Título: Volatilidade não irá interromper declínio da Selic, dizem analistas
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 26/05/2006, Finanças, p. C2
Após três baixas sucessivas de 0,75 ponto percentual, a Selic deverá cair apenas 0,50 ponto na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central marcada para a próxima quarta-feira. O juro básico está hoje em 15,75% e deverá recuar para 15,25% segundo consenso maciço dos analistas. Dos 13 especialistas consultados ontem pelo Valor, 12 apostam em corte de 0,50 ponto. A desaceleração do declínio é justificada pelo momento turbulento e errático vivido pelos mercados.
Mas, em nome dele, o BC não pode agir com excesso de cautela e diminuir ainda mais o ritmo de queda ou mesmo estancá-la. O BC não pode liderar o pessimismo. Se o Copom parar de cortar a Selic e, com isso, patrocinar um aumento do juro real e uma desvalorização cambial, estará dizendo ao mercado que a volatilidade atual não é pontual e temporária. Irá sancionar a turbulência e a especulação que a acompanha. "Se interromper a queda, o Copom estará adicionando uma pitada a mais de incerteza", diz Elson Teles, economista-chefe da corretora Concórdia.
Se não fosse pela instabilidade externa, o BC poderia continuar derrubando a Selic no compasso de 0,75 ponto em face do surpreendente superávit primário registrado em abril pelo setor público, o melhor em 15 anos. "Mesmo antes do surgimento das turbulências, já prevíamos desaceleração dos cortes por causa da questão fiscal. O superávit de abril até poderia reintroduzir o compasso de 0,75 ponto se tudo estivesse calmo lá fora", diz o economista-chefe da GRC Visão, Jason Vieira.
O economista-chefe do Unibanco, Marcelo Salomon, diz que o país está "bem blindado" contra a volatilidade externa. O BC trabalhou para enfrentar períodos como esse, ao recompor reservas, reduzir a exposição cambial nas dívidas interna e externa e ao recomprar dívida externa antiga. É por isso que as instabilidades não alteraram o plano original de atuar com maior parcimônia na condução da política monetária. A alta recente do dólar, considerada temporária, não muda o cenário. "O dólar não deverá voltar aos R$ 2,05, mas também não permanecerá entre R$ 2,30 e R$ 2,40.
Eduardo Velho, da Mandarim Gestão de Ativos, considera a interrupção da queda do juro um "erro técnico". Por três razões: as expectativas de inflação continuam controladas, a despeito da volatilidade do mercado nos últimos dias; as projeções do IPCA em 2006 continuam abaixo da meta, com o juro atual, ou seja, ainda há espaço técnico pelo regime de metas para continuar reduzindo a Selic; o canal de repasse do câmbio à inflação tem sido muito baixo. "Vale destacar que o recuo dos preços das commodities tem sido mais elevado no exterior comparativamente ao aumento do câmbio doméstico", compara Velho.
A redução do ritmo de corte de 0,75 para 0,50 ponto seria consistente com as ressalvas apontadas pelo Copom nas últimas atas, entre as quais se destacam duas: o impacto da Selic sobre a atividade econômica ficará mais intenso a partir do segundo trimestre e o monitoramento dos impactos da dinâmica da política monetária do G7.
Para Sergio Vale, da MB Associados, como os indicadores da economia americana podem não vir todos alinhados na mesma direção, a intensidade da volatilidade pode se manter relativamente elevada e se estender por semanas. "Neste contexto de instabilidade e grande incerteza, se acentua a parcimônia já declarada pelo BC, o que nos faz avaliar que a queda da Selic na reunião da próxima semana pode ser de somente 0,5 ponto", diz ele.
Para o vice-presidente da Acrefi (associação das financeiras), José Arthur Assunção, nesse momento de turbulência o futuro da economia mundial mostra-se nebuloso. "Mas, mesmo que seja passageira, o Copom vai ser bem mais cauteloso na reunião da próxima semana. Se a intenção fosse promover uma queda de 0,75 ponto na Selic, o corte não passaria de 0,5. E se a intenção fosse 0,5 ponto, não iria além do 0,25", diz Assunção.
Para o economista-chefe do Banco Santander, André Lóes, o comportamento que os pregões exibirão nos próximos quatro dias, de hoje até quarta-feira, será fundamental para a decisão do Copom. Se o dólar persistir em queda, o BC se sentirá confortável macroeconomicamente para reduzir o juro em 0,50 ponto. Mas se o câmbio persistir excessivamente volátil, a tendência é o Copom interromper o declínio para avaliar melhor o cenário.
Marcelo Ribeiro, da Pentágono Asset, não compartilha da visão suave da maioria dos seus pares segundo a qual vive-se um momento de "realização" de lucros, mais ou menos intensa dependendo do indicador do dia. "O cenário internacional está muito complicado, e não se sabe ainda se o atual movimento é o início de algo mais substancial ou não", diz ele. Por essa razão, o Copom deveria ignorar quaisquer pressões políticas originárias do Planalto e manter inalterada a taxa de juros, aguardando uma melhor definição do cenário externo.