Título: PMDB dá ultimato a ministros e faz convenção que ameaça governistas
Autor: César Felício
Fonte: Valor Econômico, 09/12/2004, Política, p. A-7

Os dirigentes do PMDB que defendem a permanência do partido no ministério sofreram ontem uma derrota na Executiva Nacional da sigla, que aprovou uma resolução garantindo, na prática, a realização neste domingo da convenção que deve afastar o partido da base de governo. Por iniciativa do ex-deputado Renato Vianna (SC), ligado ao governador Luiz Henrique Silveira, a Executiva aprovou por 9 votos a 8 um ultimato para os ministros Eunício Oliveira, das Comunicações, e Amir Lando, da Previdência, abandonarem seus cargos em 48 horas, sob pena de a convenção se realizar. O ultimato foi rejeitado ontem mesmo. "Não há nada que me impeça de continuar trabalhando", afirmou Lando, depois de participar de uma reunião com os líderes da bancada do partido no Senado e na Câmara, Renan Calheiros (AL) e José Borba (PR), que divulgaram uma nota em que desautorizam a Executiva e prometem ignorar a convenção. "Qualquer decisão tomada na convenção nacional do próximo dia 12 de dezembro será inócua e não alterará o quadro político", afirma o texto. Ainda na tarde de ontem, o grupo começou a articular o esvaziamento da convenção. Não se descarta a adoção de medidas judiciais. "Eles ganharam com um gol de mão", afirmou o senador Ney Suassuna, governista, referindo-se ao fato da reunião ter tido 17 votos em um colegiado de dezesseis membros. O presidente do partido, Michel Temer, votou duas vezes. Na primeira, colaborou para empatar a votação em oito a oito. Em seguida, votou novamente para desempatar a votação que ele mesmo tinha empatado. A reunião foi extremamente tensa, desde o começo. Os governistas retardaram seu início preocupados com a ausência do deputado Jader Barbalho (PA), que seria substituído pelo oposicionista Dorany Sampaio (PE) se não aparecesse. Jader foi o último a chegar, falou muito pouco durante o encontro e chegou a se abster na votação para definir a pauta da reunião da Executiva. No final, votou contra a proposta de Vianna, mas seu comportamento causou estranheza no núcleo governista. O momento mais tenso foi protagonizado pela esposa de Eunício, Mônica Paes de Andrade, tesoureira do partido, ao discutir com Vianna. "O senhor não tem coragem de formular com clareza sua proposta. Trata os ministros do partido como os serviçais de sua casa, porque para os meus eu ainda dou aviso prévio quando despeço", disse. O deputado Eliseu Padilha (RS) disse então que os ministros do partido tinham muito pouco poder. Acenou para Amir Lando, que assistia ao encontro, e disse: "O próprio ministro da Previdência já afirmou que é uma verdadeira rainha da Inglaterra". Lando fez menção de responder, mas desistiu. A versão original da proposta de Vianna não mencionava o prazo de 48 horas para a demissão, mas o grupo de Temer impôs a condição para garantir apoio à tese. O senador Maguito Vilella (GO), até então aliado do catarinense, reagiu. "Peço que leiam a ata para sabermos o que eu votei. Não tem nada de 48 horas", protestou, com voz alterada. Foi acusado pelos ex-governadores de São Paulo, Orestes Quércia, e do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho, de estar a serviço do governo. "Tive a coragem e a humildade de ir para a oposição no governo Fernando Henrique e exijo que me respeitem", gritou o goiano. Terminada a reunião, aumentou a suspeita dos governistas do PMDB de que parte do governo federal teria decidido negociar diretamente com os governadores, abrindo mão de defender a permanência de Eunício Oliveira no ministério e da eleição de Renan Calheiros para a presidência do Senado. O sinal disto, segundo estes governista, seria o fato dos ministros da Casa Civil, José Dirceu, e da Fazenda, Antonio Palocci, terem tido contatos recentes com os governadores de Santa Catarina e do Distrito Federal, Joaquim Roriz, cujo representante na Executiva, Tadeu Filippelli, votou pela proposta de Vianna. "Renan e Eunício perderam, mas eu não sei se o governo perdeu. Ou qual ala do governo perdeu", disse um membro da Executiva aliado de Renan. Mas o governador de Santa Catarina tornou o ambiente ainda mais confuso ao divulgar uma declaração condenando o comportamento do seu representante na Executiva. "Ficou pior a emenda do que o soneto. Na verdade, o ideal seria aprovar uma resolução que deixasse para um segundo momento a questão da entrega de cargos", disse o governador. "Os governadores falam de um jeito, mas seus representantes agem de outro. Está difícil de entender", comentou Suassuna. Luiz Henrique e Joaquim Roriz serão interlocutores importantes para garantir ou não o quórum da convenção de domingo. Do lado governista, que reúne os menores Estados, pelo menos 166 dos 519 convencionais devem deixar de comparecer. O catarinense e o brasiliense juntos, controlam 43 convencionais. Os demais governadores do partido (o gaúcho Germano Rigotto, o paranaense Roberto Requião, o pernambucano Jarbas Vasconcelos e a fluminense Rosinha Garotinho) já estão mobilizados para fazer com que o encontro aconteça. Somam 150 convencionais. Outros Estados oposicionistas reúnem 66 votos. Com os de Santa Catarina e Distrito Federal, atingiriam a maioria absoluta (259), garantindo o quórum da convenção sem precisar disputar convencionais nos Estados onde há divisão, como Minas Gerais, Piauí e Espírito Santo, entre outros. Se estes dois governadores aderirem ao boicote, os governistas dependeriam ainda desmobilização dos convencionais dos Estados divididos.