Título: Para que serve mais um Ano Internacional da Juventude?
Autor: Defourny, Vincent; Jovchelovitch, Marlova
Fonte: Correio Braziliense, 07/09/2010, Opinião, p. 17

Representante da Unesco no Brasil

Coordenadora de ciências humanas e sociais da Unesco no Brasil

Datas e anos internacionais servem, em geral, para dois propósitos básicos. O primeiro é aglutinar esforços e atores sociais em torno de um tema que necessite de intervenção coletiva. O segundo é comprometer países e dirigentes políticos com metas e compromissos internacionais. Não por acaso foi com esse espírito que a Assembleia Geral dasNaçõesUnidas estabeleceu o início do Ano Internacional da Juventudeem12 de agosto de 2010. Certamente o tema se enquadra nas justificativas acima. Aproximadamente 18% da população mundial é jovem. Desse contingente, 87% vivem em países em desenvolvimento, onde os desafios em educação, inclusão social e igualdade de oportunidades estão mais presentes.No Brasil, são cerca de 50 milhões de jovens, um quarto da população, o que reforça a necessidade de políticas públicas voltadas para a juventude, pois são de fundamental importância para o país avançar o seu patamar de desenvolvimento. As atividades do ano internacional visam encorajar o diálogo e a compreensão intergeracional e promover os ideais de paz, respeito aos direitos humanos, liberdade e solidariedade. A expectativa da ONU é que o ano sirva para estimular jovens a promover os Objetivos de Desenvolvimento doMilênio entre eles, a redução de males sociais como a extrema pobreza, a fome, a mortalidade materna e infantil e a falta de acesso à educação e à saúde. Essa é a segunda vez que a ONU dedica um ano especial à temática da juventude. A celebração acontece no 25º aniversário do primeiro ano. E o que se conquistou neste período de 25 anos? Por um lado, uma geração inteira presenciou uma maior participação da juventude na vida pública e a sua conquista de espaço e relevância políticosocial. A juventudeou juventudes, considerandose a heterogeneidade do grupo comnuances por classe, etnia, cor, preferência sexual ou ideológicasoube consolidar sua própria ética e estética, forjar seus próprios valores e identidade, e romper convenções e barreiras. O tema também emergiu como objeto concreto de políticas públicas. À medida que se apontavam as fragilidades da condição juvenil contemporânea, a expressão políticas públicas de juventude (PPJs) ganhou relevo. Nas últimas duas décadas, o Brasil avançou na construção de marcos legais, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) e a PEC da Juventude, que insere o termojovem no capítulo dos Direitos e Garantias Fundamentais da Constituição Federal. Nesse intenso processo de consolidação de uma agenda nacional para a juventude, a Unesco lançou estudos e pesquisas sobre fenômenos como a crescente vitimização de jovens pela violência e suas próprias percepções sobre temas como sexualidade, drogas e cidadania. A organização também atuou na construção de referenciais político-institucionais, como a Secretaria Nacional de Juventude (SNJ), oConselhoNacional de Juventude (Conjuve) e o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem). Por outro lado, persistem graves desafios no que se refere à melhoria das condições de vida da juventude brasileira. Essa faixa etária em transição é a mais prejudicada pelo desemprego, pela violência urbana, evasão escolar e falta de formação profissional e de perspectivas. São os jovens brasileiros as maiores vítimas das mortes por homicídio e envolvimento com drogas e criminalidade. Some-se a isso o fato de que as informações lhes chegam de forma fragmentada e tendenciosa, contribuindo para a consolidação do que se chamougeração zapping. A combinação de uma escola excludente e desinteressante com imposições do mercado faz com que metade dos jovens da América Latina não complete o ensino secundário, isso na fase crucial em que a relação entre anos de ensino e renda se faz mais perceptível. Desafios emergentes, como a bioética, os direitos sexuais e reprodutivos, as novas tecnologias e a sociedade do conhecimento convidam a todos para uma renovada reflexão sobre políticas de, para e com a juventude. A nova edição do Ano Internacional da Juventude em 2010 coincide com um momento de decisões políticas em que a população jovem será chamada a contribuir por meio do voto. Que sejamos mais bem-sucedidos que em 1985 e que essa oportunidade nos brinde com um chamado à ação e um debate qualificado sobre o tema. Não há comoesperarmos mais 25 anos!