Título: Sem crédito habitacional
Autor: Cristino, Vânia
Fonte: Correio Braziliense, 12/09/2010, Economia, p. 17

Ofinanciamento à habitação vai bater recorde este ano, mas poderia ser ainda maior, beneficiando mais as camadas pobres da população.

Estudo feito pelo consultor técnico da área habitacional da Caixa Econômica Federal Teotônio Costa Rezende mostra que a limitação do uso da nas operações de crédito imobiliário no Brasil e sua substituição pelo sistema SAC fazem com que cerca de 2 milhões de famílias de baixa renda fiquem sem acesso a empréstimos para comprar a casa própria.

Isso ocorre porque o sistema SAC exige dos interessados uma renda maior para a concretização da operação. Pelos cálculos do consultor, num financiamento de R$ 80 mil em 240 meses e com taxa de juros de 6% ao ano, o valor da prestação inicial é de R$ 573,14 pela tabela Price e de R$ 733,33 no regime SAC. Nesse montante, não estão incluídos o seguro e a taxa de administração.

No exemplo, a prestação inicial pelo modelo novo é 27,9% superior à prestação obtida no antigo.

A tabela Price deixou de ser usada pelos bancos por causa do risco jurídico envolvido na operação, uma vez que a Justiça vem entendendo que esse sistemadeamortizaçãoembutea prática da capitalização de juros (cobrança de juros sobre juros), o que é proibido. Para Rezende, essa interpretação é equivocada. O técnico explica que o critério de cálculo de juros do mecanismo é idêntico ao utilizado em outros sistemas que adotam o modelo de pagamentos mensais de prestações compostas por principal e juros, a exemplo do SAC.

Em ambos os casos, continua Rezende, os empréstimos são calculados pelo modelo de juros simples, emque os encargos gerados em cada período não são incorporados ao saldo final para originar novos juros. Em outras palavras, a basedecálculo ésempre o valor principal. Apesar disso, quase a totalidade das ações judiciais referentes ao crédito imobiliário no Brasil está relacionada à capitalização de juros e ao uso da tabela Price, disse o consultor.

Para ele, a confusão deve-se ao fato de que a aplicação da Price resulta emmaior pagamento de juros pelo devedor porque o valor das prestações é menor em relação a outros sistemas. Sem entender como a tabela funciona, a Justiça brasileira concluiu, erroneamente, na avaliação do consultor, que a operação gera a capitalização de juros.

Debate jurídico Os processos são respaldados pelo decreto 22.626, de abril de 1993, que proíbe a cobrança de juros sobre juros no país. Os bancos sustentam, no entanto, que várias ações são movidas com o único objetivo de postergar o pagamento dos empréstimos.

Por causa desse debate jurídico, as instituições financeiras, inclusive a Caixa, deixaramde utilizar a Price.

Essa insegurança jurídica representa o maior fator de risco paraocrédito imobiliárionopaís, o que faz com que o capital para esse tipo de investimento se torne muito mais caro, eleve os preços dos imóveis e aumente o deficit habitacional, argumentou.

O governo, segundo Rezende, reconhece a gravidade do problema e vem buscando soluções. É o caso, por exemplo, da Lei nº 11.977, que criou o programa habitacionalMinha Casa,MinhaVida.

Entre outras medidas, o plano estabeleceu que o crédito imobiliário pode ser capitalizado, desde que mensalmente.