Título: Falta discurso coeso do governo para rating do Brasil ser elevado
Autor: Cataldo,Beth
Fonte: Valor Econômico, 05/10/2011, Finanças, p. C8

O Brasil já poderia ter subido mais um degrau na classificação de risco das agências internacionais de rating se conseguisse manter um discurso coerente na condução da política econômica. As dissonâncias protagonizadas pela presidente Dilma Rousseff e pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, especialmente nas áreas fiscal e monetária, retêm o país em degraus inferiores aos de países que apresentam fundamentos econômicos muito menos exuberantes.

Na escala da Standard & Poor"s, por exemplo, a classificação brasileira como BBB- é superada por países com deficiências visíveis, tanto na estrutura econômica como institucional: Bahrain, Bulgária, Lituânia, Rússia e México, que ostentam a nota BBB. Nesse grupo, chamam atenção a fragilidade das instituições russas e o risco político dos mexicanos, às voltas com uma guerra interna sangrenta contra os narcotraficantes e uma forte dependência da economia dos Estados Unidos.

O Brasil, medido pelos critérios objetivos das agências, está em situação muito melhor. E poderia ter evoluído na escala de grau de investimento, que conquistou em abril de 2008, para um patamar mais ambicioso, que lhe abrisse novas portas de acesso a recursos de investidores globais em busca de segurança e previsibilidade. No cenário conturbado pela crise financeira internacional, há espaço de sobra para situar a economia brasileira numa posição mais destacada.

Os dados brasileiros sobressaem a partir de um risco político pequeno, uma estrutura econômica saudável, boas perspectivas de crescimento, flexibilidade fiscal, carga de dívida adequada em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) e excelentes indicadores de liquidez externa e carga de endividamento. Mas, ao transgredir uma das regras de ouro das agências de classificação, que é a transparência nas decisões e objetivos da política econômica, o país patina numa posição de menor brilho.

As pressões desencadeadas publicamente por Dilma Rousseff e Guido Mantega sobre o Banco Central, em favor de cortes mais acentuados na taxa Selic às vésperas da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), pesaram nessa avaliação negativa. As declarações, reiteradas por ambos na última sexta-feira, em São Paulo, caracterizam um cenário adverso para a atuação independente da autoridade monetária, aos olhos dos especialistas das agências.

No fim de semana, o ministro-chefe da secretaria-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, foi ainda mais longe ao informar que o governo planeja baixar a Selic para 9% em 2012. As declarações não foram desmentidas.

Além disso, não passou despercebido o fato de o rigor fiscal prometido pela equipe econômica do governo destoar da decisão de contratar milhares de novos funcionários públicos no próximo ano e ampliar os gastos correntes. Alterar a nota brasileira para melhor, neste momento, poderia ser recebido, temem esses especialistas, como um sinal de aprovação tácita ao discurso desencontrado na área econômica.

Com todas essas ressalvas, as agências aguardam apenas uma primeira oportunidade de melhor alinhamento da postura do governo brasileiro para premiar o país com uma nota de classificação de rating mais generosa. A não ser que discrepâncias mais agudas sejam identificadas no discurso oficial, expectativa é de que isso possa acontecer em breve, até por dever de coerência em relação aos dados macroeconômicos apresentados pelos diversos países classificados.