Título: PMDB paulista prevê derrota e prepara convenção extraordinária
Autor: César Felício e Cristiane Agostine
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2004, Política, p. A6

O grupo do PMDB que defende o desembarque do partido da aliança governista constatou que não tem votos suficientes para impedir que a Executiva Nacional da sigla adie a convenção marcada para este domingo. Para ganhar o embate dentro do partido, o ex-governador de São Paulo Orestes Quércia lançou mão de uma manobra regimental, já aceita pelo presidente da sigla, Michel Temer. A tática de Quércia se baseia na alínea B, item II, do artigo 66 do estatuto do partido. A regra permite a convocação de uma convenção nacional extraordinária "por representação de um terço dos Diretórios Estaduais". Há este quórum entre os diretórios que se reuniram para discutir o assunto.

Ontem, o diretório de São Paulo aprovou o desligamento do partido do governo. Os 54 delegados votaram de forma unânime com Quércia e Temer. O documento aprovado pelos paulistas vai além da defesa da convenção e da mudança do nome de partipara MDB e propõe ainda o fechamento de questão sobre o assunto, sujeitando os governistas até à expulsão partidária. Além de São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Goiás, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco votaram pela saída do governo. O grupo que quer a independência já fez publicar no Diário Oficial o edital de outra convenção, no mesmo dia da primeira e com a mesma pauta, com base na posição destes diretórios. Desta maneira, se a Executiva derrubar a convenção original, não terá como derrubar a convenção-estepe. "Não é só a Executiva que pode convocar a convenção. A minoria também pode, embora sejamos a maioria. Marcamos as duas convenções para garantir que uma se realize", disse Quércia. Apesar da garantia do ex-governador paulista, a sua posição não representa a maioria da Executiva. Sob reserva, integrantes do grupo que querem a independência admitem que podem perder na cúpula do partido. Animados com os resultados das últimas conversas, o grupo governista apresenta hoje o manifesto de senadores e deputados pedindo o adiamento da convenção nacional e o ato de convocação da Executiva Nacional para discutir o assunto nesta quarta-feira. A decisão foi tomada depois de um encontro entre o ministro das Comunicações, Eunício Oliveira, o líder do partido no Senado, Renan Calheiros (AL) e o presidente da Casa, José Sarney. "Estamos com dez votos em dezesseis. Se o outro lado quer tirar a decisão sobre a convenção da Executiva, é porque eles reconhecem que não têm maioria. Esta outra convenção é uma leitura equivocada do regimento", disse Renan. A maioria de dez votos citada por Renan também está longe de ser sólida. Inclui por exemplo o senador Maguito Vilella (GO), que faz declarações públicas de sentido dúbio. "Eu não sei se assinei ou não o abaixo-assinado do Renan. É tanto papel que a gente assina aqui...", disse. O goiano proporá na quarta-feira que o partido entregue os cargos sem fazer a convenção, o que não interessa a ninguém. Sobre o seu voto na reunião da Executiva, Maguito afirma: "Nós erramos ao marcar a convenção para agora. Mas já que está marcada, vamos fazê-la". O secretário-geral do partido, deputado Saraiva Felipe, é relacionado como voto garantido tanto pelo lado governista como pelo lado oposicionista. O ex-deputado Renato Vianna (SC) está na mesma situação. Mas seguirá a orientação do governador de Santa Catarina, Luiz Henrique Silveira. O governador esteve com Lula na sexta e sinalizou que deve defender o adiamento. Inicialmente listado como voto oposicionista, interlocutores que conversaram recentemente com o senador Ramez Tebet (MS) afirmam que ele trabalha por uma "saída honrosa" para a ala do partido que quer a independência. Preocupados com a perspectiva de Temer tentar tirar a decisão sobre a convenção da Executiva Nacional, os governistas ainda tentam uma negociação. Na semana passada, o ministro da Casa Civil, José Dirceu pediu que sondassem Temer sobre um encontro privado entre o dirigente pemedebista e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Temer aceitou e o encontro deve ocorrer ainda esta semana. "Acredito em uma solução negociada. A divisão não interessa a ninguém. Vou procurar ser um bombeiro desta situação", afirmou Renan, que tinha um encontro com Michel Temer previsto ainda para a noite de ontem, para discutir a manobra de Quércia. A confirmação da convenção fará que os governistas se preparam para tentar tornar o evento inócuo. A possibilidade de vitória do Planalto entre os convencionais, que recebem influência direta dos governadores , é remota. "A gente ganha na Executiva, no Senado, na Câmara, mas dificilmente nós ganharemos na convenção. Se não for possível evitá-la, vamos deixar de participar, porque ela não terá eficácia. Como fechar questão contra o governo, se são minoritários no Congresso? ", disse Renan . A vitória na convenção fará com que Temer cobre publicamente a demissão dos ministros das Comunicações e da Previdência, Amir Lando, além dos detentores de cargo de segundo escalão, como o presidente do INSS, Carlos Bezerra, e o presidente da Transpetro, Sérgio Machado. "Não será necessário punir. Os ministros me asseguraram que no dia seguinte em que for declarada a decisão do partido, eles sairão do governo", disse o dirigente. Dificilmente isto ocorrerá. A disposição dos governistas é de não aceitar um resultado adverso na convenção. "A convenção vai dividir o partido de modo irreversível", afirmou Renan.