Título: Camex avalia manter proteção ao setor de brinquedos até 2006
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 09/11/2004, Brasil, p. A-4

A Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq) solicitou novamente a prorrogação por mais um ano e meio da salvaguarda que protege o setor desde 1996. Com o argumento de que não completou seu processo de ajuste, a entidade sugere adoção de taxa extra de importação de 9% em 2005 e 8% no primeiro semestre de 2006. Somadas aos 20% da Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul, as tarifas totais atingiriam 29% e 28%. Adotada após a abertura do mercado e a falência de 650 empresas, a salvaguarda dos brinquedos está em vigor há oito anos e meio e foi renovada duas vezes: em dezembro de 1999 e de 2003. Caso seja atendido o atual pleito da Abrinq, a proteção durará 10 anos, prazo máximo permitido pela Organização Mundial de Comércio (OMC). O assunto pode ser avaliado pela Câmara de Comércio Exterior (Camex) na segunda-feira, segundo fontes envolvidas. A salvaguarda permite aos países impor tarifas ou cotas temporárias para conter um "surto" de importações que provoque dano à indústria doméstica. A adoção desse mecanismo tem que ser acompanhado de um processo de ajuste das empresas nacionais. O processo técnico de renovação das salvaguardas está sendo feito esse ano de forma mais simples que nas ocasiões anteriores, o que irritou os importadores. Eles dizem que o processo "corre a sua revelia" e pode ser usado para "acalmar o empresariado", que reclamou do Brasil reconhecer a China (maior exportador mundial de brinquedos) como economia de mercado. A União Européia (UE), que também é parte interessada, estuda questionar o Brasil na OMC (ver matéria abaixo). No processo anterior, realizado em 2003, a Abrinq protocolou pedido de prorrogação da salvaguarda junto ao Departamento de Defesa Comercial (Decom), do Ministério do Desenvolvimento. Em 21 de novembro de 2003, após audiências públicas e visitas a fabricantes nacionais para conferir a adoção de medidas de ajuste definidas na salvaguarda anterior, o Decom emitiu o parecer nº 03/20 sugerindo a prorrogação da salvaguarda por dois anos e meio. Esse prazo foi notificado à OMC, mas em reunião da Camex em 17 de dezembro de 2003, os ministros estenderam a prorrogação por apenas um ano, como consta na resolução 47 da Câmara. Segundo fontes, pesaram na decisão as relações entre Brasil e a China e a proximidade da viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao país, que aconteceu em maio desse ano. Em 7 de outubro passado, a Abrinq protocolou novo pedido de prorrogação da salvaguarda por um ano e meio. A entidade usou como base de sua justificativa o parecer do Decom do processo anterior, que recomendou dois anos e meio. Em 12 de novembro, a americana Mattel - maior fabricante mundial de brinquedos, dona da boneca Barbie, que possui unidades na China - enviou ofício ao Decom questionando se seria aberta uma investigação e solicitando audiência pública. No ofício de resposta, o Decom explica que "o pedido apresentado pela Abrinq não constitui novo processo de revisão" e por isso não seria reaberta a investigação. O Decom diz ainda que não está elaborando um novo parecer, mas uma nota técnica para auxiliar na decisão dos ministros. Nessa nota técnica, obtida pelo Valor, o Decom esclarece que "consta da Ata da Reunião da Camex de 17 de dezembro que os ministros decidiram pela prorrogação da medida, por um ano, com possibilidade de revisão, a ser discutida em dezembro de 2004". As atas da Camex não são públicas. Por meio da assessoria de imprensa, o Mdic alega que o Brasil enviou notificação à OMC, em 2003, de que iria prorrogar a salvaguarda por dois anos e meio e não modificou esse prazo após a decisão da Camex. Portanto, perante a OMC, o país poderia rever a decisão sem abrir novo processo. O ministério diz que não há data para a Camex avaliar o assunto. "Deveria constar na resolução da Camex que a medida seria reavaliada", diz Márcio Gonçalves, do escritório Viseu Castro Cunha Oricchio, que representa a Mattel. "A menção à ata da Camex pegou todo mundo de surpresa". Para Synésio Batista da Costa, presidente da Abrinq, o governo concedeu uma "prestação", mas falta o "saldo". "Fiz a salvaguarda, ganhamos o jogo e o governo por razões políticas deu uma prestação. Só está faltando o resto", diz. O executivo argumenta que o setor está se esforçando para atingir o nível de competição dos chineses, mas "falta colocar o teto sobre a casa". Se a salvaguarda acabar agora, o esforço pode ser perdido, avalia. Para realizar a nota técnica, o governo visitou quatro empresas (Plásticos Nillo, Brinquedos Bandeirante, Grow, e Estrela) e conferiu a evolução das importações. Em 2003, a participação das compras externas no consumo aparente estava em 15,9%, ante 17,2% em 2002 e 20,5% em 2001. Mas as importações praticamente duplicaram no primeiro semestre de 2004 ante o mesmo período do ano passado, atingindo US$ 16,7 milhões. A indústria nacional culpa o dólar e o contrabando. Os importadores argumentando que os brasileiros estão diversificando seu mix de produtos com itens importados. Foi considerado o primeiro semestre de 2004 para verificar o ajuste das empresas. O grupo de 25 indústrias avaliado no processo já lançou 85,9% dos produtos acordados para o ano, gerou 58,2% dos empregos e treinou 94,3% dos funcionários. Dos US$ 82,4 milhões de investimentos previstos para 2004, as indústrias aplicaram 38,7% dos recursos (R$ 31,9 milhões) até junho. As companhias investiram R$ 12 milhões em desenvolvimento de produto, o que significa 51,6% do programado. Em campanhas de marketing e vendas, as empresas gastaram R$ 8 milhões, ou 29,6% do acordado com o governo para o ano. As vendas desse setor se concentram no final do ano (Dia das Crianças e Natal). As exportações das 25 empresas avaliadas no processo atingiram R$ 4,2 milhões, ou 22,3% da meta do ano. Os investimentos totais também incluem gastos em capacitação produtiva e treinamento dos funcionários.