Título: Novos territórios
Autor: Leandro Modé
Fonte: Valor Econômico, 26/05/2006, Especial, p. F1

Décima segunda economia mundial, o Brasil ainda está na 31ª posição quando se leva em conta a relação de seu Produto Interno Bruto (PIB) e o volume de recursos destinados pelas empresas aos investimentos diretos no exterior. Isso mostra que esse processo, embora em fase de ascensão, ainda é incipiente no país e tem grande potencial de crescimento. "Existe uma assimetria entre o PIB e a internacionalização", acredita Fernando Dall´Acqua, professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP). "Nosso nível de investimento no exterior em relação ao PIB é inferior ao de México, Tailândia, Rússia, Chile, China e Coréia", exemplifica Dall´Acqua.

O investimento direto brasileiro no exterior atingiu o ápice em 2004, quando totalizou US$ 9,5 bilhões, segundo o Banco Central. No ano passado, a soma chegou a US$ 2,5 bilhões, de acordo com a Fundação Dom Cabral (FDC). Foi um pouco acima da média anual registrada a partir de 1998, de cerca de US$ 2 bilhões. Em 2004, na verdade, os números foram inflados por uma única operação: a fusão das cervejarias AmBev e Interbrew, que girou US$ 5 bilhões.

Mas os especialistas concordam que é difícil medir esse movimento com precisão, já que dados do BC revelam um aumento anual em relação ao estoque de investimentos lá fora bem superior.

O interesse (por enquanto apenas) das empresas de grande porte por abrir novos mercados no exterior é crescente e foi intensificado pela valorização do real, que tornou os ativos estrangeiros relativamente mais baratos em dólar. Mas a razão desse avanço varia caso a caso, avalia o professor da FDC Álvaro Cyrino. Uma das motivações é a saturação das vendas domésticas para aqueles que já são líderes. São exemplos disso a fabricante de motores elétricos Weg e Embraer. Outro motivo está relacionado ao baixo crescimento econômico do Brasil nos últimos anos, que levou muitas companhias a buscar fôlego (e dólares) lá fora. Nesse quesito encaixam-se grandes construtoras, como a Camargo Corrêa ou a Odebrecht.

O professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Antônio Corrêa de Lacerda acrescenta três outras explicações: a globalização, o acesso ao crédito e as barreiras alfandegárias. "Para algumas empresas, é mais fácil produzir localmente do que exportar." Nesse caso específico encontra-se a Gerdau, que foi às compras nos EUA para driblar as dificuldades impostas pelo governo daquele país às importações de produtos siderúrgicos.

Esses são, como costuma dizer Júlio Sérgio Gomes de Almeida, os "bons motivos" nesse processo. Mas há também o lado negativo, observa Almeida, que deixou o cargo de diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) nesta semana e acaba de assumir a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda.

A taxa de câmbio valorizada, segundo ele, obrigou algumas empresas brasileiras a implementar operações no exterior. Cyrino e Lacerda concordam. "Com a valorização do real, o Brasil perdeu algumas vantagens comparativas", afirma Cyrino, referindo-se ao custo de mão-de-obra. Os três dão como exemplo o caso da fabricante de calçados Azaléia, que transferiu parte de sua linha de produção para a China.

Mas o real valorizado também facilita aquisições brasileiras no exterior e torna mais difícil o ataque de estrangeiros a empresas brasileiras. Esse ponto é destacado por Reynaldo Passanezi, diretor de finanças corporativas do Banco Bilbao Vizcaya Argentaria (BBVA). Segundo ele, os negócios estão muito mais aquecidos hoje do que nos últimos anos. "Temos três mandatos, que totalizam US$ 5 bilhões caso dêem certo", revela. Dois deles são de empresas brasileiras querendo fazer aquisições no exterior. O outro mandato é de uma empresa latino-americana que quer comprar no Brasil.

Nos cálculos do BBVA, empresas brasileiras movimentaram pouco mais de US$ 57 bilhões entre fusões e aquisições no período de 2000 a 2006. A maior parte desses recursos foi destinada a operações dentro do próprio Brasil. Na América Latina, as investidas dos brasileiros somaram US$ 5,5 bilhões. No restante do globo, foram outros US$ 10,6 bilhões.

Com objetivo de difundir o conceito de internacionalização e estimular mais empresas a buscar novos mercados, a FGV-SP, em parceria com o banco BBVA, criou um prêmio que será concedido à empresa que for considerada o melhor ´case´ de inserção internacional dos últimos 24 meses. "Fizemos uma seleção e chegamos a sete casos", diz Dall´Acqua. Para concorrer ao prêmio, a operação externa deve ter ao menos 50% de capital nacional. O prêmio será entregue no III Seminário de Internacionalização de Empresas, que acontece hoje no Hotel Unique, em São Paulo.