Título: CPI dos Bingos diverge sobre convocação de Dantas
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2006, Política, p. A5

O senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) terá trabalho para conseguir aprovar hoje requerimento na CPI dos Bingos para convocar Daniel Dantas, dono do grupo Opportunity. O banqueiro teria dito que recebeu pedido de pagamento de propina do PT e teria uma relação de contas no exterior mantidas pelo presidente Lula e outros caciques petistas. Seria chamado para esclarecer tais denúncias. Ontem, a maior parte dos senadores da CPI tratou o assunto com cautela e não parece disposta a ouvir Dantas na CPI dos Bingos. O foro adequado para ouvi-lo seria outro.

A principal voz contrária à convocação do banqueiro é do relator da CPI, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN). "Acho que a CPI não tem condições de exaurir essa investigação a tempo, pois vou entregar o relatório até o fim de maio para votarmos no início de junho", afirmou. Garibaldi defende a investigação do caso por Ministério Público e Polícia Federal. "Se a maioria quiser convocar, terei de ouvi-lo. Se for só para ouvir, tudo bem. Mas não posso brincar de relatoria", completou. A investigação das contas no exterior teria, necessariamente, de contar com apoio de autoridades estrangeiras. Para o pemedebista, os 20 dias que restam da CPI não seriam suficientes para os dados chegarem ao Brasil.

A revista "Veja" publicou reportagem no fim de semana sobre as supostas contas no exterior. Segundo a publicação, um investigador teria repassado a Dantas uma lista com dados de contas bancárias nos nomes de Lula, dos petistas José Dirceu, Antonio Palocci, Luiz Gushiken e Márcio Thomaz Bastos, além do diretor-geral da PF, Paulo Lacerda, e do senador Romeu Tuma (PFL-SP).

Nem o PFL tem convicção na viabilidade da convocação de Dantas à CPI. "Não podemos correr o risco de apresentar requerimento e sermos acusados de ficar fora do foco da CPI", afirmou o líder pefelista no Senado, José Agripino (RN). O senador diz ser "fundamental" ouvir Dantas sobre a denúncia do achaque do PT que ele diz ter sido vítima e pelas contas no exterior: "Queremos chamá-lo ao Congresso. Onde? Ainda não sabemos. Pode ser na Comissão de Fiscalização, por exemplo".

O PT e o governo têm posição contrária à convocação de Dantas. A bancada do partido se reúne hoje de manhã para fechar questão, mas a líder Ideli Salvatti (SC) adianta seu posicionamento. "Daniel Dantas foi investigado nas CPIs do Mensalão e dos Correios. O nome dele consta do relatório final da CPI dos Correios. Esse assunto já passou pelo Congresso e encontra-se em outra instância de investigação, que é o Ministério Público", afirmou.

Arthur Virgílio até aceita não convocá-lo na CPI. Disse ontem que vai à sessão de hoje da comissão "desarmado", mas garante que o Congresso irá investigar a denúncia do achaque: "Ou vamos investigar lá, na CPI dos Bingos, ou em outro lugar. Mas vou averiguar a denúncia profundamente". E completa: "Não vou atrapalhar o relator. Mas não se pode não investigar algo tão grave como esse pedido de propina feito pelo PT", afirmou. O requerimento visa ouvir o banqueiro apenas sobre a propina. Sobre as contas, Virgílio é cauteloso: "É preciso que se prove a existências dessas contas primeiro".

Daniel Dantas divulgou ontem uma nota sobre a reportagem da "Veja", na qual nega ter encomendado "investigação de qualquer natureza sobre atividades ou pessoas do governo federal ou de qualquer autoridade." Dantas também afirma não ter preparado ou encomendado dossiês, e acrescentou: "Se dados foram produzidos no curso de algum procedimento já de conhecimento público, tal sucedeu sem minha autorização."

O banqueiro admitiu que teve conhecimento do teor de parte do material que embasou a reportagem, mas alegou não ter tido acesso a estes papéis. Disse ter considerado seu "descrédito" sobre o assunto e considerou-o "inverossímil". Dantas também negou ter entregue documentos ou dado informações à "Veja" ou qualquer outro veículo de comunicação relacionados ao tema da reportagem, mas disse ter concedido entrevista a colunista da revista.

Ontem, a Polícia Federal comunicou que vai abrir um inquérito para averiguar a existência de contas em paraísos fiscais em nome de autoridades. Em comunicado, a PF afirma que desde novembro de 2005 tinha conhecimento de que estava em curso "uma ação ardilosa" para atribuir "falsamente" a autoridades a titularidade de contas no exterior. Segundo a polícia, Paulo Lacerda já autorizou o acesso ao seu sigilo bancário e fiscal "no Brasil e no exterior" e que ele declarou "que não tem e jamais teve valores ou bens no exterior".

Para a instituição, a reportagem de "Veja" comprova "autoria da trama criminosa, arquitetada" por um grupo de pessoas envolvidas em uma série de crimes, como formação de quadrilha e violação de sigilo.

Luiz Gushiken rejeitou a acusação de ter conta bancária em paraísos fiscais e afirmou que vai processar Daniel Dantas e a revista "Veja". Em nota distribuída à imprensa, Gushiken afirma que o teor da reportagem é "mais uma manobra espúria do banqueiro Daniel Dantas, com claro objetivo de manipular a opinião pública e esconder os inconfessáveis interesses do grupo econômico que ele comanda". (Colaborou Francisco Góes, do Rio, com agências noticiosas)