Título: Para mercados, Espanha precisará de ajuda externa
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Fonte: Valor Econômico, 21/11/2011, Internacional, p. A13
Vencedor da eleição geral de ontem na Espanha, o Partido Popular de Mariano Rajoy promete reformas radicais e mais austeridade para superar a pior crise econômica dos últimos tempos. No entanto, o sentimento nos mercados é de que o país dificilmente conseguirá sair da asfixia financeira atual sem ajuda externa.
O novo governo assumirá com a economia sofrendo nova contração nos próximos dois a três trimestres, considerada inevitável por analistas. O número de desempregados pode subir dos cinco milhões para 5,4 milhões até o ano que vem. Persistem a escassez de crédito, a deterioração no consumo doméstico e a tensão social.
A expectativa é de que o governo de Mariano Rajoy deverá fazer um ajuste adicional entre € 18 e 30 bilhões, incluindo alta do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) e menos gastos sociais. Nos mercados financeiros, aguarda-se reformas estruturais pelo crescimento, incluindo liberalização do rígido mercado de trabalho. Além de nova reestruturação no setor bancário, com mais consolidação e possível recapitalização adicional. E mais controle de gastos das regiões, para assegurar a solvência.
Só que o novo governo vai demorar um mês para tomar posse, enquanto a crise prospera e investidores apostam mais sobre qual será o próximo país da zona do euro a se declarar incapaz de pagar suas dívidas.
Rajoy foi evasivo na campanha sobre o que realmente vai fazer. Certo mesmo é que o líder da direita pega a economia espanhola em melhor forma do que ela estava em 2008-2009, quando começou a recessão anterior. "O governo que emerge das eleições terá muito a fazer, mas não começará do zero"", afirma Gilles Moec, do Deutsche Bank.
O setor empresarial conseguiu recuperar ligeiramente sua situação financeira graças em parte à redução de salários, a produtividade acelerou e melhorou a competitividade, e uma boa parcela da destruição de empregos já ocorreu. A expectativa é assim de uma "recessão suave"", capaz de manter um consenso político e social suficiente em torno de novos ajustes penosos.
Dificilmente a Espanha reduzirá o déficit público para 6% do PIB neste ano, comparado a 9,2% em 2010, diante do tamanho das despesas das regiões e da baixa no crescimento do PIB. Mesmo assim, a dívida publica espanhola só subirá de 67% hoje para 80% do PIB até 2013, abaixo do nível das dívidas da Alemanha e da França.
A situação política da Espanha para os próximos anos parece bem melhor em comparação com Grécia e Itália, agora dirigidas por tecnocratas. Outra vantagem para o novo governo é que o próximo pagamento de títulos públicos a vencer não ocorrerá antes de abril de 2012 - no mesmo período, a Itália estará sob enorme pressão para refinanciar € 200 bilhões de títulos públicos.
Ocorre que o problema espanhol não é apenas a dívida pública, como sobretudo a dívida privada. A soma de ambas representa 335% do PIB espanhol, a quarta maior do mundo desenvolvido, à frente dos 310% da Itália. Juntando dívidas dos setores público e privado, a Espanha precisa pagar ou refinanciar € 300 bilhões em 2012, o que dá a dimensão do desafio.
Nesse cenário, cresce a inquietação também sobre o tamanho do fundo de recapitalização dos bancos, para tratar de calotes nos empréstimos domésticos.
A recapitalização dos bancos espanhóis deveria ser de pelo menos € 50 bilhões, o dobro dos € 26 bilhões previstos pela Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla em inglês), nas estimativas do Deutsche Bank. Outros analistas avaliam que, se a crise na zona do euro se intensificar, o governo de Rajoy não terá outra escolha a não ser pedir socorro financeiro. No pior cenário, a Espanha poderia necessitar de mais de € 400 bilhões para resolver seus problemas bancários e ficar fora do mercado por três anos.
"Na dinâmica atual do mercado, o elevado e crescente spread sugere que a Espanha é incapaz de estabilizar sua situação por si mesma"", segundo Antonio Garcial Pascual, do banco Barclays.
Enquanto o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira e o Fundo Monetário Internacional podem ajudar com linhas de crédito, a alternativa mesmo, para analistas, é um compromisso do Banco Central Europeu (BCE) para atuar como emprestador de última instância, algo que a Alemanha continua a rejeitar.
"Se o prêmio da dívida espanhola continuar aumentando, forçando o governo espanhol a buscar um pacote de socorro, a crise da dívida na zona do euro se tornará ainda mais cara e mais complexa para resolver"", nota o analista Ben May, em Londres.