Título: Um olho nas urnas, outro nos tribunais
Autor: Abreu, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 10/09/2010, Política, p. 2

Pautada na Lei da Ficha Limpa, decisão de ministro do STF de vetar candidatura reforça entendimento do TSE e faz com que políticos \"enrolados\" se vejam com o futuro incerto

Ao negar ontem a candidatura a deputado estadual de Francisco das Chagas Alves (PSB-CE) usando argumentos da Lei da Ficha Limpa, o ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal (STF), aumentou ainda mais a tensão entre políticos tradicionais enrolados com a Justiça. Na madrugada de quinta-feira, em decisão semelhante, o ministro Carlos Ayres Britto tinha descartado recurso do ex-governador do DF Joaquim Roriz (PSC). Ele tentava reverter ordem do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que barrou sua candidatura. As decisões deixam claro o entendimento de dois dos 10 magistrados da Suprema Corte, instância que vai colocar um ponto final sobre a aplicação da lei de iniciativa popular nestas eleições.

Pela primeira vez desde a redemocratização, as eleições para governador, senador e deputado poderão ser definidas pela Justiça. Dezenas de pessoas ligadas ao Poder há décadas e colecionadoras de votos estão agora, a pouco menos de três semanas do primeiro turno, dependendo do Judiciário.Mais de uma centena de processos relacionados à Ficha Limpa estão pendentes de conclusão no TSE, enquanto os primeiros recursos contra decisões da Justiça Eleitoral já aportaramno Supremo.

A certeza, por ora, é que os nomes e as fotos dos políticosmesmo os que eventualmente sejam substituídosficarão nas urnas eletrônicas.

O prazo para alterar os dados que vão aparecer para o eleitor foi encerrado em 30 de agosto. O período para a substituição de candidatos a cargos proporcionais também encerrou.

A exceção ocorre para os postulantes a cargos majoritários, que poderão ser substituídos até a véspera das eleições, embora não haja mais tempo hábil para fazer qualquer troca nas urnas. Assim, caso a coligação altere algum candidato ao governo ou ao Senado, a foto será a do original inscrito.Na hipótese deumcandidato a deputado ser barrado de forma definitiva ou desistir, seu nome permanecerá nas urnas, mas os votos dados a ele serão anulados.

A maior contestação apresentada até agora contra a lei é de que ela seria inconstitucional, por violar o artigo 16 da Constituição, segundo o qual uma lei que altera o processo eleitoral só pode ser aplicada um ano depois de entrar em vigor. Advogados também reclamam que nenhuma norma pode retroagir para prejudicar umcidadão.Caso o STF não defina o caso antes de 3 de outubro, candidatos eleitos poderão ter o diploma cassado.

Tendência Em entrevista coletiva ontem, o presidente do TSE, Ricardo Lewandowski, afirmou que a expectativa no Supremo é de que a decisão sobre a Ficha Limpa seja apertada. Alguns ministros que integram oTSE já manifestaram votos, alguns favoráveis, outros contra a Lei da Ficha Limpa, pelo menos quanto à aplicação imediata.

Certamente existirão outras opiniões no STF. A minha expectativa é que o Supremoesteja dividido, disse Lewandowski, que também é ministro da Suprema Corte.

O presidente do TSE também afirmou que há tempo hábil para o STF se pronunciar em definitivo antes do primeiro turno. A partir da semana que vem, o Supremo deve começar a apreciar os processos relacionados à Lei da Ficha Limpa. Existem os prazos processuais e é possível que (os processos) sejam julgados antes de 3 de outubro ou antes da diplomação dos candidatos, destacou.

Qualquer que seja a decisão do STF, antes ou depois do pleito, ela causará grande impacto no processo eleitoral, uma vez que há apenas duas posições: recolocar na disputa políticos tradicionais enquadrados pela Lei da Ficha Limpa ou deixá-los de fora da vida política. Figuras como o ex-governador Joaquim Roriz (PSC), que disputa o GDF, e o deputado federal Jader Barbalho (PMDB-PA), que concorre ao Senado, já foram julgadas pelo TSE. Ambos tiveram a candidatura negada por terem renunciado a mandato eletivo para escapar de uma cassação (veja quadro).

O candidato a deputado estadual Francisco das Chagas, aquele que teve o recurso negado pelo ministro Joaquim Barbosa, foi o primeiro político barrado pelo TSE com base na Ficha Limpa. Ele foi condenado pelo TRE do Ceará sob a acusação de compra de votos nas eleições de 2004, quando disputou o cargo de vereador em Itapipoca (CE).

Ao analisar recurso protocolado pelo candidato, o ministro Joaquim considerou a ação imprópria para contestar decisão doTSE,umavez que, segundo o magistrado, o recurso adequado já tramita no TSE, que poderá admitir ou não a sua remessa para a análise do Supremo