Título: Queixas do Paraguai ficam sem resposta
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 27/06/2006, Brasil, p. A3

A justificativa oficial foi a agenda apertada dos dois ministros, mas o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, cancelou, no fim de semana, o encontro que teria no domingo com a chanceler paraguaia, Leila Rachid, e a visita ao presidente Nicanor Duarte Frutos, ontem, por uma razão mais séria: decidido a mostrar o interesse do Brasil em relação ao sócio mais pobre do Mercosul, o governo brasileiro não tem resposta às principais reivindicações do parceiro. Nelson Perez/Valor Ministro Celso Amorim: temas sensíveis teriam de ser evitados

A visita de Amorim, curta, estava ameaçada de se tornar um foco de atenções da imprensa brasileira para os problemas na relação bilateral. Os paraguaios elegeram dois temas sensíveis entre os prioritários na discussão com o Brasil: a enorme dívida financeira da Itaipu binacional e as dificuldades do trânsito de mercadorias na fronteira. A solução pouco depende da vontade de Amorim e estão na esfera de decisão do Ministério da Fazenda, que não concorda com as pretensões paraguaias.

Embora só provoquem interesse no Brasil em momentos de crise, quando há denúncias de corrupção em Itaipu, ou bloqueio e protestos violentos na fronteira, esses dois temas foram transformados pela imprensa paraguaia em motivo constante de críticas ao governo paraguaio, acusado de complacência com o "imperialismo" brasileiro. Os paraguaios acusam o Brasil de inflar excessivamente a dívida da hidrelétrica de Itaipu com a Eletrobrás, reduzindo, assim, os royalties a serem pagos ao país e aumentando o custo da energia para os brasileiros.

O governo paraguaio informou ao Itamaraty que esperava de Amorim alguma resposta às propostas entregues em abril, para facilitar o comércio na fronteira, especialmente entre Ciudad del Leste e Foz do Iguaçú.

Além do aumento da cota de compras sem impostos a que têm direito os brasileiros em Ciudad del Leste, atualmente em US$ 300, os paraguaios desejam um sistema de permissão de importações até US$ 1 mil a US$ 1,5 mil, com tarifas crescentes. Argumentam que seria uma maneira de formalizar um comércio já existente, dos sacoleiros, que passariam a ser tratados como pequenos importadores. A Receita Federal brasileira resiste à idéia.

Itaipú é apontada como outro tema "prioritário" pelos diplomatas paraguaios, que fazem questão de apresentar suas propostas como medidas que beneficiariam o consumidor de energia elétrica brasileiro. O presidente do Paraguai, Nicanor Duarte Frutos, pretende tocar nesse assunto e nas outras pendências bilaterais, se for concretizado o encontro de cúpula marcado em 5 de julho, em Caracas, destinado a formalizar o ingresso da Venezuela no Mercosul.

Duarte Frutos quer renegociar a metodologia de correção da dívida de Itaipu, que paga uma taxa de 7,5% e mais a inflação dos Estados Unidos, o que tem elevado continuamente o débito e criado incertezas sobre seu volume, apesar da previsão, em contrato, de que essa dívida deveria estar paga até 2023.

Analistas paraguaios e uma campanha do jornal "ABC Color" reivindicam liberdade para vender a terceiros a energia excedente da usina, hoje, por contrato, dirigida ao Brasil. E acusam o Brasil de planejar o confisco de Itaipu, usando, como pretexto, o pagamento da dívida da binacional, hoje em torno de US$ 19 bilhões.