Título: Mulheres têm apenas 7,7% das vagas dos conselhos
Autor: Valenti ,Graziella
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2011, Investimentos, p. D4

A participação de mulheres no conselho de administração das companhias abertas praticamente não mostrou evolução nos últimos três anos. A despeito da tendência internacional de valorizar a diversidade de gênero na administração dos negócios, o Brasil segue estagnado. Pesquisa do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) neste ano mostra que das 2.647 posições de conselho efetivas existentes em maio, dentre 454 empresas listadas, apenas 7,71% eram ocupadas por mulheres.

Na Europa, a questão está avançando rapidamente desde que, em 2003, a Noruega aprovou uma lei exigindo que 40% dos assentos dos conselhos fossem dedicados às mulheres. A cota entrou integralmente em vigor em 2008. Desde então, já adotaram iniciativas semelhantes França, Espanha, Holanda, Bélgica e Itália. Formas de fomentar a participação feminina nos conselhos também estão em debate na Austrália, Islândia, Finlândia, Alemanha e até mesmo na África do Sul.

Poucos sabem, mas o Brasil também possui um projeto de lei que segue essa linha. É de autoria da senadora Maria do Carmo Alves (DEM-SE) e prevê que as mulheres deverão ficar, de forma gradual, com até 40% das vagas nos conselhos de administração das empresas públicas e de economia mista, até 2022. Em 2016, as mulheres devem representar 10% desses postos. O projeto já passou pelas comissões de Assuntos Econômicos e de Constituição, Justiça e Cidadania, em que a relatora foi a senadora Marta Suplicy (PT-SP), e agora aguarda a designação de um relator na Comissão de Assuntos Sociais do Senado.

Sandra Guerra, da consultoria Sodalis Better Governance e membro do International Corporate Governance Network (ICGN), explica que a discussão internacional surgiu da necessidade de diversificação dos perfis nos conselhos de administração, junto com o debate sobre raças e origens.

No projeto de lei da senadora Maria do Carmo, a justificativa é a busca de correspondência "entre a participação das mulheres na produção dos bens públicos e sua presença nos órgãos que decidem os destinos dos recursos produzidos a partir do esforço da sociedade".

No Brasil, até se alcançar as cotas pretendidas pela senadora, será preciso muita mudança. De acordo com o levantamento do IBGC, 66,3% das companhias abertas não possuem nenhuma mulher no conselho de administração - esse percentual era de 68% em 2009 e 70% em 2010. Neste ano, são 165 mulheres diferentes ocupando 204 posições nos conselhos de administração de 147 empresas, contra 162 mulheres em 216 posições em 2010, em 151 empresas.

A coordenadora do centro de conhecimentos do IBGC, Adriana de Almeida, destaca que as mulheres levam aos conselhos visões diferentes sobre os temas. Por isso, o debate sobre a diversidade é produtivo também para as companhias. Entretanto, ela destaca que seria importante trabalhar para ampliar a diversidade também na diretoria das empresas. Isso porque, para alcançar uma posição em conselho, a profissional precisa ter acumulado experiência como executiva.

Na comparação mundial, o Brasil ocupa uma posição intermediária a respeito da participação das mulheres nos conselhos de administração. O indicador de 7,7% está atrás dos 8,4% da Austrália e à frente dos 7,5% da Áustria, segundo pesquisa da Catalyst, citada no relatório do IBGC. Quem está no topo desse levantamento, como era esperado, é a Noruega, com 39,5% de presença feminina, seguida pela Suécia (27,3%) e pela África do Sul (15,8%). Nos Estados Unidos, a participação é de 15,7% e na Inglaterra, de 12,5%.

Porém, quando a comparação é feita com o percentual de companhias que possuem ao menos uma mulher no conselho de administração, a posição do Brasil cai consideravelmente para o fim da lista, com 33,7%. A liderança é da Suécia (100%), seguida por Noruega (96%) e África do Sul (91,1%). Nos mercados desenvolvidos - Estados Unidos (70,8%) e Inglaterra (52,3%) -, o percentual é expressivamente maior que o brasileiro, que perde até para China, Índia e Rússia.

A despeito da posição deficiente do Brasil na questão da diversidade, não há consenso entre os especialistas a respeito da imposição de cotas, como sugere o projeto de lei da senadora Maria do Carmo Alves.

Na opinião de Adriana de Almeida, do IBGC, a preocupação maior é forçar um movimento e, com isso, se perder em qualidade. Isso porque a designação para um conselho tem que ter como foco, acima de tudo, competência.

O especialista em governança corporativa Alexandre Di Miceli, coordenador do Centro de Estudos em Governança (CEG), da Fipecafi-USP, acredita que há prós e contras numa iniciativa como essa. Ele destaca que na Noruega, inicialmente, também houve resistência das empresas e dos empresários. O discurso sobre a existência de mão de obra qualificada também foi usado.

"Mas, com o passar do tempo, não se verificou nenhum impacto negativo. Ao contrário, surgiram efeitos positivos", disse. Di Miceli destaca que existem trabalhos de psicologia demonstrando que grupos homogêneos tendem a pensar igual. "Torna-se um ambiente de clube." Na opinião do especialista, a aprovação do Projeto de Lei 112 pode ser uma porta para o início dessa discussão.

Denys Monteiro, sócio-diretor da empresa de consultoria em gestão e seleção de executivo Fesa, destaca que a discussão sobre a participação feminina nas administrações é crescente. Contudo, afirma que a realidade ainda está distante do ideal e que é preciso, antes de ver aumentar a participação das mulheres nos conselhos, ampliar a atuação na diretoria das companhias.

"Entre as 500 maiores empresas do país, nem 10% têm mulheres como presidente. Isso não acontece nem nas empresas de cosméticos", pondera Monteiro. Contudo, Monteiro avalia que a tendência é de mudança, mas gradual. "O mercado vem mudando, mas isso leva gerações para acontecer. Se as mulheres são a maioria na academia, elas deverão ser também no trabalho."

Para a especialista Sandra Guerra, a baixa presença feminina nas diretorias tem como explicações, além do resistente preconceito, o fato de as mulheres usarem menos serviços de caça talentos ("hadhunters") e também as decisões pessoais, de interrupção de carreira por conta da maternidade ou maior dedicação à vida pessoal.