Título: País tem interesse em projeto binacional na América Central
Autor: Francisco Góes
Fonte: Valor Econômico, 05/06/2006, Brasil, p. A6

O Brasil quer aproveitar a experiência adquirida no desenvolvimento de projetos binacionais, como Itaipu, para ajudar a mediar a construção de uma grande hidrelétrica na fronteira de El Salvador e Honduras, na América Central. O projeto, orçado originalmente em US$ 1,4 bilhão, é motivo de polêmica entre salvadorenhos e hondurenhos.

Projetistas e construtores brasileiros olham o empreendimento com interesse. Amanhã, a vice-presidente de El Salvador, Ana Vilma de Escobar, visitará Itaipu a convite do governo e das empreiteiras. O objetivo é mostrar a ela como foi possível construir com o Paraguai uma das maiores hidrelétricas do mundo.

Hoje a vice-presidente salvadorenha deve reunir-se com o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, e com o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Demian Fiocca. O banco analisa financiar vários projetos hidrelétricos em El Salvador, cuja matriz energética apóia-se em fontes de geração térmica (gás e diesel) e em poucos aproveitamentos hidráulicos. O racionamento de energia elétrica é um risco presente em El Salvador e a construção de uma hidrelétrica binacional com Honduras, além de atender o consumo interno destes países, permitiria exportar excedentes de energia elétrica para outros países da região por meio de uma linha de interconexão cujas obras devem começar no segundo semestre deste ano.

Ana Vilma de Escobar está no Rio para participar do seminário "Business Future of the Américas", promovido pela Câmara Americana de Comércio (Amcham). O secretário de comércio dos Estados Unidos, Carlos Gutierrez, vai falar no evento sobre livre comércio em almoço do qual Furlan também participará.

Na semana passada, Furlan esteve em cinco países da América Central chefiando comitiva de 50 empresários. Levantamento de Juan Quirós, da Apex Brasil, indicou que as empresas brasileiras fecharam na missão negócios que poderão resultar em US$ 80 milhões em exportações nos próximos 12 meses. O valor, que envolve bens de consumo, superou as expectativas da Apex Brasil, agência de promoção das exportações. Na área de serviços, incluindo obras de infra-estrutura e licitações públicas, o potencial para as empresas brasileiras na América Central supera US$ 1 bilhão, disse Quirós.

Furlan avaliou que o Brasil fincou pilares sólidos em termos de oportunidades de negócios em biocombustíveis e infra-estrutura nos países da América Central. Em relação aos projetos hidrelétricos, o ministro comentou: "Podemos aproveitar a experiência e a neutralidade do Brasil (na relação entre Honduras e El Salvador) para agilizar o projeto da hidrelétrica binacional."

O empreendimento, chamado El Tigre, deve ser construído no Rio Lempa, na fronteira entre El Salvador e Honduras. A relação entre os dois países é marcada pela rivalidade e o projeto não será de fácil execução, porque precisará, primeiro, ser viabilizado politicamente.

Brasil Machado, diretor da Intertechne, empresa especializada em projetos hídricos, vê outro problema para tirar El Tigre do papel: o projeto original da usina é antigo (foi elaborado por empresas alemãs em 1995) e precisará ser feito. Além disso, será necessário equacionar o financiamento para o projeto.

Brasil considera que o valor orçado para usina, há mais de dez anos, de US$ 1,4 bilhão, não é confiável e poderá ser "otimizado". A Intertechne participou da missão à América Central com outras construtoras e empresas de engenharia interessadas neste e em outros projetos na região. Fazem parte da lista Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, Odebrecht e Alusa.

A Intertechne terminou em 31 de maio o projeto básico de outra hidrelétrica em El Salvador, a usina de El Chaparral, com cerca de 67 megawatts (MW) de capacidade instalada. A expectativa das empresas brasileiras é de que a usina seja licitada no segundo semestre de 2006. As obras poderão ser feitas via Parceria Público Privada (PPP) e o investimento estimado é de cerca de US$ 150 milhões. El Chaparral é uma das prioridades do presidente de El Salvador, Antonio Saca, que na quinta-feira completou dois anos de mandato.

Existe ainda um terceiro projeto hidrelétrico em El Salvador, batizado de El Cimarrón, com 240 MW, cujos estudos estão sendo feitos por empresa francesa.