Título: Supremo pode abrir brecha na Lei da Ficha Limpa
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Fonte: Valor Econômico, 09/11/2011, Política, p. A10
O Supremo Tribunal Federal (STF) pode chegar a uma solução honrosa para declarar a validade da Lei da Ficha Limpa no julgamento da ação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que está marcado para as 14h de hoje. A ideia que foi cogitada em discussões prévias entre os ministros é a de dizer que a lei pode ser aplicada a partir das eleições municipais do ano que vem, mas não para casos de políticos que cometeram os crimes antes de ela entrar em vigor.
Se essa solução prevalecer, todos os políticos que renunciaram ao Parlamento antes de 2010 para escapar de processos de cassação de seus mandatos escapariam da regra da Ficha Limpa e teriam as suas candidaturas aceitas. Jader Barbalho (PMDB-PA) que foi pego pela Ficha Limpa por ter deixado o Senado, em 2001, está nessa situação. No ano passado, ele obteve 1,7 milhão de votos para o Senado. Foi a segunda maior votação no Pará, mas Jader não assumiu porque teve a candidatura impugnada pela Ficha Limpa. Mas a lei seria declarada válida.
Ainda é difícil estimar se essa solução será aceita pela maioria do STF, pois a Ficha Limpa provocou divisões na Corte, quando foram julgadas as ações sobre a aplicação da regra para as eleições de 2010, em outubro do ano passado. Na ocasião, houve empate em cinco votos a cinco e o STF só chegou a uma definição com a nomeação do ministro Luiz Fux, em janeiro. Fux deu o voto determinante para que a Ficha Limpa não fosse aplicada para as eleições de 2010, em março. Desde então, os defensores da Ficha Limpa perderam com a aposentadoria da ministra Ellen Gracie, que tinha dado voto a favor da aplicação imediata da Lei.
Ontem à noite, não havia definição se o julgamento seria realizado, pois havia ministros a favor de votar o processo já e outros que querem esperar pela nomeação da substituta de Ellen Gracie - a ministra Rosa Maria Weber Candiota, do Tribunal Superior do Trabalho, que espera pela sabatina no Senado para o cargo.
Inicialmente, a expectativa é a de que os ministros que foram a favor da lei naquele julgamento - Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa - repitam esse entendimento. Seriam pelo menos quatro votos favoráveis à Lei.
Os demais seis ministros foram contrários à validade da lei para 2010 pelo fato de ela ter sido aprovada no mesmo ano das eleições. O problema, para eles, está no artigo 16 da Constituição que não permite mudanças na lei eleitoral em ano de eleição. O objetivo desse artigo é o de evitar que a maioria no Congresso aprove normas casuísticas para se manter no poder. Mas, esse problema não existe para a discussão de hoje - se a lei será aplicada a partir de 2012.
Hoje, os ministros vão discutir se a Ficha Limpa fere o princípio constitucional da presunção da inocência. A questão a ser definida é se um político condenado por um tribunal de 2ª instância não vai mais poder se candidatar, mesmo cabendo recurso contra aquela decisão.
Outro tema é a aplicação da lei para fatos que aconteceram antes de ela entrar em vigor. É o caso do político que renunciou ao mandato para não ser cassado. Essa aplicação retroativa deverá ser objeto de discussões intensas.
No ano passado, o presidente do STF, Cezar Peluso, defendeu que os cidadãos têm o direito de saber se a conduta deles é ou não passível de restrição de direitos. Para ele, os políticos devem saber se, entre as consequências da renúncia, está o fim da possibilidade de se candidatar.
Fux, relator do processo, defendeu, em março, a intenção moralizadora de impedir a candidatura de condenados pela Justiça e advertiu que a Ficha Limpa "é a lei do futuro".