Título: Para dívida italiana, queda do PIB pesa mais do que juro
Autor: Ribeiro,Alex
Fonte: Valor Econômico, 14/11/2011, Especial, p. C10
O risco mais sério que a Itália tem pela frente não é exatamente a alta dos juros exigidos pelo mercado financeiro para rolar a sua dívida pública, como ocorreu na última semana, mas sobretudo a desaceleração econômica que se anuncia pela frente. A alta dívida italiana é mais sensível a uma eventual recessão do que à alta dos custos de financiamento no mercado.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgou relatório na sexta-feira afirmando que o plano anunciado pela Itália para atingir as metas de ajuste fiscal fixadas pelo G-20 são baseadas em premissas sobre crescimento econômico "excessivamente otimistas". Sem crescimento, fica difícil cortar à metade até 2013 o déficit nominal do ano passado, equivalente a 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB), como acordado na reunião do G-20 de Toronto em 2010.
Pelos cálculos do FMI, apresentados em seu monitor fiscal de setembro, uma alta de um ponto percentual nos juros dos títulos públicos da Itália leva a uma alta de 0,2% do PIB na despesas com juros dentro de um ano e de 0,5% do PIB dentro de três anos. É um impacto não desprezível, considerando que na semana passada os juros dos títulos italianos chegaram a bater num pico de 7,5% ao ano, bem acima dos percentuais em torno de 4% observados há cerca de um ano.
Mas o efeito mais forte sobre a dívida, mostram as projeções do FMI, seria uma frustração nas projeções de crescimento econômico. A dívida pública da Itália, hoje em 120% do PIB, subirá o equivalente a 20 pontos percentuais do PIB até 2016 se o crescimento econômico for 1% mais baixo do que o projetado para o período.
"Qualquer solução para a Itália deverá envolver crescimento econômico no médio e longo prazos", afirmou o professor Thomas Philippon, da New York University, em teleconferência sobre a crise do euro promovida pelo Concil on Foreign Relations (CRF), um centro independente de estudos baseado em Washington.
A dívida pública italiana tem sensibilidade relativamente baixa a altas de juros porque seu prazo de vencimento é longo. Altas de juros no mercado só afetam a dívida quando ela é rolada. A maturidade da média da dívida italiana é de sete anos, maior do que maior parte das economias avançadas, exceto a Inglaterra. A sensibilidade ao crescimento econômico é grande porque o endividamento italiano é bastante alto em relação ao seu próprio PIB. Se o PIB fica menor, a dívida cresce proporcionalmente. Fraco crescimento também reduz arrecadação do governo e aumenta os gastos públicos.
Uma eventual recessão foi o principal risco para a Itália apontado por economistas em seminários promovidos em Washington nos últimos dias para discutir a crise do euro. "Os dados indicam que a Europa vai ter uma recessão significativa", afirmou Desmond Lachman, do American Enterprise Institute (AEI), em seminário organizado pela George Washington University. A receita de forte ajuste fiscal, afirma ele, já vinha causando a desaceleração de algumas economias da região, mas nos últimos meses a situação piorou com o início de uma contração de crédito bancário. "Essa combinação torna muito difícil para Itália sair dessa situação", afirma Lachman, que prevê a saída de membros da zona do euro em 2012.
O chamado déficit público ajustado pelo ciclo econômico é uma forma de examinar o estrago causado pelo baixo crescimento sobre as contas fiscais da Itália. Esse é um indicador que mostra quanto seria o déficit público se a recessão não prejudicasse a arrecadação e não aumentasse os gastos.
O déficit ajustado ciclicamente previsto pelo FMI para 2011 é de 2,5% do PIB. É menor do que o déficit nominal sem ajustes de 4% do PIB previsto pelo FMI para este ano e bem comportado para os padrões dos países do G-7.
Desse grupo, somente a Alemanha e o Canadá se saem melhor. Para 2011, o déficit ajustado previsto para a Itália é de 1% do PIB, pior só do que o da Alemanha (0,9% do PIB).
No caso da Itália, o baixo crescimento econômico é uma mazela estrutural, não apenas consequência da crise econômica. Nos últimos 15 anos, desde que o primeiro ministro Silvio Berlusconi subiu ao poder, a média de expansão do PIB foi pouco inferior a 1% ao ano, quase metade da média da Europa. Para este ano, a projeção do FMI é de 0,6%. Baixa escolaridade, corrupção e rigidez no mercado de trabalho são sempre apontados como obstáculos ao crescimento.