Título: TRF determina abertura de arquivos
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2004, Política, p. A7

O Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região determinou ontem a quebra do sigilo de todos os arquivos relacionados à Guerrilha do Araguaia. E foi além. Solicitou a presença, em audiência com a corte, de três ministros de Estado e outras autoridades do alto escalão do governo para traçarem estratégia de abertura de todos os arquivos no prazo de 120 dias. Caberá à cúpula do governo, da qual vários integrantes fizeram parte de movimentos esquerdistas contra a ditadura militar, decidir se recorre mais uma vez da decisão ou se atende às exigências do TRF. O julgamento realizado ontem, na Sexta Turma do TRF, se refere a processo em tramitação na Justiça desde 19 de fevereiro de 1982. Vinte e duas famílias de comunistas desaparecidos no confronto exigem da União a indicação de onde foram sepultados os parentes mortos para providenciarem enterro digno a eles. O confronto foi travado entre as Forças Armadas e cerca de 70 militantes do PCdoB entre 1972 e 1975 na tríplice fronteira dos estados do Pará, Maranhão e Tocantins. Dos 70 combatentes, 61 são considerados desaparecidos. Advogam a favor das famílias os deputados federais Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) e Sigmaringa Seixas (PT-DF). A juíza federal Solange Salgado havia decretado, em 20 junho de 2003, a quebra do sigilo dos documentos e determinado prazo de 120 dias para a União indicar a localização dos restos mortais. Havia fixado também multa diária no valor de R$ 10 mil caso a ordem não fosse cumprida no período delimitado. A AGU recorreu ao TRF da 1ª Região em agosto de 2003. O governo argumentou que o tempo era insuficiente para encontrar os corpos de todos os desaparecidos e refutou de forma veemente a fixação de uma multa. A AGU considerou que a decisão de Solange teria extrapolado o pedido dos familiares. Os parentes teriam apenas reivindicado a informação sobre o local dos corpos dos guerrilheiros mortos. Nada tinham mencionado sobre quebrar o sigilo de documentos. Ontem, o TRF não só manteve todas as determinações da juíza federal como solicitou a realização de uma audiência para iniciar os trabalhos de abertura dos arquivos até o dia 15 de dezembro. A idéia partiu do relator do caso e presidente da Sexta Turma, desembargador Souza Prudente. Os ministros da Justiça, Márcio Thomaz Bastos; da Defesa, José Alencar e o Secretário dos Direitos Humanos, Nilmário Miranda, foram chamados a participar do encontro. O advogado-geral da União, Álvaro Ribeiro Costa; o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Roberto Busato, e os comandantes das Forças Armadas completam a lista de convidados a realizar a audiência. Os ministros terão a prerrogativa de definir data, local e horário da audiência. "Não houve extrapolação por parte da decisão da primeira instância, uma vez que a localização dos corpos só pode ser feita com a quebra do sigilo dos documentos referentes à Guerrilha do Araguaia", disse Souza Prudente. Se os ministros não marcarem a audiência como solicitado pela Justiça, o desembargador falou até em determinar a "busca e apreensão" dos documentos sobre a guerrilha. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e o Comando Militar do Planalto seriam possíveis destinos de mandados de procura de documentos. Greenhalgh comemorou a decisão do TRF. "Cumprimento os desembargadores por considerarem legítima e justa a reivindicação das famílias", disse o deputado. Sem poder advogar contra a União, o parlamentar se mantém oficialmente fora do caso. A advogada Suzana Figueiredo o representou na tribuna do plenário da Sexta Turma. Questionado sobre a possibilidade de a AGU recorrer de novo, o petista Greenhalgh foi poético e lembrou do recurso da decisão da primeira instância. "Lembro uma música da Maria Betânia ao comentar um possível recurso do governo. É inútil dormir, que a dor não passa", finalizou.