Título: Sem cartas na manga, governo encara protestos de produtores
Autor: Mauro Zanatta
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2006, Agronegócios, p. B12

Diante da resistência da equipe econômica em aceitar uma nova renegociação geral para os R$ 12,6 bilhões em dívidas rurais atrasadas e já renegociadas, o Palácio do Planalto dá sinais de ter esgotado seu estoque de medidas de impacto imediato para socorrer o setor rural. Pior: terá que encarar os protestos marcados para hoje, em Brasília, sem soluções à vista para arrefecer os ânimos.

Mais ágil que em 2005, o Ministério da Agricultura anunciou, em abril, um pacote de R$ 9 bilhões em prorrogações de débitos de investimento e custeio e recursos orçamentários adicionais para a comercialização da atual safra 2005/06, além de um minipacote de R$ 1 bilhão para elevar os preços pagos pela soja no Centro-Oeste.

Para os agricultores familiares e os assentados da reforma agrária, o governo estuda renegociar R$ 1,3 bilhão em dívidas atrasadas no Pronaf e Procera. A Contag, que também inicia hoje reivindicação com o "Grito da Terra", quer uma rolagem por 20 anos, dois de carência e 70% de desconto para quem pagar em dia.

Com pouco ânimo para seguir na atividade rural empresarial, mas dispostos a manter as manifestações e bloqueios de rodovias nos principais pólos agrícolas, os produtores querem lotar hoje o Congresso para demonstrar sua insatisfação com as medidas já adotadas até. Terão na empreitada o apoio de 15 governadores, liderados por Blairo Maggi (PPS-MT).

O setor rural insiste em uma nova securitização das dívidas rurais, como a ocorrida em 1995. "Sem renegociação, não há solução séria para a crise", afirma a deputada Kátia Abreu (PFL-TO), também vice-presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Mas querem, agora, algo menos factível, segundo o governo: exigem uma solução para seus débitos com fornecedores privados. A CNA propõe um complexo lançamento de títulos da dívida pública para refinanciar os débitos privados que incluiria até aval do Tesouro para o calote.

O governo tentou uma solução parcial para amenizar o endividamento com os fornecedores privados. Reestruturou a linha Giro Rural, criada com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), para permitir o financiamento de dívidas com Cédulas do Produto Rural (CPRs) e a liberação do dinheiro diretamente aos produtores, sem a obrigação do aval dos credores privados. Mas reduziu em R$ 616 milhões o orçamento da linha. "Este governo ignorou medidas estruturantes. Nada foi feito até aqui ", acusou o superintendente técnico da CNA, Ricardo Cotta.

Uma pesquisa da CNA feita em abril com 7.849 produtores traduz a disposição do setor. Ao menos 76% dos produtores esperam colher menos nesta safra e 98% dos pecuaristas acreditam que a atividade está em crise - 57% dos agricultores e 75% dos pecuaristas terão perda de rentabilidade ou enfrentarão prejuízo no curto prazo.

O levantamento apurou que 70% dos agricultores demitiram ou deixaram de contratar na atual safra, na qual 57% projetam que terão prejuízo. Um dos responsáveis por este quadro de dificuldades, na avaliação de 43% dos consultados, foi o aumento dos custos.