Título: Moratória não contém desmatamento
Autor: Veloso,Tarso
Fonte: Valor Econômico, 14/10/2011, Agronegócios, p. B14

O aumento do desmatamento para plantio de soja na Amazônia, apesar da moratória em vigor desde 2006, pode ter sido reflexo da discussão do Código Florestal. A afirmação foi feita pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, durante reunião em Brasília na quinta-feira para a renovação, pelo quinto ano consecutivo, do acordo firmado entre ONGs e indústria.

"Os produtores podem ter desmatado mais por acharem que o Código dará anistia aos desmatadores, algo que não acontecerá. Esse aumento foi causado por fatores regionais, mas que já foram controlados", disse a ministra. No monitoramento da safra 2010/11, foi possível identificar a presença da oleaginosa em 11.698 hectares desflorestados após julho de 2006, data da criação da moratória. Embora isso corresponda a apenas 0,39% da área total aberta em Mato Grosso, Pará e Rondônia nesses cinco anos, foi bem mais que os 6.295 hectares da safra anterior.

Segundo o Greenpeace, as taxas de desmatamento voltaram a crescer, após dois anos em queda, na esteira "das promessas de anistia a quem cometeu crimes ambientais discutidas no Congresso". Mato Grosso, onde predomina a produção de soja, retomou a posição de Estado que mais desmatou em 2011.

Uma análise feita pelo braço brasileiro da ONG mostrou que esse avanço ocorreu sobretudo em áreas agrícolas, com um aumento de 46% das derrubadas. Se forem levados em conta apenas os municípios da moratória no Estado, o crescimento é ainda maior: 58% de um ano para o outro. "O número de casos vem crescendo em ritmo preocupante, e esse aumento no Mato Grosso colocará, em um ou dois anos, muito mais soja de desmatamento no mercado. A moratória nunca foi tão importante", diz Paulo Adario, diretor da Campanha Amazônia do Greenpeace.

Além do monitoramento do desmatamento, restrição de compra e financiamento, a indústria, representada pela Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), comprometeu-se a promover entre os produtores o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que fornece informações básicas como o perímetro das fazendas (georreferenciamento) e a quantidade de vegetação remanescente. Esse mapeamento é crucial para que a moratória seja cumprida. Até agora, o pacto não conseguiu avançar muito no assunto.

Outra dúvida é se os produtores rurais continuarão aceitando a tolerância zero ou atenderão o que dirá o novo Código. Há algum tempo, alguns representantes da indústria defendem o direito de desmatar o que a legislação prevê. Sempre há compradores flexíveis em relação à questão ambiental, como a China.

Para tentar mostrar o contrário, o Greenpeace informou que a Amazon Alliance - grupo internacional formado por empresas consumidoras de soja brasileira, como McDonald"s, Carrefour e Tesco - divulgou nota reafirmando seu compromisso com o desmatamento zero. No comunicado, as empresas se disseram preocupadas com as alterações propostas no Código, já que "uma das razões pelas quais a moratória da soja é bem-sucedida é que ela é mais ambiciosa que a legalidade, mirando o desmatamento zero".

"A renovação da moratória e o comunicado da Amazon Alliance mostram que existe um setor do agronegócio brasileiro capaz de crescer sem derrubar mais floresta. Mas, enquanto isso, no Congresso e no campo, tem gente que ainda prefere um modelo de produção atrasado e predatório", afirmou Paulo Adario.

Com a renovação assinada ontem, a medida vigorará até 31 de janeiro de 2013. Compõem o grupo empresas como Cargill, Bunge, ADM e Amaggi, além de ONGs como Conservação Internacional, Greenpeace, IPAM, TNC e WWF-Brasil.