Título: O PSDB sob estado de desconfiança
Autor: Rosângela Bittar
Fonte: Valor Econômico, 31/05/2006, Política, p. A6

O tom apaziguador, quase melífluo, dos que participaram ontem da reunião do conselho político da candidatura Geraldo Alckmin não engana: PSDB e PFL não conseguiram ainda desfazer a forte impressão do eleitorado de que ainda não foi desta vez que a oposição acertou o passo, que os dois partidos vão estancar as disputas internas e seguir adiante com sua campanha. O PFL até que está conseguindo, desde a última semana, conter as divergências dentro de limites, deixando apenas dois de seus líderes - o prefeito do Rio e o governador de São Paulo - esgrimir provocações aos aliados. Mas a situação no PSDB vem tomando, com agravantes também da última semana, um caminho de difícil retorno.

Os tucanos suspenderam insultos aos adversários, aos aliados de outros partidos para se concentrarem na exploração dos defeitos das personalidades que compõem seu próprio e curioso grupo. Só uma ainda injustificada certeza da derrota este ano, seguida de precoce disputa por 2010, explica os tropeços iniciais dos mais importantes e experientes políticos e candidatos do PSDB nesta largada de campanha eleitoral de 2006.

O grupo do candidato a presidente, Geraldo Alckmin, quer manter em suas mãos o controle da campanha, e continua a briga pré-definição de candidatura com os partidários do agora candidato ao governo de São Paulo, José Serra; aliado de Serra, o deputado Alberto Goldman provoca o governador de Minas, Aécio Neves, candidato à reeleição, ironizando sua "pinta de boa vida"; Aécio se defende de Goldman atacando Serra, pois suspeita que os comentários ácidos tiveram origem "em sua ligação com o ex-prefeito José Serra". É nova esta explicitação ao eleitorado do desconforto entre Aécio e Serra, até aqui mantido em reservados salões.

Os choques se repetem nos estados, mas em nenhum deles o quadro tem a eloquência do que se vê no Ceará do presidente do partido, Tasso Jereissati.

Alvo de um rosário de queixas partidárias, que vêm se acumulando nas campanhas do PSDB de 94, 98 e 2002, Jereissati sempre teve seu nicho no PSDB, mesmo nos períodos em que não presidiu a agremiação. Seus aliados não são os aliados das demais lideranças, as opções que faz, por exemplo, nas disputas internas de aliados em outras siglas, nunca são as que Aécio, José Serra ou Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, acabam por escolher.

Coração partido entre o PSDB e a amizade pessoal e política no Ceará com Ciro Gomes (PSB), adversário nacional, estadual e municipal do PSDB, o presidente do partido protagoniza, aos olhos do eleitorado, um verdadeiro drama na eleição deste ano.

Quis apoiar o candidato a governador do PSB, Cid Gomes, irmão de Ciro, mas não conseguiu rifar a candidatura à reeleição, pelo PSDB, do atual governador, Lúcio Alcântara.

O confronto de hoje mira a disputa de 2010 Tasso pretendia ter Alcântara como candidato ao Senado, numa chapa em que Cid Gomes seria candidato a governador, com o palanque presidencial para Alckmin, uma mistura absurda quando se sabia que Ciro, ainda hoje cotado para ser vice de Lula, não deixaria de apoiar o atual presidente ou de lhe dar o palanque do seu irmão. Como já foi senador e não queria voltar ao Congresso, Lúcio Alcântara preferiu disputar a reeleição, e vem sofrendo represálias.

Tasso não compareceu ao lançamento do candidato do seu partido, no seu reduto eleitoral. Não fala com Alcântara e não está envolvido na campanha estadual.

Fiador principal da candidatura Geraldo Alckmin, como presidente do partido, Tasso Jereissati poderá se ver na contingência de não poder assumí-lo integralmente no Ceará, onde o seu lado, seus amigos e companheiros estão com Lula. Tal como ocorreu na eleição de 2002, quando o candidato a presidente do PSDB foi José Serra,

Gol contra

Desde os seus primeiros atos, o governo Lula vem tramando contra o programa Bolsa Escola da forma como foi concebido, copiado e admirado internacionalmente: um instrumento de renda mínima com contrapartida do beneficiado em matrícula das crianças da família na escola básica. Realizado com sucesso, pela primeira vez em grande escala, por um petista, o então governador do Distrito Federal Cristóvam Buarque, hoje senador do PDT, e adotado nacionalmente no governo do PSDB, o Bolsa Escola foi o carro-chefe do pacote em que o governo Lula juntou os programas assistenciais para baixa renda, formando o Bolsa Família.

O primeiro golpe no programa foi a recusa a adotar para a soma dos programas a marca Bolsa Escola, já conhecida no Brasil e em outras partes do mundo. A seguir, houve a eliminação da característica que distingue o programa, a supressão da exigência da contrapartida da matrícula. Com um ano apenas distribuindo dinheiro, as consequências apareceram logo na redução drástica do ritmo de ingresso das crianças na educação fundamental.

Diante das reações de educadores, o presidente Lula determinou que os ministérios de Desenvolvimento Social e da Educação restabelecessem os critérios originais do Bolsa Escola. Foram, de fato, verbalmente restabelecidos, mas sem controle rigoroso ou exigência da contrapartida. Agora trama-se um terceiro golpe contra o reforço que esta bolsa dá à política de educação. O ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, anunciou à "Folha de S.Paulo" que um milhão de trabalhadores Sem-Terra poderão ser beneficiados pelo Bolsa-Família. O objetivo seria trocar as 1,3 milhão de cestas básicas entregues aos acampados, ao custo de R$ 45,00 a cesta, pelo dinheiro da bolsa.

Novamente, o raciocínio que está por trás da idéia derruba o critério da contrapartida. A troca, segundo diz, "seria melhor para os acampados e para o governo". É mais uma autoridade a ver nesta bolsa pura e simplesmente a distribuição de dinheiro.