Título: Eleito, García critica atuação de Chávez
Autor: Paulo Braga
Fonte: Valor Econômico, 06/06/2006, Internacional, p. A8

O presidente eleito do Peru, Alan García, atacou Hugo Chávez e o chamou de "o único derrotado" nas eleições presidenciais peruanas de anteontem. O governo da Venezuela condenou as declaracões, mas aparentemente tentou baixar o tom de conflito, afirmando que por enquanto as relações diplomáticas entre os dois países permanecerão como estão.

"O voto foi uma derrota do plano expansionista que Chávez está tentando implementar na América do Sul, da sua tentativa de nos anexar ao seu modelo retrógrado", disse García. "Estava em jogo a nossa soberania, a rejeição das pretensões daqueles que têm a riqueza do petróleo de nos dominar."

Em maio, os países chamaram seus respectivos embaixadores, num conflito causado pelo apoio explícito de Chávez ao candidato nacionalista Ollanta Humala, derrotado ontem por García, e pelos ataques do venezuelano ao presidente peruano, Alejandro Toledo.

Chávez havia dito que romperia relações com o Peru caso García, que governou o país entre 1985 e 1990, fosse eleito. Anteontem, em seu programa semanal de TV, o venezuelano rezou para que García não vencesse. Ontem, funcionários de seu governo criticaram o presidente eleito, mas se distanciaram do tom usado na campanha, quando Chávez o acusou de ladrão e corrupto. Também não houve referência ao rompimento de relações.

Segundo o chanceler venezuelano, Ali Rodríguez, os ataques de García à Venezuela não são "o melhor caminho para estreitar relações entre países que, por laços históricos, são irmãos". Ele disse que o futuro das relações bilaterais "dependerá do curso da política que defina o governo peruano".

Ao mesmo tempo, a vitória de García foi elogiada pelo governo dos EUA. O subsecretário de Estado americano, Robert Zoellick, disse que o resultado mostra um rechaço à expansão da influência do presidente venezuelano na região. "A melhor resposta foi dada pelo povo peruano, que decidiu votar no presidente García e não no candidato de Chávez", afirmou.

Pelos dados oficiais, com 93% dos votos contados, García tinha 53,13% dos votos, contra 46,86% de Humala, que admitiu a derrota ainda na noite de domingo e disse que se dedicará a liderar uma frente de oposição ao governo.

O mercado financeiro reagiu com otimismo moderado à vitória do ex-presidente, após uma semana de temor em relação a Humala, que propunha a revisão de contratos de empresas de mineração, gás e petróleo, a nacionalização dos recursos naturais e a não-aceitação do acordo comercial com os EUA.

A Bolsa de Lima fechou ontem com alta de 0,65%. Apesar de modesto, o ganho contrastou com a queda na maioria dos mercados. A moeda peruana, o sol, também teve alta, encerrando o dia a 3,25 por dólar, contra os 3,27 de sexta-feira.

A vitória de García agrada ao mercado, mas há dúvidas ainda quanto ao compromisso do presidente eleito com a disciplina fiscal. Ele mostrou estar ciente disso ao prometer que o futuro ministro das Finanças não será membro de seu Partido Aprista.

Muitos peruanos também têm presente a lembrança de seu primeiro governo, marcado por hiperinflação, escassez de produtos básicos e violência da guerrilha maoísta Sendero Luminoso. Ao celebrar a vitória, García fez um "mea culpa" pelo seu desastroso primeiro governo: "Nós não vamos governar com as paixões e os impulsos, como fizemos no passado. Temos de pensar nos nossos erros num ato sincero de contrição".