Título: Aquisição de R$ 1,4 bilhão é um novo marco na trajetória da ALL
Autor: Vanessa Adachi e Ivo Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 10/05/2006, Empresas &, p. B1

A compra da Brasil Ferrovias e da Novoeste por R$ 1,405 bilhão em ações, anunciada ontem , é um divisor de águas na curta história de nove anos da América Latina Logística (ALL), que nasceu da privatização da Malha Sul da Rede Ferroviária Federal. Ao incorporar os dois novos corredores logísticos à sua malha, a empresa expande suas operações, antes concentradas no Sul do país e Argentina, para São Paulo, o centro industrial do país, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, celeiros agrícolas.

Está criada uma ferrovia de 21 mil quilômetros que, embora pequena para padrões americanos ou canadenses, tem potencial de integração de transporte e escala sem precedentes na América Latina. Tudo isso viabilizado por uma operação de troca de ações, ou seja, totalmente fomentada pelo mercado de capitais, em que os acionistas estão financiando o crescimento da companhia. Algo impensável para o setor ferroviários brasileiro há dois anos e muito menos uma década atrás, quando os ativos, em mãos estatais, corroíam por falta de investimentos.

"É um salto para a empresa. Se tudo der certo, dobraremos de tamanho", afirmou Bernardo Hees, presidente da ALL. Ele procurou ser cauteloso. "Assumimos um grande risco e acreditamos na capacidade de fazer uma virada nas empresas compradas. O momento é propício, mas a responsabilidade é grande", afirmou o jovem executivo de 36 anos e no cargo há pouco mais de um ano.

Trata-se da maior operação de compra feita pela ALL, que antes, em 1999, adquiriu duas concessões na Argentina, indo até quase a fronteira do Chile, e também a companhia de logística rodoviária Delara, dando um novo perfil à ferrovia que tinha suas operações restritas ao Sul do país.

Hees estima que serão necessários três anos para fazer a chamada virada nos dois corredores. Para isso, serão empregados mais de R$ 1 bilhão em investimentos - apenas do caixa da "nova ALL" - nos próximos cinco anos, principalmente na recuperação das vias permanentes (trilhos) e em tecnologia.

Ele acredita que os grandes clientes, como Bunge, Cargill e outros do agronegócios e do setor industrial, vão aportar valor semelhante no mesmo período, na aquisição de vagões e construção de terminais. É assim que já funciona o modelo da ALL hoje.

A ALL, disse Hees, levará para as novas empresas seu estilo marcante de gestão, herdado da cultura da GP Investimentos, com obsessiva busca por ganhos de produtividade e redução de custos e também com a fixação de metas claras de desempenho. A mesma fórmula que tirou a malha Sul da antiga RFFSA do estado de sucateamento em que se encontrava em 1997.

O faturamento bruto combinado (pró-forma) da "nova ALL" este ano é de R$ 2 bilhões, a maior parte vinda da ALL. Em 2005, o grupo Brasil Ferrovias operou com margem lajida (lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização) sobre a receita líquida de 17%. Na ALL, a mesma margem foi de 44%. "Mas, ao longo do tempo, as margens da Brasil Ferrovias e da Novoeste devem ser maiores que as nossas, pois as distâncias percorridas em suas malhas são maiores e a intermodalidade, com uso combinado de transporte rodoviário, é menor", afirmou o executivo.

Hoje, o executivo detalhará a operação em São Paulo aos investidores em papéis da companhia. As PNs, nos dois últimos dias, subiram 8,56% na Bovespa.

Nos últimos anos, a ALL tem conseguido crescer seu volume transportado a uma taxa de 10% a 12% ao ano. Como os dois novos corredores estão subutilizados devido ao deficiências de boa parte da malhas (Ferroban e Novoeste) e pela falta de vagões e locomotivas, o potencial de crescimento deles é maior. Tudo somado, a nova empresa espera crescer o volume de carga em ritmo anuais de 15%.

As sinergias esperada da aquisição das novas ferrovias com as malhas e operações da ALL são um ponto-chave no negócio fechado ontem. "O potencial é enorme", afirmou Hees, que ao se envolver nessa intrincada operação enxergou inúmeros ganhos, principalmente com o aumento da escala. "Quanto mais longa, a mais a ferrovia obtém capacidade de investimentos e alavancagem de cargas".

Hees menciona que a menor ferrovia da América do Norte tem 45 mil km. Uma outra, que admira e que cruza Canadá e EUA, tem 55 mil. A "nova ALL" terá 21 mil.

Os ganhos na operação de compra das três concessionárias vão desde compras de materiais, combustíveis, peças, componentes, vagões e locomotivas até à distribuição dos ativos rodantes nas diversas malhas, passando por ganhos fiscais, comerciais (contratos de longo prazo) e de oferta de fretes aos clientes.

O negócio deixou felizes os principais acionistas de Brasil Ferrovias e Novoeste. O presidente da Funcef, Guilherme Lacerda, comentou: "Optamos em participar do acordo com a ALL porque acreditamos na empresa que está sendo formada e entendemos que o negócio será uma operação de ganha-ganha." Segundo ele, esse acordo já estava previsto antes da reestruturação da holding, que envolveu o BNDES, principal credor. "Era fundamental para negociá-las e as mudanças apontavam para a busca de sócio estratégico que desse condições de viabilizar os investimentos necessários". A divida, de longo prazo, fica em R$ 1,6 bilhão com o banco estatal.

Renato Chaves, diretor de participações da Previ, destacou o potencial da nova ALL, com base em relatório doa Merrill Lynch, segundo o qual o preço alvo da sua ação é R$ 215. "A ALL é uma empresa com nível elevado de governança corporativa e avança para chegar ao Novo Mercado da Bovespa". Chaves destacou: "Passamos a participar com percentual menor em uma empresa que vale mais".

Funcef e Previ já aprovaram o acordo em suas diretorias executivas mas ainda terão que submetê-lo às patrocinadoras. Hoje, o BNDES deve aderir-se à operação. Hees prevê que a ANTT aprove o negócio em cerca de 30 dias.