Título: Salários minguaram para 35% do PIB
Autor: Chico Santos
Fonte: Valor Econômico, 06/12/2004, Brasil, p. A2

A participação relativa dos rendimentos dos trabalhadores no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro sofreu uma queda de praticamente dez pontos porcentuais no período de dez anos. É o que se constata ao examinar os números das contas nacionais calculadas pelo IBGE. Em 1993, o rendimento dos empregados correspondia a 45,1% do valor total do produto. Em 2003, essa participação havia encolhido para 35,6%. No mesmo período, o excedente operacional bruto das empresas cresceu de 35,4% para 43% do PIB. No período analisado, os rendimentos dos trabalhadores autônomos também perdeu participação, de 6,3% para 4,5%, e os impostos sobre a produção e importações (descontados os subsídios) passaram de uma fatia de 13,2% para 16,9%. A grande queda na participação dos salários ocorreu em 1994, quando eles perderam cinco pontos porcentuais, caindo para 40,1% do PIB, enquanto a margem operacional bruta das empresas ganhava 3,2 pontos, alcançando 38,5%. Em 1995, os rendimentos dos empregados deixaram de constituir a maior fatia entre os componentes do PIB pela ótica da renda para nunca mais recuperar esse peso. "Na riqueza gerada, o salário perdeu participação e, de uma certa maneira, uma parte disso passou para as empresas. Houve uma transferência de renda", afirmou Carlos Sobral, gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE. Para ele, é um fato que o fim da espiral inflacionária a partir do Plano Real (1994) permitiu a recuperação do poder de compra das camadas de renda mais baixa, mas, na seqüência, o plano acabou prejudicando a classe média, que teve seus rendimentos achatados. O economista Luiz Eduardo Parreiras, responsável pela área de emprego e renda do Grupo de Acompanhamento Conjuntural (GAC) do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), afirma que o fenômeno de perda de participação dos salários no PIB vem de mais longe que os anos 90. "De um modo geral, isso acontece porque o aumento da produtividade que as empresas conseguem não é repassado para os salários", avalia. Mas Parreiras admite que o processo "pode ter-se acelerado nos anos 90 com a reestruturação empresarial e a conseqüente perda do poder de barganha dos assalariados". De acordo com o economista do Ipea, o que os analistas se perguntam é: "Até quando isso vai continuar?" Segundo ele, enquanto houver no mercado um grande excedente de mão-de-obra, não se deve esperar mudanças. "Só vai mudar quando a taxa de desemprego cair a um ponto que permita a recuperação do poder de barganha dos assalariados, obrigando a que o aumento da produtividade seja dividido entre o capital e o trabalho", opinou. O economista José Márcio Camargo, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e sócio da consultoria Tendências, também considera que o aumento do desemprego a partir de 1994 tem papel fundamental na troca de posições entre o capital e o trabalho na distribuição do PIB. "Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), a taxa de desemprego passou de 4% da força de trabalho para 11%, ou seja, foi um aumento muito importante que reduziu a renda do trabalho." O segundo fator, segundo o professor da PUC, foi a queda dos salários reais ocorrida a partir de 1997. Camargo inclui também na sua conta o aumento do número de pessoas que passaram a trabalhar como autônomas. Para ele, esse fenômeno não se reflete no aumento da participação dos autônomos na renda total do país porque os trabalhadores em geral mudam de status ganhando menos do que ganhavam como assalariados formais.