Título: Bolívia garantiu 0,4% do lucro da Petrobras
Autor: Cláudia Schüffner e Francisco Góes
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2006, Brasil, p. A3

A contribuição da Bolívia para o lucro de R$ 6,67 bilhões da Petrobras no primeiro trimestre de 2006 foi irrisória, de US$ 13 milhões (cerca de R$ 28 milhões), ou 0,42% do total. No primeiro trimestre de 2005 havia sido de US$ 24 milhões (cerca de 53 milhões em valores atuais). Apesar de ter alcançado US$ 32 milhões no quarto trimestre do ano passado, a Petrobras avalia que a perspectiva na operação boliviana é de queda na lucratividade. Uma perspectiva que se desenhou com o aumento da tributação de 18% para 50% em maio do ano passado e que na visão da empresa, tende a se transformar em prejuízo com o novo aumento da carga tributária para 82%. Por isso, qualquer problema na controlada Petrobras Bolívia, terá pouco impacto no resultado financeiro da companhia. Este ponto foi ressaltado ontem por dois diretores da companhia: Almir Barbassa (Financeiro) e Ildo Sauer (Gás e Energia).

Sob o ponto de vista energético, a Petrobras informou que tem capacidade para substituir por óleo combustível todo o gás importado da Bolívia, cujo volume em barris é de 100 mil barris de óleo equivalentes por dia, caso ocorra uma interrupção no fornecimento daquele país, o que a companhia não acredita que ocorra. O presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli, deixou também claro ontem, ao participar da abertura do Fórum Nacional, no Rio, que a empresa aposta no desenvolvimento de fontes alternativas de energia.

"A crise (com a Bolívia) mostra aspectos importantes das oportunidades que se apresentam no futuro. A crise mostra a necessidade de diversificação de fontes, de encontrar mecanismos para ajustar o crescimento da demanda à capacidade de aumento da oferta. Mostra também a necessidade de buscar gestão mais adequada para o crescimento (do mercado) interno", disse Gabrielli em seu discurso.

Ele destacou ainda que o biodiesel e o etanol terão cada vez mais importância no mundo e, em particular, no mercado brasileiro. "No Brasil (o papel dos biocombustíveis) será expressivo em função da recente crise com a Bolívia", frisou o executivo.

O consumo brasileiro de gás natural é de 200 mil barris de óleo equivalente (boe) - que mede em barris de petróleo a energia gerada por qualquer outro combustível -, dos quais 50%, ou 100 mil barris equivalentes são importados da Bolívia.

A substituição do gás planejada pela Petrobras será possível com a redução das exportações de óleo combustível. A companhia exportou uma média de 250 mil barris/dia de derivados no primeiro trimestre. E pode redirecionar parte deste volume para o mercado interno, disse Barbassa.

A conta leva em consideração apenas o teor energético de cada combustível. É claro que a medida traria impactos para parte da indústria paulista, principalmente, a que migrou seus equipamentos para o gás. Ela enfrentará dificuldades e custos adicionais para fazer a reconversão.

"Substituir o gás não é simples, vai exigir um esforço de todo mundo. A empresa está estudando todas as oportunidades para se preparar. É preciso trabalhar com contingências, estar preparado para situações inesperadas. Não é simples, mas não é impossível", disse Barbassa.

Considerando ainda o teor energético, o gás boliviano poderia ser integralmente substituído com o aumento da proporção de álcool na gasolina, que era de 25% para cada litro e caiu para 20% no início do ano com a escalada dos preços do álcool.

Em seminário na Coppe da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) sobre efeitos da nacionalização do gás e petróleo na Bolívia, Ildo Sauer, diretor de Gás e Energia, disse o mesmo. "Do lado brasileiro, a falta de gás é um transtorno, mas (o gás) é substituível. Há recursos e, com logística e um custo maior, o Brasil vai sobreviver sem gás boliviano", observou Sauer.

Sauer deixou o local à tarde frisando que o governo da Bolívia nunca aventou a possibilidade de suspender o suprimento para o Brasil, o que segundo ele seria "um desatino". Ele também respondeu com uma negativa à proposta do vice-presidente da Bolívia, Alvaro Linera, que em entrevista ao Valor disse que um aumento de US$ 1 no preço significaria pouco ou nada para o Brasil e para a Petrobras, mas elevaria a receita da Bolívia em US$ 300 milhões. Ele elogiou a entrevista, mas deu a seguinte resposta a Linera: "Para nós custa sim, custa US$ 1 a mais".

O diretor financeiro também afirmou que os investimentos para construção de plantas de regaseificação no país - que usariam gás liqüefeito importado de outras regiões - deverão ser incluídos no Plano Estratégico para 2007-2011, o que pode elevar os gastos da área de gás e energia. Segundo Sauer, a Petrobras estuda construir três plantas: uma no Sudeste, uma no Nordeste, e outra no Sul. No atual plano estratégico, a Petrobras prevê investir US$ 16 bilhões até 2010 na exploração e produção de gás na bacia de Santos, e gasodutos. O volume sobe para US$ 18 bilhões quando incluídas outras empresas.