminuir o índice de nacionalização dos componentes de 95% para 80% e adotar novas práticas de produção, com mais tecnologia, a fim de diminuir custos.

"Mesmo assim, tivemos que repassar 7% de aumento e retirar quatro produtos de linha para atingir a meta de faturamento para este ano, de R$ 7, 5 milhões", afirma o empresário. Com 55 funcionários e 30 produtos no portfólio, a MMÓptics exporta para a América Latina, Ásia e Oriente, tendo faturado no ano passado R$ 7, 8 milhões.

Evitar repassar ao máximo os aumentos para o preço final dos produtos é uma lição que todo micro e pequeno empresário tem de aprender com rapidez, avisam os consultores. "Muitas pessoas trocam de produto nesses períodos e quem insistir em aumentar preços com certeza perderá mercado", afirma José Ricardo da Costa e Silva, professor de macroeconomia do Ibmec-Brasília.

"A ordem é diminuir as margens, assumir o impacto da inflação e repassar o mínimo possível. Quem conseguir ganhar em produtividade tende a diminuir esse peso", diz Costa e Silva.

A saída encontrada pelo empresário Airton Joaquim, 51 anos, sócio da Nexar, para diminuir o impacto da alta da inflação foi centralizar as compras e ampliar a linha de importados. Com três lojas próprias de revenda de produtos de informática, a pequena rede paulista passou a fazer compras centralizadas e a cotar diariamente as ofertas dos fornecedores.

"Antes comprávamos individualmente para cada loja e apenas quando era necessário. Nos últimos 12 meses investimos nas cotações e acabamos virando referência no mercado", diz Joaquim. Paralelamente, ele conta que a empresa passou a aceitar apenas contratos de fornecimento de produtos que estabeleçam as margens a serem trabalhadas.

"É uma parceria que garante a compra e, muitas vezes, significa uma redução de margens de ambos os lados para que na ponta todos ganhem", afirma. Outro cuidado para garantir a manutenção dos preços foi ampliar a linha de produtos importados. Dos 1.200 itens expostos nas lojas, 80% vêm do exterior, pelo menos 15% a mais do que há dois anos. Com essa conduta a Nexar espera faturar R$ 16,2 milhões este ano e abrir sua quarta loja no início do próximo semestre.

Segundo Fausto Morey, da Grau Gestão de Ativos, a inflação recente no país é resultado de diferentes fatores: o gasto público, a elevação do preço das commodities, a demanda interna e a elevação do nível de crédito, entre outros.

Investir na qualificação e na produtividade da mão-de-obra é apenas uma das lições que as pequenas e médias empresas devem pôr em prática nos próximos tempos, sobretudo enquanto a inflação estiver presente, de acordo com o professor Costa e Silva do Ibmec.

"As micro e pequenas empresas dependem da estabilidade econômica para crescer, por isso tendem a sofrer mais a curto prazo com o aumento do custo dos financiamentos e com a redução das vendas, ambos procedimentos naturais no combate à inflação", declara. "Por isso, é preciso evitar tomar crédito, tornar-se o mais eficiente possível e repassar custos só em última instância", ensina o professor.