Título: População vai logo atingir pico, para depois cair
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Fonte: Valor Econômico, 09/12/2004, Internacional, p. A-12

A Ozaki Shoji, um dos maiores fabricantes de uniformes escolares do Japão, tem um problema: a demanda por seu principal produto é cada vez menor, uma vez que o número de crianças no país vem caindo. A empresa decidiu então iniciar uma divisão de roupa casual, na esperança de ampliar a faixa etária de seu público-alvo. Uma concorrente menor, a Onoto, que também tem sede em Okayama (sudoeste do Japão), está tendo dificuldades para se adaptar. A empresa acredita que uma tendência de maior individualismo nas escolas está reduzindo ainda mais a demanda por uniformes, além das tendências demográficas que estão afetando sua empresa. O problema não está restrito aos fabricantes de uniformes. A baixa taxa de natalidade significa não só menos crianças na escola como também menos trabalhadores jovens para as fábricas da Onoto. E isso é só o começo de uma mudança demográfica que vai desencadear alterações profundas na economia e na sociedade do Japão. As projeções variam, mas a maior parte dos especialistas acredita que a população do Japão, hoje em 127,6 milhões e mal crescendo, vai atingir um pico em algum momento entre 2005 e 2007, e então iniciará uma queda longa e firme que vai durar várias décadas. O Instituto de Pesquisa de População e Seguridade Social (IPSS) do Japão prevê que a população vai cair para algo entre 92 milhões e 108 milhões até a metade deste século, com uma previsão intermediária de cerca de 100 milhões em 2050. A ONU prevê uma queda ligeiramente menor no período, para cerca de 105 milhões. Mesmo com a longevidade dos japoneses aumentando, o país simplesmente não terá jovens suficientes para manter sua população. A taxa de fertilidade (o número de crianças geradas por mulher) caiu abaixo de 1,3 no ano passado, em comparação a 3,65 em 1950. Os burocratas japoneses lançaram um esforço para promover o nascimento de mais crianças, que inclui isenções tributárias e regras que ajudam os pais a tirarem mais licenças do trabalho, mas a taxa de fertilidade deverá continuar baixa por pelo menos algumas décadas. Até 2050 a proporção de crianças com menos de 15 anos vai cair para menos de 11% da população, contra 16% em 1995. Os japoneses então terão em média mais de 53 anos, 12 anos a mais do que hoje. Isso vai afetar tudo, de trabalho e vida familiar a política externa e segurança nacional. O Japão provavelmente terá de permitir maior imigração de trabalhadores, mas sem dúvida nenhuma a inquietação pública vai levar a um adiamento e uma minimização dessa mudança enquanto for possível. Uma população menor também pode significar crescimento econômico mais lento, que vai cobrar um preço sobre uma série de gastos, como os de defesa, influenciados mais pelo peso econômico total que pela renda per capita. Uma conseqüência óbvia será a pressão sobre o sistema de seguridade social, em especial saúde e previdência, à medida que a população economicamente ativa encolher drasticamente. O IPSS calcula que haverá 31 milhões de japoneses a menos entre 15 e 64 anos em 2050. Esse grupo vai encolher dos atuais dois terços da população para pouco mais da metade. O Partido Liberal Democrático, no governo, perdeu terreno nas eleições para o Senado neste trimestre em parte por ter forçado cortes nos benefícios e um aumento dos prêmios sobre as pensões. Mas isso não vai parar aí. A velocidade dessa mudança demográfica e os altos níveis de endividamento do Japão (o FMI diz que a dívida pública japonesa é de cerca de 80% do PIB) estão levando alguns a temer uma implosão fiscal. Dois economistas dos EUA - Christian Broda, do Federal Reserve de Nova York, e David Weinstein, da Universidade de Columbia - recentemente causaram agitação ao argumentar que essa preocupação é exagerada. A maior parte do debate está concentrado em aritmética de longo prazo: eles acreditam que a população do Japão vai se estabilizar em algum ponto, talvez por volta de 2060, e que o país conseguirá assim aliviar a transição demográfica distribuindo os custos ao longo de um século ou mais. Assim como em outros países, os japoneses têm dado mais atenção às suas carreiras, em detrimento dos filhos, à medida que ficam mais ricos. Os economistas dizem que, ao chegar a certo nível de prosperidade, eles passarão a valorizar menos o dinheiro extra, passando a desejar famílias maiores. No entanto, Broda e Weinstein fazem outra afirmação que merece mais atenção. Argumentam que um número menor de crianças vai, de uma variedade de maneiras, proporcionar uma certa economia de dinheiro ao Japão. "Se uma população envelhecida significa um aumento das transferências do governo para os idosos", afirmam, "então, pela mesma lógica, uma queda nas taxas de fertilidade deverá significar uma queda nos gastos com os japoneses mais jovens". Certamente haverá menos alunos, e conseqüentemente menos demanda por escolas e professores. Em algum momento, isso também vai afetar as universidades, que já estão se reorganizando para enfrentar uma maior competição. Um mercado de trabalho mais restrito também vai reduzir a necessidade de seguro-desemprego e outras transferências fiscais para os jovens. A taxa de desemprego do Japão continua alta (para o padrão local), em 4,7%, apesar de uma recuperação recente, e o desemprego entre os trabalhadores mais jovens é mais do que duas vezes esse número. Em poucos anos, porém, o mercado de trabalho, especialmente para os jovens, deverá encolher dramaticamente.