Título: MP põe em dúvida a postura da CTNBio
Autor: Mauro Zanatta
Fonte: Valor Econômico, 21/06/2006, Agronegócios, p. B14

No meio do fogo cruzado das acusações mútuas entre defensores e opositores dos transgênicos, a procuradora da República Maria Soares Cordioli, indicada pelo Ministério Público Federal para monitorar as reuniões da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), disse que o colegiado "não está muito consciente" de seu papel e "assustado" com suas atribuições para decidir temas ambientais.

"A CTNBio não está muito consciente de seu papel. Parece que a preocupação é mais tecnológica e não com o meio ambiente. O ponto que eles consideram mais importante é a ciência", afirmou ao Valor. "Não é só [a CTNBio] dizer se um produto será autorizado cientificamente, mas também tem que avaliar o viés ambiental, trabalhista e dos direitos do consumidor".

Na primeira entrevista depois de ser indicada pela 4ª Câmara de Meio Ambiente do MPF para a tarefa, a procuradora defendeu a instituição das acusações de "intervenção branca" na CTNBio e considerou "indispensável" sua participação no colegiado responsável pela liberação comercial dos transgênicos. "Não vêem com bons olhos [a participação] porque defendemos teses contrárias ao entendimento da CTNBio." O Ministério Público entrou com uma ação de inconstitucionalidade contra a parte da Lei de Biossegurança que dá poder à comissão para decidir sobre os impactos ambientais dos transgênicos. "É uma atribuição inconstitucional, que viola a Constituição e o sistema nacional de meio ambiente", disse. O MP também tem uma ação contra a liberação comercial da soja transgênica Roundup Ready, da multinacional mpresa>Monsantompresa>.

A procuradora afirmou não acreditar que o procurador-geral, Antonio Fernando de Souza, atenda a pedidos de alguns membros da CTNBio para rever a participação do MP. "Não vejo essa possibilidade. Seria um retrocesso porque não vamos obstaculizar. Defendemos que ela [a CTNBio] funcione. Quando não funcionar é que é um problema", disse.

Como forma de justificar sua participação no colegiado, a procuradora afirmou que o MP está disposto a "apurar responsabilidades" por meio de ações judiciais em casos de "incidentes e acidentes" com a liberação de transgênicos. "Isso pode dar ação civil pública ou criminal", disse. Cordioli disse que "só agora a CTNBio começou, de fato, a funcionar porque antes [da nova Lei de Biossegurança, editada no fim de 2005] havia conflitos de atribuições na lei que a criou". De acordo com ela, sua participação será entendida "com o tempo" porque dará "mais credibilidade à instituição", já que o MP "está para defender não a posição de A ou B, mas a ordem jurídica e os interesses da sociedade".

A procuradora também garantiu que o MP fiscalizará a tramitação de processos e "a correção e a regularidade" dos procedimentos adotados pela CTNBio. Na reunião de maio, o MP obrigou os membros da comissão a assinar uma declaração de conduta explicitando eventuais conflitos de interesse nos julgamentos de processos. Prevista no regimento interno, a obrigação não tinha sido cumprida até então. Cordioli avisou que as próximas determinações do MP serão a publicação das atas de reunião e o completo funcionamento do sistema de informações públicas, obrigações ainda não cumpridas pelo colegiado.