Título: Queda na produção da Alemanha sinaliza recessão no bloco europeu
Autor: Atkins, Ralph
Fonte: Valor Econômico, 08/11/2011, Internacional, p. A9

Uma recessão na zona do euro - possivelmente grave - parece quase inevitável antes do fim do ano, mesmo se a crise da dívida na região não se intensificar.

A queda acentuada na produção industrial alemã em setembro, anunciada ontem por Berlim, forneceu as mais recentes evidências de que o crescimento entrou em marcha à ré na maior economia da Europa. A produção caiu 2,7% em relação ao mês anterior.

No geral, a produção das fábricas alemãs nos três meses até setembro ainda ficou 1,7% maior do que no segundo trimestre do ano, porém dados mais recentes apontam para uma perda súbita de ímpeto no fim do terceiro trimestre.

"Houve um esfriamento generalizado", disse Dirk Schumacher, economista do Goldman Sachs em Frankfurt. "Se a coisa ficará muito mais feia vai depender da evolução da crise da dívida e da situação dos bancos."

O papel da Alemanha como potência industrial na Europa implica que sua desaceleração tem consequências preocupantes para a zona do euro. Na semana passada, Mario Draghi, o novo presidente do Banco Central Europeu, surpreendeu os analistas ao falar abertamente sobre uma "recessão branda" no bloco de 17 países antes do fim de 2011. Os bancos centrais geralmente tentam se mostrar otimistas sobre as perspectivas de crescimento.

No entanto, tendo em vista que a situação de outros países da zona do euro - especialmente a Itália -, é bem pior do que a Alemanha, a franqueza de Draghi pode ter simplesmente refletido uma realidade incômoda: a escalada dos problemas de endividamento da dívida da região já a puseram na rota de um inverno rigoroso. "É tarde demais para impedir que a economia real seja afetada pelo que aconteceu", disse Gilles Moec, economista europeu do Deutsche Bank.

O risco, agora, é que as dúvidas sobre as finanças públicas e as lideranças políticas futuras da Grécia e da Itália transformem uma recessão leve em algo muito pior. "A incerteza que persiste é um veneno para o crescimento econômico", alertou Ulrike Rondorf, economista do Commerzbank.

Diferentemente do esfriamento económico decorrente da queda nas exportações na Europa após o colapso do banco de investimento Lehman Brothers, no fim de 2008, as causas da atual crise são em grande parte domésticas, sendo improvável sua reversão em futuro próximo.

Ao agravar uma perda de confiança na economia por parte de líderes empresariais e de consumidores, medidas de austeridade fiscal estão esfriando os gastos com bens e serviços em todo o continente, e não apenas em países afetados pela crise, como Itália, Portugal Espanha e Grécia. Ontem, a França anunciou outro pacote de aumentos de impostos e cortes de despesas.

O debilitado setor bancário europeu também está afetando a economia real. O levantamento mais recente do BCE sobre empréstimos bancários, divulgado no mês passado, mostrou um aperto acentuado dos requisitos de crédito para empréstimos a empresas e a consumidores no terceiro trimestre, o que irá restringir em que medida o crédito poderá lubrificar as engrenagens da atividade econômica nos próximos meses.

Na profunda recessão no início de 2009, o PIB da zona euro caiu até 2,7% num único trimestre. Até o momento, não há sinais de que a contração atual será tão acentuada, mas poderá ser pior do que "branda".

Alguns dos sinais mais sombrios vieram na forma dos índices dos gerentes compras da região, considerados confiáveis e atualizados para a percepção de tendências da atividade econômica e foram citados em coletiva de imprensa em Frankfurt, na semana passada, por Draghi. Em outubro, o principal índice "composto", que abrange empresas de serviços e de manufatura, caiu para 46,5, de 49,1 em setembro, na mais acentuada queda mensal desde novembro de 2008. Uma vez que abaixo de 50 o indicador representa uma contração na atividade, os números revelam-se coerentes com uma queda de aproximadamente 0,5% do PIB na zona do euro por trimestre, segundo a Markit, que realiza a pesquisa.

Verificaram-se grandes divergências em toda a zona euro. Os índices de compras alemães mantiveram-se relativamente benignos, sugerindo que o crescimento da economia apenas estagnou. Mas o declínio da Itália foi abrupto: seus índices foram coerentes com uma contração de até 1% por trimestre.

O PIB da zona do euro contrairá cerca de 0,4% tanto no quarto trimestre deste ano como no primeiro trimestre do próximo ano, de acordo com a Now-casting, empresa que produz previsões geradas por computador com base em dados econômicos publicados.

Mas o ritmo de declínio poderá se acelerar rapidamente em caso de um "cenário de desastre". O impacto de um default grego e sua saída da zona euro sobre os países do bloco - ou mesmo a continuada paralisia na Itália -, são difíceis de calcular, mas a maioria dos economistas imagina algo comparável a um choque no estilo pós-Lehman Brothers.