Título: O que será de junho?
Autor: Monteiro, Luciana e Cotias, Adriana
Fonte: Valor Econômico, 01/06/2006, Eu & Investimentos, p. D1

O investidor deve preparar seu coração para as fortes emoções de junho, que não se limitarão à estréia do Brasil na Copa do Mundo. A volatilidade dos mercados deve continuar e o conselho dos especialistas é cautela e nervos de aço. No dia 29 de junho, o Fed, banco central americano, se reúne para decidir a trajetória da taxa de juros. Até lá os mercados mundiais devem especular bastante a cada novo indicador da economia dos Estados Unidos. O efeito sobre os ativos brasileiros deve ser o mesmo que se viu em maio: muita oscilação em bolsa, câmbio e juros.

"A interpretação dos últimos números da economia americana foi de que há risco de desaquecimento da economia e de inflação, a pior mensagem que poderia vir para os emergentes", diz o chefe de análise da Planner Corretora, Luiz Antonio Vaz das Neves. Para ele, a ata deixou o caminho aberto para a taxa básica americana ser ajustada até 6% ao ano, ante os 5% atuais, levando-a a um dos seus maiores níveis históricos.

Os investidores continuaram perdidos em meio aos dizeres da autoridade monetária americana de que a economia dos EUA está crescendo de forma robusta, mas ainda não foram sentidos os efeitos das últimas elevações de juros. Por isso, não há consenso se mais aumentos serão necessários nem o tamanho deles. Tais questionamentos têm direcionado o dinheiro antes aplicado nas bolsas para bônus do Tesouro americano.

A busca de portos mais seguros trouxe uma forte valorização para o ouro no mundo e também no Brasil, com o metal, negociado na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) em alta de 12,73% em maio. Houve ganhos também para o euro e para o dólar, que subiram 11,82% e 11,30%, respectivamente. No ano, porém, a moeda americana acumula queda de 0,04% - voltando praticamente ao valor de dezembro do ano passado - e o euro tem alta de 6,46%. Os fundos cambiais atrelados à moeda americana registram retorno médio no mês de 7,03% até o dia 26.

Os tempos do dólar na faixa dos R$ 2,05 e R$ 2,10 podem não voltar, diz Pedro Bastos, diretor de gestão de renda variável e de fundos multimercados do Unibanco. Ele diz que a melhor fase da safra agrícola já passou e as exportações não devem pressionar muito o dólar para baixo. O forte movimento de aberturas de capital de empresas brasileiras na bolsa, que trouxe muitos investidores estrangeiros para cá, também deve se reduzir. Por isso, ele avalia que o dólar deve ficar entre R$ 2,20 e R$ 2,30.

Já o principal indicador da bolsa, o Índice Bovespa (Ibovespa), foi fortemente afetado pela saída dos estrangeiros. O indicador oscilou da máxima de 42.015 pontos à mínima de 34.911 pontos, destaca o consultor Fabio Colombo. O Ibovespa fechou o mês com desvalorização de 9,50%. Antes de entrar em desespero, porém, o investidor deve observar que o índice ainda acumula uma alta de 9,19% no ano, perdendo para o ouro, com 28,50%. Os fundos Petrobras acumulavam 26,66% até dia 26 e os da Vale, 14,59%.

O fato de as principais bolsas mundiais, incluindo as emergentes, terem subido bastante e os preços das commodities atingido níveis historicamente elevados desencadeou a correção de preços, já antecipando novas altas dos juros americanos, diz Colombo. "A dúvida crucial é se a recente turbulência é passageira ou o início de um movimento mais prolongado."

Após a tempestade, o analista da Link Corretora Adriano Blanaru acredita que o clima no mercado brasileiro continuará nublado em junho, mas os vaivéns previstos estão longe de ser o fim da festa em países emergentes. Para o investidor com um pouco mais de apetite para risco, a sugestão é buscar na bolsa papéis de empresas sólidas, com boa liquidez e que caíram muito do dia 10 para cá. Ele cita as ações preferenciais (sem direito a voto) da Usiminas, que perderam quase 13% como uma opção interessante. No setor bancário Itaúsa, que recuou mais de 17%, também pode estar nas escolhas.

Até meados de julho a volatilidade predominará, embora tenha havido certos exageros na oscilação dos mercados, avalia Aquiles Mosca, estrategista de investimentos pessoais da ABN Amro Asset Management. Ele diz que as atenções estarão voltadas para os números da economia americana como inflação, crescimento, declarações das autoridades americanas e suas conseqüências sobre as expectativas sobre os juros nos EUA.

Até a próxima reunião do Fed deve haver novos ajustes nos mercados, diz Ricardo Junqueira, sócio da Ático Asset Management. Para ele, o momento pode ser de compra de ações, mas é necessário que o investidor faça uma seleção criteriosa dos papéis. Entre os destaques, ele cita as ações da Vale do Rio Doce e da Petrobras. Os setores de energia e bancos também podem oferecer oportunidades. Mas o investidor precisa estar preparado, pois ninguém sabe precisar quanto vai durar o estresse, o que quer dizer que ações de empresas sólidas que caíram bastante podem se desvalorizar ainda mais.

Apesar de as variáveis externas terem maior importância, os dados locais sobre o crescimento e eleições estarão no radar. Alexandre Espírito Santo, sócio da Avanti e chefe do Departamento de Finanças da ESPM-RJ, atenta para o fato de que um eventual crescimento de saques nos fundos, em especial os multimercados, podem desencadear uma nova reviravolta no mercado local. "Os gestores terão de vender ativos para fazer frente aos resgates e, dependendo da magnitude, isso pode virar uma crise sistêmica."