Título: Governo anuncia R$ 1,3 bi para saneamento, mas não deve gastar
Autor: Mônica Izaguirre e Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Valor Econômico, 23/05/2006, Brasil, p. A2

O governo federal dificilmente conseguirá cumprir a promessa de conceder R$ 1,34 bilhão em empréstimos com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para investimentos estaduais e municipais em saneamento básico ainda em 2006. A quantia foi anunciada ontem pelo presidente Lula, em solenidade de assinatura dos respectivos convênios com Estados e municípios, no Palácio do Planalto. Duas importantes entidades empresariais do setor, porém, asseguram que, em função das restrições do calendário eleitoral, não há mais tempo hábil para que todos os convênios se transformem em contratos.

"O que houve foram apenas protocolos de intenção. Para que os financiamentos se concretizem ainda este ano é preciso assinar os contratos até 30 de junho, o que nem todos estão em condições de fazer", afirma Marcos Thadeu Abicalil, assessor técnico da Aesbe, associação que reúne as empresas estaduais de água e esgoto. Idêntica avaliação faz o vice-presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martinez. "Não há como", diz.

No caso dos Estados, que terão menos da metade do total anunciado, a Aesbe acredita que os contratos até podem sair no prazo imposto pelas legislações eleitoral e fiscal em ano de eleição. Mas entre os municípios, que terão 53,3% do total, muitos dos candidatos aos recursos sequer submeteram projeto à aprovação da Caixa Econômica Federal, informa Abicalil. "Sabemos disso porque várias prefeituras pediram às companhias estaduais que elaborassem o projeto depois da assinatura do convênio", conta ele. O próprio Lula admitiu o problema ao cobrar dos prefeitos os projetos para que os recursos sejam liberados.

Mesmo que suas previsões pessimistas não se confirmem e a maior parte dos 33 convênios assinados ontem se transformem em contratos, Martinez e Abicalil não acreditam que o anúncio feito por Lula gerará algum investimento efetivo ainda este ano. Em se tratando de empréstimos para execução de projetos de saneamento básico, é normal que os desembolsos contratados num ano não ocorrem integralmente dentro do mesmo ano, pois dependem do andamento das obras. Por causa da combinação das legislações eleitoral e fiscal, porém, como nada foi contratado até agora, a previsão da Aesbe e da CBIC é de que sequer seja possível fazer o primeiro desembolso em 2006.

Mesmo em anos não-eleitorais, o governo ficou longe de cumprir integralmente suas promessas de investimento em saneamento básico. Para 2005, por exemplo, o plano era contratar, com recursos do FGTS, R$ 2,7 bilhões. Perto da intenção, o valor contratado foi inexpressivo: cerca de R$ 36 milhões, menos de 2%. Nos anos de 2003 e 2004, o volume contratado foi significativo: respectivamente R$ 1,58 bilhão e R$ 1,9 bilhão. Ainda assim, parte do orçamento do FGTS para saneamento não foi cumprida, em parte pelas restrições ao endividamento público.

Diante dos prefeitos que foram ao Planalto assinar os convênios, o presidente Lula defendeu que os esforços sejam canalizados para atender os grandes centros. "Sem esquecer as cidades menores, precisamos começar a priorizar o investimento nos grandes centros urbanos onde ocorreu uma concentração muito grande de gente".

Serão beneficiados governos estaduais e municipais do Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, Pará, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Roraima, Santa Catarina e São Paulo.