Título: Balanço do tranco
Autor: Angelo Pavini e Luciana Monteiro
Fonte: Valor Econômico, 05/06/2006, Eu &, p. D1

A maioria dos gestores de fundos multimercados quer esquecer maio. Alguns chegaram a perder todo o ganho do ano com a forte mudança dos mercados locais e internacionais, com prejuízos que, fora as distorções, chegam a 8%. E a expectativa é de que a volatilidade continue no médio prazo. O pior é que, para esses gestores, o mês ainda não acabou. Quando os investidores receberem seus extratos nesta semana, mostrando as perdas, haverá um novo teste. "Não houve muitos saques, mas temos de ver a avaliação dos investidores", diz o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, da Gávea Investimentos. "Como o ano estava bom para os multimercados, e muitos ainda conservam ganhos, a expectativa é de que não haja muitos resgates", diz, avaliando como natural algumas perdas depois dos fortes ganhos.

Para um gestor que pediu para não ter seu nome citado, as perdas dos fundos em maio devem criar desconforto entre gestores e investidores. "Os clientes se assustam com a volatilidade e se perguntam se o gestor não correu risco demais - e até entre os sócios há atritos com relação a quem decidiu a estratégia perdedora."

O resultado do mau humor que tomou conta dos mercados em maio já pode ser notado no bolso. As carteiras que adotam a estratégia macro, maioria no mercado, foram as mais prejudicadas. Esses fundos procuram ganhar com as tendências dos ativos, na alta ou na baixa. Mas quando o mercado muda de repente, são os mais afetados. O índice Arsenal Macro, que acompanha uma carteira de multimercados selecionados por retorno, encerrou maio com queda média de 0,45%, enquanto o CDI variou 1,28%. Apesar da perda, a categoria no ano rende 7,93%, acima dos 6,51% do CDI.

Os gestores que utilizam a estratégia de arbitragem de preços nos mercados de juros, bolsa e câmbio foram os que, na média, conseguiram amortecer o impacto da virada. O índice Arsenal Arbitragem teve retorno de 0,65%. No ano, o ganho é de 6,75%. Já a arbitragem só com ações rendeu em maio 0,04% e, no ano, acumula 6,99%, segundo o índice Equity Hedge.

Os fundos que buscam acompanhar mais de perto o mercado, com giro rápido de posições, fecharam o mês razoavelmente bem, como mostra o índice Arsenal Trading. Ele encerrou maio com ganho médio de 0,25% e no ano acumula 7,82%. O indicador global, batizado de Composto e que engloba 104 fundos mistos, teve queda de 0,08% em maio e, no ano, rende 7,82%.

Apesar de o investidor olhar sempre o retorno do fundo em função do CDI, o indicador não é o melhor referencial para a categoria, que investe em vários mercados e não apenas em renda fixa, avalia Cristiano Pardi, sócio responsável pela área de fundos de fundos da Arsenal BPW Investimentos. "Grande parte das carteiras realmente perdeu em relação ao CDI, mas muitas estão com retorno acima do índice, o que mostra que foram bem na comparação com o concorrentes, diz. No caso do índice Macro, dos 39 fundos que compõem o indicador, 25 tiveram retorno acima do referencial.

Na visão de Pardi, os baixos resgates num momento de forte turbulência mostra que os investidores estão mais conscientes. Ele lembra que pesa na decisão do aplicador manter o dinheiro investido o fato de as carteiras terem "gordura para queimar", já que a maioria tem ganhos bem interessantes. Além disso, muitos multimercados estão fechados para captação. "Se o aplicador sair, ele sabe que não terá como voltar depois", diz. A adoção de carência para resgates em vários fundos também contribuiu para menores saques.

"Maio está virando um mês carimbado para os multimercados", diz Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do BC e sócio da Mauá Investimentos. Ele lembra que, em maio de 2004, o mercado passou por uma forte turbulência também por conta da incerteza dos juros americanos. "Na ocasião houve um volume grande de resgates, mas o mercado se recuperou", diz. Neste mês, pelo que se viu até agora, a reação do investidor foi tranqüila, o que mostra que ele está mais consciente de que os multimercados não ganham sempre. "O importante é que, ao longo do tempo, a média seja boa", diz. "A turbulência foi mais intensa do que os fundamentos do Brasil indicariam." Para Figueiredo, a melhora do mercado é natural, com os ativos voltando a ser compatíveis com os fundamentos do país.

O maior impacto da volatilidade atingiu a Global Invest. O fundo San Marino acumulou perda de 70,65% em maio, a maior do mercado. Segundo Pedro Paulo Bartolomeu da Silveira, economista da Global Invest, a gestora foi pega em uma posição extremamente otimista em relação ao Brasil e alavancada nos mercados de bolsa e dólar. "O mercado virou e fomos pegos de surpresa", diz. Agora, a gestora passa por uma fase de revisão de suas estratégias. "Estamos nos reorganizando e discutindo com os clientes", afirma. Silveira acrescenta que os fundos não sofreram fortes resgates. No San Marino, o número de clientes caiu de 105 para 80. Os fundos da gestora estão fechados para aplicações.

A visão de que o Fed poderia elevar mais do que o mercado esperava a taxa de juros americana fez com que a Fidúcia Asset Management reduzisse gradativamente suas posições em bolsa e câmbio de fevereiro para cá, ficando apenas no CDI, conta Marcelo Serfaty, sócio da gestora.