Título: MP investiga "insider" e abusos no InvestVale
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 14/07/2006, Eu &, p. D1

Diferentemente dos clubes atuais, o InvestVale foi uma solução para permitir a participação dos funcionários na privatização da Vale do Rio Doce e chegou a ter 35 mil cotistas e patrimônio de R$ 1,4 bilhão. Hoje, tem 3.500 cotistas, patrimônio de R$ 500 milhões e não aplica apenas em ações da Vale. Já a média dos clubes de ações do mercado é de 23 cotistas.

O clube da Vale nasceu de um financiamento do BNDES para que os funcionários comprassem as ações. Os papéis ficaram como garantia do empréstimo e só poderiam ser vendidos pelo clube no vencimento da dívida, em 2009. Até lá, os cotistas poderiam vender suas cotas para o próprio InvestVale, que as revenderia no mercado. Mas havia a possibilidade de liberar os papéis caso a dívida fosse quitada antes. E foi o que aconteceu em 2003, uma vez que o preço das ações disparou e foi mais que suficiente para pagar o BNDES.

O problema, segundo a CVM e o Ministério Público, é que, até o fechamento do acordo para liberar os papéis, as cotas do clube foram negociadas a R$ 35, com base no valor das ações na data da privatização. Depois da liberação dos papéis, essas cotas chegaram a valer mais de R$ 170,00. E os diretores, sabendo da negociação com o BNDES, compraram as cotas revendidas pelos outros investidores ao clube pelo preço mais baixo e não avisaram os demais cotistas, o que caracteriza informação privilegiada, ou "insider information".

Ao mesmo tempo, os diretores do clube mudaram o estatuto em assembléia e aprovaram uma "taxa de liquidez" pela celebração do acordo com o BNDES. Só que, segundo o Ministério Público, a negociação já estava prevista desde a criação do clube e se limitou a um ofício enviado ao banco. Por esse trabalho, os diretores receberam R$ 35 milhões, sendo que o presidente do clube, Francisco Valadares Póvoa, e o diretor financeiro, Otto de Souza Marques Júnior - hoje diretor de Controladoria da Vale do Rio Doce -, receberam R$ 9 milhões cada. Procurados, Póvoa e Marques não retornaram as ligações. A Vale não se pronunciou.

Segundo um executivo, "a sacanagem não foi de mercado, mas entre os cotistas, os próprios diretores criaram uma despesa e se atribuíram um prêmio, coisa fora do controle da bolsa ou do administrador". Os diretores foram favorecidos pelo excepcional rendimento do clube, que acabou mascarando a taxa. O custo final, de R$ 35 milhões, dividido entre os 35 mil cotistas, equivale a R$ 1 mil por investidor, enquanto quem aplicou R$ 1 mil na época da privatização recebeu cerca de R$ 20 mil.

O procurador responsável pela ação, José Augusto Vagos, disse ontem ao Valor que o juiz da 7ª Vara Criminal, Marcelo Granado, deve acolher a denúncia na semana que vem. Ele pretende acrescentar novos fatos à denúncia, como a atuação do InvestVale como instituição financeira, sem autorização do Banco Central. Segundo ele, boa parte do dinheiro obtido pelos diretores foi enviado ao exterior. Na denúncia, Vagos acusa os diretores de ludibriarem "pessoas humildes, empregados de menor salário". (AP e Vera Saavedra Durão, do Rio)