Título: Voto popular de Netinho atrai adversários
Autor: Klein, Cristian
Fonte: Valor Econômico, 08/09/2011, Política, p. A6

Em qualquer lugar, o dono de um cacife de 7,7 milhões de votos (2 milhões na capital paulista), amealhados na última eleição para o Senado, seria um peso-pesado para disputar a prefeitura, como cabeça-de-chapa.

Mas, em São Paulo, Netinho de Paula - negro, ex-cantor de pagode, filiado a um pequeno partido e com o maior índice de rejeição entre os pré-candidatos, de acordo com pesquisa Datafolha - precisa reafirmar seu projeto, diante de uma elite política que já inicia o movimento de enxugar um cenário que se anuncia fragmentado.

Netinho foi o primeiro a se lançar à corrida municipal. O PCdoB bate o pé e diz não abrir mão da candidatura. Mas, com um perfil de voto popular somado às resistências a seu nome, o vereador se transformou num vice ideal, assediado por concorrentes sem a mesma penetração no eleitorado da periferia. Virou o "noivo" da disputa à prefeitura paulistana.

Já foi elogiado pelos pré-candidatos do PMDB, o deputado federal Gabriel Chalita, e do PTB, o advogado Flávio D"Urso. Tem canal com o prefeito Gilberto Kassab (PSD), de cujo governo o PCdoB é aliado. E está abrindo conversas até com o governador Geraldo Alckmin (PSDB).

"Ele já sinalizou e me disse: Netinho, o café está esfriando...", diz.

Numa disputa que se desenha cheia de nomes novos e múltiplas possibilidades de aliança, a estratégia de Netinho é a mesma dos demais que estão de olho no cargo. Conversa com todo mundo e procura amarrar os apoios.

Conta com o compromisso do PDT (declarado pelo deputado federal e presidente estadual da sigla, Paulinho da Força), e afirma ter o interesse do PR (do deputado federal Valdemar da Costa Neto e do vereador Antônio Carlos Rodrigues), do PSB (do secretário estadual de Turismo e deputado federal licenciado Márcio França) e do PSC, que pede em troca o apoio do PCdoB em outras cidades pelo país.

Netinho tenta formar e liderar seu grupo. Mas sabe que as pressões para desistir são grandes. Há duas semanas, almoçou com Chalita e Baleia Rossi, presidente estadual do PMDB, no qual os dois o sondaram sobre suas reais intenções de levar adiante a candidatura. O vereador não cedeu e ficou acertado um "pacto de cordialidade" no primeiro turno, com promessas de apoio no segundo.

"Eu gostaria que meu vice tivesse um apelo popular. Seria uma honra se ele [Netinho] me apoiasse, tem grande penetração, é muito querido", elogia Chalita.

Presidente da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Flávio D"Urso também acena ao vereador. Embora tenha uma trajetória ligada a partidos mais à direita - é recém-egresso do DEM e candidatou-se a vereador em 1988, pelo então PL, a convite do vice-governador Afif Domingos -, D"Urso não vê problema numa coligação com o vereador do PCdoB.

"Não vejo nenhuma dificuldade com nenhum partido, até porque os nomes não se mostram tão fiéis aos conteúdos programáticos", diz o advogado.

Até agora, Netinho de Paula só não foi procurado pelo PT. Ele conta que, nos últimos oito meses, não houve qualquer diálogo com a direção petista municipal, o que o faz pensar que não existe interesse de aproximação. "A falta de diálogo é que nos empurra para forças que até agora não nos relacionávamos", diz Netinho, referindo-se aos contatos com Geraldo Alckmin.

Decepcionado, o vereador descarta a possibilidade de entendimento com o PT ("Não agora, depois de oito meses") e, numa rara admissão de abrir mão da candidatura, afirma "pouco provável, mas não impossível" ser o vice de um candidato apoiado pelo governador. "Não vou escolher meus amigos. E os amigos são aqueles que estão querendo conversar."

A falta de diálogo entre Netinho e os petistas pode ter pelo menos uma forte explicação, baseada na geografia eleitoral. Seu perfil de votação, concentrado na periferia, reflete praticamente o mesmo padrão tradicional do PT. É o que mostram os mapas das últimas eleições, elaborados a pedido do Valor pela cientista política Lara Mesquista, do Cebrap. Enquanto Netinho teria muito a agregar como parceiro de Chalita, por exemplo, cujo padrão de votação para deputado federal se concentrou nas áreas mais nobres, o vereador quase não acrescentaria ao eleitorado do PT. Sua distribuição de votos na corrida ao Senado foi quase a mesma de Marta Suplicy, a quem quase derrotou, na disputa pela segunda vaga.

"Se esse for o motivo, é um equívoco, porque aliado se ouve; se afastar não dá frutos na política", diz.

E Netinho quer se aproximar de todos. Caso não prospere os contatos com o governador, ele espera juntar forças com o prefeito e bater na tecla da necessidade de se quebrar a polarização em São Paulo entre PT e PSDB - mesma pregação de Chalita e D"Urso.

"O processo de se criar uma terceira via foi um pontapé dado pelo prefeito Gilberto Kassab e que não pode ser interrompido. Em algum momento, terá que sentar com os principais partidos que ele arregimentou e avaliar a melhor saída", afirma o vereador, citando siglas como PCdoB, PDT, PV, PRB e PSB.

Questionado sobre se o fato de ter batido em sua ex-mulher pode atrapalhar seus planos, Netinho minimiza o episódio. "Acho que já chega, né? Pedi perdão publicamente e ela me desculpou", diz.

Pesquisa do Datafolha, no entanto, aponta que o vereador tem a maior rejeição, 33%, empatado, pela margem de erro, com o ex-governador José Serra (32%) e Marta Suplicy (30%).