Título: Congresso promulga reforma do Judiciário em meio a polêmicas
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 09/12/2004, Política, p. A-10

O Congresso Nacional promulgou ontem a reforma do Judiciário. O texto tramitava na Câmara e no Senado há 12 anos e institui modificações importantes, como a criação do controle externo do Judiciário e a adoção da súmula vinculante para o Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, um dos maiores defensores da reforma, era um dos mais festejados e empolgados durante a cerimônia de ontem. "É um dos dias mais importantes da República brasileira. Foi promulgada uma reforma constitucional ampla e importante", disse o ministro, que no momento da posse, à frente da pasta, colocou a aprovação do projeto como uma de suas prioridades. "A reforma será de grande valia para a construção de um Poder Judiciário mais moderno e transparente. Ao entrar em vigor, ela trará benefícios concretos à sociedade", discursou o presidente do Congresso, José Sarney (PMDB-AP). O presidente da Comissão de Constituição de Justiça do Senado, Edison Lobão (PFL-MA), disse que "a reforma não é um ponto final nas alterações necessárias ao Judiciário, mas é o passo fundamental, a sólida base para futuras mudanças". Ele se refere à reforma dos códigos processuais destinada a agilizar a tramitação de processos nos tribunais. O governo enviará na próxima semana 14 projetos de lei com alterações infraconstitucionais com esse objetivo. O texto tramitou na Câmara entre 1992 e 2000, quando foi enviado ao Senado. Durante dois anos, a proposta teve a relatoria do ex-senador Bernardo Cabral. As fortes pressões de associações corporativas haviam desfigurado todo o projeto. Em 2002, um acordo de líderes levou a reforma à estaca zero no Senado para reiniciar a tramitação. Sem conseguir se reeleger, Cabral deu lugar a José Jorge (PFL-PE) na relatoria. Alçada à condição de prioridade máxima por Bastos e pela cúpula do Planalto, o texto caminhou no Congresso a partir de 2003. O texto básico foi dividido por José Jorge em duas partes. A primeira, se aprovada, estava pronta para ser promulgada. O restante seria votado e remetido novamente à Câmara para nova análise dos deputados antes de ser colocada em vigor. As votações no Congresso tiveram ritmo acelerado depois da posse de Nelson Jobim no Supremo Tribunal Federal e de Edson Vidigal na presidência do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os dois imprimiram nova dinâmica à negociação do Judiciário com os parlamentares. Se uniram ao governo para aprovar o controle externo e outras alterações polêmicas, como a federalização dos crimes contra os direitos humanos e a quarentena para juízes aposentados atuarem como advogados. Nem no dia da promulgação, a Reforma do Judiciário esteve livre de polêmicas e confusões. Em meio a discursos de comemorações às alterações feitas, o presidente da Câmara, João Paulo Cunha, tentou marcar posição favorável à criação dos conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público. Ele havia tentado suprimir do texto promulgado a criação do controle externo de magistrados e promotores. Na terça-feira à tarde, João Paulo foi orientado por assessores a não deixar o controle externo ser promulgado. O texto havia sofrido pequena modificação no Senado e o regimento obrigaria a proposta a voltar à Câmara para nova aprovação dos deputados. Os senadores suprimiram o artigo que dava aos conselhos o poder de punir magistrados e promotores. O petista foi falar com Sarney, acompanhado por alguns deputados. Depois de conversas entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Justiça e o presidente do Supremo, Sarney conseguiu demover João Paulo. Ontem, no discurso proferido durante a promulgação da reforma, o presidente da Câmara fez questão de lembrar que o formato dos conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público aprovados pelos deputados em 2000 era "mais severa do que a do Senado". E completou: "Isso serve para afastar qualquer insinuação de que a Câmara é contra o controle externo", disse o petista. Bastos refutou qualquer irregularidade regimental da tramitação do texto: "Não tem confusão regimental na minha opinião. O presidente João Paulo teve toda razão em ter cautela, mas a questão regimental foi superada. O Conselho Nacional de Justiça, que tinha tanta resistência no passado, é visto hoje, até pelos juízes, como um órgão estratégico do Judiciário". O presidente do STF reiterou que o Judiciário ainda deve enfrentar outras duas reformas para que se complete o ciclo de modificação do sistema: a processual e a administrativa. "Nós já conseguimos fazer, através de levantamento do Supremo, os indicadores estatísticos de todos os tribunais para criar um mecanismo gerencial competente", disse.