Título: Analistas esperam mais volatilidade
Autor: Daniele Camba
Fonte: Valor Econômico, 07/06/2006, Finanças, p. C1

Os mercados acionários do mundo inteiro tiveram ontem mais um dia de fortes emoções. Os pregões foram marcados por uma enorme volatilidade e o pessimismo tomou conta dos negócios pelo medo de que o processo de alta taxa de juros americana esteja longe do fim. Os analistas estão divididos sobre qual será o destino das bolsas, mas fazem coro: no curto prazo, as ações continuarão altamente voláteis, até por conta das incertezas externas. Para alguns, o fundo do poço está longe, especialmente para a Bovespa, que deve sofrer fortes correções, uma vez que subiu muito e por isso tem gordura para queimar. Há um grupo que acredita, no entanto, que os bons fundamentos brasileiros devem prevalecer e assim frear esse movimento venda.

Algumas bolsas acumulam desde o início das turbulências perdas maiores que as da Bovespa. A Turquia, por exemplo, perdeu do dia 10 de maio para cá 25,29% em dólares, enquanto a Índia caiu 22,75%. Um pouco atrás vem a Bovespa, com queda de 20,55%.

O nervosismo de ontem reforçou as perdas. No Brasil, no pior momento do dia, o Ibovespa chegou aos 35.672 pontos, com queda de 2,91%. Perto do fim do pregão, as ações recuperaram o fôlego e o Ibovespa fechou em 36.557 pontos, em baixa de 0,50%, praticamente anulando a alta do mês, que agora é de 0,07%. O índice, que chegou a subir quase 15% apenas em janeiro, devolveu uma boa parte desse ganho e hoje acumula valorização de 9,27%.

Outras bolsas emergentes não tiveram a mesma sorte ontem e fecharam em forte queda. Como Rússia, com menos 4,73% e Índia, com recuo de 2,51%. O índice do Morgan Stanley (MSCI) que engloba as principais bolsas emergentes fechou em 744 pontos, a menor pontuação desde 18 de janeiro.

As dúvidas sobre até aonde subirá a taxa de juros dos EUA, para conter a inflação, são o calcanhar-de-aquiles das bolsas. Elas têm tudo para continuar caindo enquanto não houver sinais mais claros sobre qual será o máximo dessa taxa e se, de fato, a economia americana está desacelerando, o que prejudicaria os outros países.

"Os preços dos ativos nem de longe refletem uma possibilidade dos juros americanos poderem subir para 5,5% ou até 6% ao ano, o que significa que novas correções virão, se isso acontecer", diz o sócio do Banco Pátria, Luís Fernando Lopes. Até pouco tempo, bancos e corretoras faziam cálculos sobre o preço justo das ações considerando a taxa americana na casa dos 4% ao ano. "Com uma taxa bem mais salgada, essas projeções estão sendo ajustadas para baixo, deflagrando um movimento de venda pelos investidores estrangeiro."

Nessa linha de reajustes, a bolsa brasileira é uma forte candidata a encabeçar a lista das perdas, alerta o diretor de pesquisa e estratégia para América Latina do WestLB, Ricardo Amorim. O principal motivo é que as ações acumulam ganhos acentuados, mesmo quando comparadas com outros mercados emergentes, que também subiram bastante nos últimos três anos e meio. A conta é simples: desde outubro de 2002, quando o Ibovespa atingiu a mínima de 8.370 pontos, até a sua máxima este mês, de 41.979 pontos, o índice acumula uma alta de 402% em reais e nada menos que 842% em dólar, uma vez que a moeda brasileira se apreciou bastante frente à americana. Sem dúvida, o maior ganho entre os principais mercados emergentes. É importante lembrar que a Bovespa também tinha preços bem mais baixos, refletindo a crise pelas eleições de 2002.

"Nesse momento de aversão ao risco, o estrangeiro olha todo esse ganho que já teve e vende, sem pensar nos bons fundamentos da economia brasileira", diz Amorim. Ele acredita que o Ibovespa pode buscar o nível dos 25 mil pontos, o que representa uma queda de 31,6% frente ao fechamento de ontem. Ele lembra que, antes desse último processo de alta da bolsa, que começou em 2002, os mercados passaram por uma correção de um ano e meio.

Houve uma verdadeira enxurrada de recursos para ações emergentes. Segundo o vice-presidente para mercados emergentes do JP Morgan, Dráusio Giacomelli, esse fluxo chegou a ser de US$ 28 bilhões no primeiro trimestre frente a US$ 20 bilhões o ano passado inteiro. As quedas no Brasil são maiores exatamente porque foi o país em que o estrangeiro fez as maiores posições. "Por causa dos bons fundamentos, o Brasil era líder disparado entre os nossos clientes", diz Giacomelli. Ele acredita, no entanto, que esses mesmos fundamentos farão o mercado local se diferenciar dos demais. "Não é possível colocar Brasil e Turquia no mesmo saco", diz. A queda da taxa Selic é mais uma pitada para brecar a queda da Bovespa, uma vez que as ações se tornarão mais atraentes, completa Giacomelli.